Pesquisa: algum artista nacional reuniu 150 mil pessoas em três shows seguidos, na mesma cidade, com ingressos pagos, na história da música brasileira? Há duas semanas, a turnê “Titãs Encontro — Todos ao mesmo tempo agora” alcançou este feito no Allianz Parque, em São Paulo. Além do sucesso crescente desta e de outras atrações nacionais, os festivais também vêm valorizando mais o produto made in Brazil. Isso inclui desde os medalhões Caetano Veloso, Gilberto Gil e Marisa Monte, figurinhas queridas em eventos como Rock the Mountain, Festival de Inverno e Doce Maravilha, a outros nomes como NX Zero (a banda de rock paulista, que estava parada desde 2017, fez sucesso no festival Mita e agora já tem duas datas no Allianz, uma totalmente esgotada, e quatro no Rio previstas para os próximos meses, entre outras) e Planet Hemp (que foi bem em dose tripla nos grandes eventos: Lollapalooza, Universo Spanta e Mita).
— É um orgulho enorme ver todo esse reconhecimento. Nós que sempre olhamos a grama do vizinho, prestigiamos os artistas estrangeiros, muito por conta da novidade... Agora estamos aplaudindo a nós mesmos — diz Zé Ricardo, vice-presidente artístico do Rock in Rio e do The Town, irmão paulistano do festival carioca que acontece em setembro, ele mesmo cantor e compositor.
O próprio The Town, assim como acontece no palco Sunset, do Rock in Rio, já tem nomes como Racionais MC’s, Jão e Seu Jorge no ápice da programação em seu palco The One, enquanto nomes gigantes internacionais como Foo Fighters, Bruno Mars e Post Malone lideram o palco Skyline.
— Hoje, os nossos artistas já montam shows especiais para os festivais, investem além do próprio cachê em espetáculos próprios, diferentes das turnês que já passam pelas cidades — diz Zé Ricardo. — Acho que o caminho é esse.
Empresário responsável pela turnê dos Titãs, Pepeu Correa lembra que, há algum tempo, antes da pandemia, uma tentativa de convocar brasileiros como headliners não deu certo.
— Em 2019, o Lollapalooza escalou os Tribalistas e foi apedrejado com esse anúncio; o festival teve que escalar os Kings of Leon depois — lembra ele.
Novo olhar
Mas os olhares podem estar mudando graças a produções como “Titãs Encontro”.
— Há uma demanda por shows de artistas do pop-rock e da MPB com produções de nível internacional — identifica um emocionado Charles Gavin, baterista dos Titãs, no meio do furacão do encontro com os velhos camaradas. — O equipamento de vídeo que usamos é o mesmo de bandas como Red Hot Chili Peppers e Rage Against the Machine. É um grande prazer fazer parte disso. Como disse o nosso iluminador, Césio Lima, é muito legal estar na primeira turnê gringa de uma banda brasileira.
Os números que atestam o sucesso absoluto dos Titãs (já vistos por 600 mil pessoas na atual turnê) merecem comemoração.
— E a demanda não acabou — conta o chefão Pepeu Correa. — As pessoas ficaram pedindo mais, mas as agendas não permitiam, as dos músicos e até do próprio estádio do Palmeiras.
O encontro dos sete Titãs, reforçados pelo mutante Liminha no lugar de Marcelo Fromer, guitarrista morto em 2001, começou com um projeto de dez shows, já visando a grandes espaços, como arenas e estádios.
Hoje, Nando Reis, Paulo Miklos, Tony Bellotto, Sérgio Britto, Charles Gavin, Branco Mello e Arnaldo Antunes, além de Liminha, fazem, em princípio, a última apresentação da excursão no Brasil, em Ribeirão Preto. Será o 21º show, além de três marcados para o exterior, em outubro e novembro.
— Fomos convidados para tocar no Radio City Music Hall, em Nova York, em uma sexta-feira, dia 6 de outubro — comemora Correa. — E ainda vamos à Flórida e a Lisboa. Posso adiantar ainda que existem conversas para umas últimas datas no Brasil, no fim do ano.
O.k., é claro que o encontro da formação clássica de uma das maiores bandas de rock do Brasil, depois de 30 anos, é uma situação especial — como são as eventuais turnês dos barbudos Los Hermanos, que também costumam passar por estádios. Mas, para quem ainda duvida do grande sucesso das atrações nacionais, não são só os Titãs que estão reunindo multidões maiores do que as esperadas pelo Brasil.
Nos últimos meses, Djavan somou 15 mil pessoas em uma emocionada minitemporada de três dias no Qualistage, no Rio; Gilberto Gil, ao lado da família, repetiu a façanha; o Skank deu seu adeus para um Mineirão lotado; a turnê “Portas”, de Marisa Monte (que anda pelo Canadá, pela primeira vez na carreira da cantora) bateu os cem shows, com mais de 350 mil ingressos vendidos... Quem precisa de Rolling Stones?
— Temos uma tendência — confirma Bernardo Amaral, sócio e programador do Qualistage, que precisou marcar datas extras de Gil e Djavan, tamanha foi a procura. — Claro que sempre houve muita demanda pela música brasileira, mas agora são produções maiores, estádios equipados. Sandy e Jr, em sua turnê de reunião, juntaram cem mil pessoas no Parque Olímpico. Acho que esse interesse já vai além da demanda reprimida pela pandemia.