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Já está tudo no esquema. Quando Taylor Swift terminar de cantar “Champagne problems” nos shows da turnê brasileira, que acontecem em novembro, ela verá uma imensa bandeira do Brasil diante de si. O desenho será formado por papéis celofane em verde, amarelo e azul, colados sobre as lanternas dos celulares da plateia. As orientações para essa e outras performances estão publicadas nas redes sociais dos três maiores fã-clubes nacionais.

O objetivo é fazer a melhor recepção possível para a cantora americana, que nunca trouxe uma turnê ao país. Se der certo, Taylor vai se emocionar e dizer que “o Brasil tem os melhores fãs do mundo”, bordão de nove entre dez artistas estrangeiros. E não é (apenas) educação dos visitantes: pesquisadores e executivos comprovam isso no discurso, enquanto na prática investimentos em feiras de cultura pop e eventos globais promovidos por plataformas de streaming refletem o poder que o fã brasileiro exerce sobre a indústria do entretenimento.

— Nenhum outro país tem interações de fãs nas redes tão fortes e organizadas — diz Aianne Amado, doutoranda em Ciências da Comunicação da USP especializada em fãs e cultura pop.

Roteiro de ações de fãs para os shows de Taylor Swift — Foto: Divulgação
Roteiro de ações de fãs para os shows de Taylor Swift — Foto: Divulgação

E essa devoção não se restringe à internet ou a shows. Julia Quinn, dos best-sellers “Bridgerton” (Arqueiro), uma das principais escritoras estrangeiras que veio à Bienal do Livro do Rio no início do mês, diz que aqui ela se sente “uma estrela”.

— Eu juro: minhas sessões de autógrafos em outros países não são como as do Brasil — disse ela, por e-mail, após o evento.

A autora americana tenta explicar isso, resumidamente, usando os adjetivos “calorosos”, “entusiasmados” e “gratos” para descrever o público. Mas já existe uma farta produção acadêmica que analisa nosso “jeitinho” como fã e público de forma mais aprofundada. Há quem veja nessa dinâmica contemporânea um resquício do complexo de vira-lata.

— Desenvolvemos a ideia de que o que vem de fora é superior. Quando vemos um artista internacional olhando para o Brasil, nos sentimos valorizados — diz Aianne Amado, citando o “please come to Brazil” (“por favor, venha para o Brasil”), expressão repetida à exaustão nas redes para seus ídolos gringos, como um exemplo de validação.

O ‘case’ Bruninho

Quando o pedido é atendido, o ciclo virtuoso se completa. O fandom (grupo de fãs) brasileiro, mais trabalhador do que todos os outros (“o brasileiro é o povo que mais faz divulgação gratuita”, diz Aianne Amado), ganha conteúdo especial, no show ou nas redes sociais. Se bem feito, isso viraliza, e o popstar fica ainda mais pop.

Vide o caso de Bruno Mars. O cantor americano, presente no The Town em dois fins de semana, furou sua bolha de fãs falando nos shows “oi, sumida”, “gatinha, gostosa” e se autoapelidando de “Bruninho”. Na despedida, postou um vídeo em homenagem ao país gravado nas ruas de São Paulo. Mas tudo começou com o tal “please come to Brazil”, segundo o próprio. “Brazil, I came” (“Brasil, eu vim”), ele diz nas imagens, que já passaram de 50 milhões de reproduções no Instagram.

Bruno Mars no The Town — Foto: I Hate Flash/Divulgação
Bruno Mars no The Town — Foto: I Hate Flash/Divulgação

—A performance do fã é feita em excesso justamente pra tentar agregar públicos — explica Thiago Soares, coordenador do Grupo de Pesquisa em Comunicação, Música e Cultura Pop da Universidade Federal de Pernambuco. — E a partir de um gesto performático do Bruno como estratégia da indústria houve um cruzamento de bolhas.

Todo mundo saiu ganhando: os fãs mais aguerridos e, principalmente, o artista. Marcela Moreira, vice-presidente de marketing da Warner Music Latin America, a gravadora de Bruninho, descreve o engajamento dessa ação como “explosivo” e diz que o caso tem sido usado com uma “referência para a indústria fonográfica”. No intervalo entre 10 e 16 de setembro, enquanto circulavam o vídeo e diversos trechos do show do dia 10, ele ganhou 1,3 milhão de seguidores, de acordo com informações do Crowdtangle, ferramenta de dados da Meta. Neste ano, ele demorou de janeiro até maio para ter o mesmo crescimento bruto.

—O brasileiro é um povo com altíssimo engajamento, um dos maiores consumidores de redes sociais no mundo — diz Marcela. — A América Latina como um todo, liderada por Brasil e México, é sem dúvida de grande importância para qualquer artista que almeje relevância mundial. Não se faz um “hit global” hoje sem o consumo da região. E isso não é apenas pelos números, mas também pela qualidade do engajamento.

