![Leny Eversong em Las Vegas — Foto: Reprodução](https://s2-oglobo.glbimg.com/ifPjaxiun7bshOkjGplfF8WR6m0=/0x854:2930x2545/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/Y/E/il27jzQD60k77ZMZ14BQ/104819658-sc-leny-eversong-em-las-vegas-reproducao.jpg)
Pouca gente sabe quem foi Leny Eversong (1920-1984). Ainda menos gente saberia não fosse Rodrigo Faour. O jornalista e pesquisador já produziu três coletâneas com gravações da cantora e agora está lançando o livro “A incrível história de Leny Eversong ou A cantora que o Brasil esqueceu” (Edições Sesc).
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Hilda Campos Soares da Silva nasceu em Santos (SP), e ganhou do radialista Carlos Baccarat o codinome (algo como Leny “canção eterna”) pelo qual ficaria conhecida . De fato, ela é menos conhecida no Brasil do que poderia e mais nos EUA do que se esperaria. Durante curto período, de 1957 a 1960, graças a seu vozeirão quase operístico ela foi uma das intérpretes mais conhecidas dos americanos.
— Quando cantou num cassino em Las Vegas, era Sarah Vaughan no foyer e Leny no palco principal. O sucesso dela foi breve, mas impressionante. Isso também me fez fazer o livro. Como uma cantora que conseguiu essa projeção é totalmente apagada da história? — estranha Faour.
A vida nunca foi fácil para ela. De infância pobre, dizendo ter passado fome, perdeu a mãe aos 13 anos e o pai aos 14. Casou-se aos 15 com um homem de 29. Já tinham um filho quando ela descobriu que o marido tinha outra mulher. Saiu de casa, o que foi considerado abandono de lar. Só recuperou a guarda de Álvaro, então com 7 anos, quando o pai dele, de mesmo nome, morreu.
Trabalhou no rádio desde os 12. Aos 15, recebeu o nome artístico porque cantava bem em inglês, embora não soubesse nada da língua. Segundo Leny, para que cantasse “I love you”, Baccarat escrevia “ai lovi iu” para ela ler.
![Capa do livro de Rodrigo Faour — Foto: Divulgação](https://s2-oglobo.glbimg.com/0CUf0pmXvwmFEVxy7vX4neqNbug=/0x0:1953x2697/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/k/O/3l2QtDTDy8ABcIQhqx6Q/104819645-sc-capa-leny-eversong.jpg)
Por duas décadas, tentou o sucesso em rádios de São Paulo e Rio e gravando discos de 78 RPM. Nada acontecia. Até que, à beira dos 35 anos, foi para o Rio se apresentar na Rádio Mundial. Sua interpretação de “Canta Brasil” (Alcyr Pires Vermelho e David Nasser) foi um estouro, com elogios de jornalistas e cronistas, inclusive Antonio Maria. Daí conquistou fama no Brasil, na América do Sul e chegou à América do Norte para temporadas de sucesso.
— Foi grande cantora do rádio, mas não ficou com essa fama, ao contrário de Angela Maria, Dalva de Oliveira, Marlene. Participou de festivais na década de 60, mas não era Elis Regina. Cantou samba-jazz, mas não era Leny Andrade. Tentou de tudo. A voz era muito poderosa até para o padrão radiofônico. Sobravam as músicas estrangeiras — afirma Faour.
Preconceito intelectual
Canções que exigiam potência, como “Summertime”, eram fáceis para Leny. Faour apresenta notícias que mostram o impacto que ela causou em Nova York, Los Angeles e Las Vegas. Foi vista por gente como Frank Sinatra, Sammy Davis Jr. e Lionel Hampton. Em 6 de janeiro de 1957, mal chegada aos EUA, cantou no popular programa de TV de Ed Sullivan no mesmo dia em que foi entrevistado Elvis Presley, já um astro.
Para o biógrafo de Leny, ela sofreu nos anos 1950 e 1960 preconceito por fazer sucesso em inglês — e também em espanhol, francês e italiano, idiomas que tampouco dominava.
— O nacionalismo da intelectualidade da época sufocou muito os artistas que não eram tidos como tão brasileiros por gravarem ritmos estrangeiros ou cantarem em outras línguas: Rosita Gonzales, Lana Bittencourt, Lenita Bruno, Albertinho Fortuna, Roberto Luna... — diz.
Outro preconceito foi a gordofobia. Leny chegou a 124 quilos, segundo uma reportagem. Enfrentou um problema hormonal na juventude e sempre comeu muito. As reportagens enfatizavam isso sem sutilezas.
— Ela era vista como a gorda que canta bem. Houve o machismo misturado com nacionalismo, a gordofobia e a vida pessoal confusa — diz o autor.
O filho, morto em 2017, foi viciado em drogas e atolou-se em dívidas. O segundo marido sumiu em 1973. No ano seguinte, encontraram a ossada. Pode, entre outras hipóteses, ter sido capturado por engano por agentes da ditadura ou confundido com o enteado por homens que queriam pegar Álvaro. Ney Campos e Leny eram casados em comunhão de bens, e o dinheiro, que estava na conta dele, ficou bloqueado até a confirmação da morte. Ela vendeu muitas coisas, entrou em depressão, morreu por conta de diabetes e acabou esquecida como cantora.