Música
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Por — Rio de Janeiro

No livro “Mela cueca — As canções de amor que o mundo esqueceu” (Garota FM Books), enfim se fica sabendo tudo sobre a vida do gaúcho criado no Rio de Janeiro (e há décadas radicado em São Paulo) Zé Pedro, enciclopédia da MPB, um dos DJs mais populares do Brasil, figura espalhafatosa da mídia e criador do selo fonográfico Joia Moderna. Fica-se sabendo de tudo, menos da profissão do seu pai — algo que até hoje, mais de 20 anos depois da sua morte, o DJ não tem a menor ideia de qual foi, mas que deixou marcas em sua vida digna de biografia.

— Tudo parecia normal enquanto eu ia vivendo. O meu pai escondido no armário porque não pagou o aluguel e me botando para ir abrir a porta para o cobrador... nunca tive nenhum choque de realidade. Foram os cambalachos do pai que nunca permitiram que eu saísse da Zona Sul — orgulha-se Zé, que faz a noite de lançamento carioca do livro dia 31, no Manouche, no Jardim Botânico, com discotecagem que vai entregar, quando não estiver assinando exemplares, ao amigo (e cúmplice no amor pelos mela cuecas) Marcelo Mansur, o Memê.

A ideia original de José Pedro Selistre, 59 anos, era fazer um guia comentado do pop romântico internacional que tomou rádios e trilhas de novelas no Brasil entre o fim dos anos 1960 e começo dos 1980. Um tipo de música que podia ser de Stevie Wonder, Carpenters, Elton John ou até de um brasileiro como Fábio Jr. (que começou gravando em inglês sob a alcunha de Mark Davis) e que sempre fascinava Zé — menino que vivia de forma precária com o pai e a mãe em apartamentos em Copacabana, Leme e Botafogo, abandonados toda vez que o pagamento do aluguel não era feito. Mas menino que era sempre presenteado pelos pais com discos.

Capa do livro "Mela cueca - as canções de amor que o mundo esqueceu", do DJ Zé Pedro — Foto: Reprodução
Capa do livro "Mela cueca - as canções de amor que o mundo esqueceu", do DJ Zé Pedro — Foto: Reprodução

“Mela cueca” foi o nome que esse pop ganhou no Brasil do DJ Big Boy (e não de Tim Maia, como muitos pensam). O termo sugeria sexo — porque, nos bailinhos de outrora, era a música que levava os casais apaixonados a dançar coladinhos. Nos Estados Unidos, ele era mais conhecido como breakup songs, afinal, nas letras, falava-se mais de rompimentos amorosos que dos prazeres da carnalidade. Uma tristeza que alegrava o pequeno Zé Pedro.

— É uma dicotomia, trabalho com a alegria, mas sou melancólico. Eu só virei o Zé Pedro aceleradinho por causa da homofobia que sofri desde a infância — admite ele, que, no livro, relata o episódio no qual a mãe foi correndo com um facão atrás dos meninos do colégio que queriam amarrá-lo a uma árvore no Lido (“e jogar bosta, igual à Geni”) só porque ele aparecera para as aulas calçando uma sandália Melissa.

O DJ Zé Pedro com os pais, José Pedro e Maria — Foto: Acervo pessoal
O DJ Zé Pedro com os pais, José Pedro e Maria — Foto: Acervo pessoal

Zé Pedro passara três anos tentando lançar o “Mela cueca” até que se envolveu numa troca de mensagens com a jornalista Christina Fuscaldo, fundadora da editora Garota FM Books. Ela leu o livro e tocou a real para o DJ — sentia falta de mais sobre a sua vida louca. Numa sessão de Facetime, ele abriu seu coração e a memória para Chris. Depois, ela mandou de volta as transcrições do relato, ele os reescreveu, imprimindo o seu ritmo e o seu molho e — voilá! — enfim tinha-se a tal “introdução violenta” para o seu livro.

— Só fiz terapia uma vez na vida, e ainda assim porque a Bela Gil pagou! — revela. — Tem gente que diz que esse livro tem que virar filme, peça, monólogo.... Imagina uma pessoa que só transou pela primeira vez aos 29 anos, e num hotel no Catete!

Ao falecer em 2017, a mãe de Zé Pedro (que, segundo ele, também fazia seus cambalachos ao vender biquínis na Praia de Copacabana e não pagar a fornecedora) deixou uma caixa com fotos e recortes de jornais e revistas (ou seja, tudo que saía na imprensa sobre o filho).