'Falam que somos malucos'

Desde o último dia 8, a farmacêutica carioca Jéssica Trindade, de 24 anos, tem um compromisso toda quinta-feira, das 6h às 14h. Ela toma conta da última barraca da fila organizada no portão principal do estádio Engenhão, onde acontece, no dia 9 de novembro, o show da banda mexicana RBD. Essa tarefa é dividida num revezamento de 35 pessoas. São, em média, 240 fãs fazendo a mesma coisa em torno das oito barracas armadas no local. Tudo para não perder a chance de estar colado na grade quando começar o show do grupo criado em 2004 e que volta depois de um longo hiato.

Henrique Martins (à esquerda), Jéssica Trindade e Fabiano Soares acampados no Engenhão até novembro para vero show do RBD — Foto: Leo Martins/Agência O Globo
Henrique Martins (à esquerda), Jéssica Trindade e Fabiano Soares acampados no Engenhão até novembro para vero show do RBD — Foto: Leo Martins/Agência O Globo

—A gente quer beijar, gritar, agarrar. Nosso jeito de mostrar amor é acampando — disse Jéssica, que, assim como pesquisadores e executivos de marketing, lembra que o frenesi também se deve à pouca frequência de shows estrangeiros.

Enquanto ela e o estudante Henrique Martins, de 33 anos, e o radiologista Fabiano Soares, de 28, posavam para a foto desta matéria, um transeunte passou gritando: “Vai trabalhar!”. Ninguém se abalou.

—As pessoas falam que somos malucos, desempregados, mas não somos — diz Fabiano. — Aqui (no acampamento) tem cronograma a seguir porque todos trabalham, estudam, têm vida. Ninguém é vagabundo, até porque o preço do ingresso é caríssimo (a entrada inteira da pista premium custava R$ 850 e a meia, R$ 475; todas esgotadas).

Esse roteiro dá trabalho e exige abnegação. Fatores primordiais na cultura de fãs não só do Brasil como latino-americana, que pesquisadores relacionam com o passado colonial, calcado no cristianismo.

— Esses sacrifícios estão ligados às dinâmicas cristãs, religiosas — diz Thiago Soares, da UFPE. — E o brasileiro é um grande fornecedor dessas imagens de excesso e afetos, importantes na construção da reputação do artista.

Não há como subestimar também a capacidade de produzir imagens de humor, principalmente no âmbito digital. Outro nicho que os fãs e o público brasileiro dominam como ninguém e que ajudam no prestígio. A Warner Music, por exemplo, está rindo de orelha a orelha com as adaptações do vídeo de Bruno Mars.

—Houve incontáveis memes e até páginas de prefeituras de pequenas cidades entraram no movimento — diz Marcela Moreira.

As maiores convenções

Nesse carrossel de risos, lágrimas e disposição para enfrentar filas, plataformas globais de streaming e estúdios de cinema também têm focado no país para promover conteúdos. A CCXP, feira nacional de cultura pop, já é maior que o evento que a inspirou, a Comic-Con de San Diego.

Espécie de CCXP da Netflix, o Tudum foi uma criação nacional e, organizado presencialmente em São Paulo em junho, teve os ingressos esgotados em 90 minutos após a abertura da distribuição gratuita. Outra ação importante do ano teve a ver com o “One piece”, live-action do mangá mais vendido no mundo. No início do mês, a plataforma instalou o barco da série, em proporções reais, nas areias de Copacabana.

—O Brasil foi o único país a receber o (navio) Going Merry para que fãs pudessem visitá-lo — diz Bianca Rosenberg, diretora de marketing da Netflix para América Latina. — O país sempre foi o palco para novas ideias e primeiras (realizações).

Mas nem todos estão satisfeitos, pelo menos no mundo da música. A publicitária paulistana Rebeca Gois, de 30 anos, uma das administradoras do portal Taylor Swift Brasil, acompanha não só as ações em torno da estrela pop, como as de outros grandes nomes. E Receba tem uma certeza: os brasileiros dão mais do que recebem.

— Como a Taylor faz números grandes no Brasil, temos até mais atenção. Para outros artistas, isso é pior. Acredito que seja por sermos um mercado emergente.

Diante disso, Aianne Amado, da USP, lembra que existem fatores econômicos importantes que acabam passando ao largo das paixões dos fãs.

—O Brasil está sempre no subconsciente dos produtores, mas a situação econômica do país importa muito — diz a pesquisadora. — O poder de consumo do brasileiro vale mais do que apenas a vontade dele em consumir.

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