O DJ Zé Pedro, na juventude, quando pintou o cabelo de vermelho — Foto: Acervo pessoal
O DJ Zé Pedro, na juventude, quando pintou o cabelo de vermelho — Foto: Acervo pessoal

Dali vieram imagens para ilustrar passagens de sua infância (quando foi campeão de dança, concorrendo com um ainda jovem Eri Johnson, no programa de TV de Carlos Imperial — que deu a Zé a alcunha de Júnior do Leme) e de quando pintou o cabelo de vermelho (para horror da mãe) nos tempos do Crepúsculo de Cubatão — boate da Copacabana dos anos 1980 onde ele começou como um caixa tão atrapalhado que acabou sendo promovido a DJ, com êxito, por um dos sócios (o inglês Ronald Biggs, célebre assaltante do trem pagador que fugira para o Brasil).

O DJ Zé Pedro, na adolescência, com a amiga Laís, parceria em concursos de dança — Foto: Acervo pessoal
O DJ Zé Pedro, na adolescência, com a amiga Laís, parceria em concursos de dança — Foto: Acervo pessoal

Em “Mela cueca” (livro que tem texto de introdução de um especialista no assunto, Lulu Santos), Zé Pedro conta da amiga Laís, que era sua parceira nos concursos de dança da adolescência, e de quem acabou se afastando depois de um episódio conturbado, que envolveu um beijo, um surto do DJ e as famílias dos dois em pé de guerra por causa da confusão (a mãe de Zé achava que ela tinha tirado a virgindade do filho).

Mais de 40 anos depois, ele se viu inesperadamente como DJ de uma festa de Laís (que não sabia que aquele era seu ex-parceiro). Os dois se reconheceram e foram juntos para a pista, dançar o mela cueca “MacArthur Park”, com Donna Summer:

— A mãe desmaiou e o marido não entendeu nada. Ainda bem que alguém filmou!

‘O som mudou’

A seleção de músicas de “Mela cueca” termina em 1980, ano, segundo Zé, da “última grande trilha internacional de novelas”, a de “Água viva” (não por acaso, feita por Lulu Santos antes de começar sua carreira solo). São as músicas que saíram até o DJ fazer 16 anos.

— De lá para cá, o som mudou, tudo ficou muito programado. (Quando Madonna começa a cantar, em 1985) “Live to tell” não era mais a minha tristeza, não tenho mais prazer nesse choro — diz ele, que no entanto não se reconhece de forma alguma como um saudosista (tanto que não guardou nenhum dos seus LPs e logo foi se aventurar por outras ondas).

O DJ Zé Pedro e a apresentadora de TV Adriane Galisteu — Foto: Divulgação
O DJ Zé Pedro e a apresentadora de TV Adriane Galisteu — Foto: Divulgação

Já em São Paulo, depois de uma bem-sucedida incursão como DJ do programa da apresentadora Adriane Galisteu (em que ele chegou às massas, com seu som e seus trajes vistosos e criativos), Zé Pedro marcou época, no ano de 2002, com o lançamento do álbum “Música para dançar”, com remixes para as pistas do que ele chama de “MPB de raiz”: Alcione, Clara Nunes, Amelinha, Edu Lobo e até Marcos Valle (da hoje onipresente “Estrelar”).

— A TV me aprovou naquele personagem e depois eu quis recuar. Eu achava que tinha virado o Louro José e acabado com a minha carreira de DJ — confessa ele, que viu nascer um novo Zé Pedro a partir dos remixes.

Outro trabalho que tem espalhado o nome do DJ pelo país é o do selo Joia Moderna, voltado para projetos da MPB que não encontram espaço em grandes gravadoras. Por ele, saiu há alguns dias “Belezas são coisas acesas por dentro”, em que a cantora Filippe Catto relê as músicas de Gal Costa — o álbum provocou sensação entre crítica, músicos e ouvintes.

— Este era um disco em que eu não poderia errar. E não errei com a minha intuição — gaba-se ele, agora em paz com sua história. — Eu não transo, não fumo, não bebo e não tomo ácido. Agora, com o livro, as outras pessoas vão entender que eu não preciso da nada disso. Algumas me perguntam: “Por que você não entra num aplicativo (de encontros)?” Porque eu sou romântico, e isso não tem lugar em 2023. Ainda me sinto uma criança querendo ser adotada, não a pessoa que vai cuidar de alguém.

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