Ontem, a grande treta da internet se deu em torno dos muitos jovens que não sabiam quem era o “guitarrista que tocou com Ryan Gosling no Oscar 2024”.
Era ninguém menos que Saul Hudson, o Slash, ícone do Guns N' Roses, figura que seria reconhecida por qualquer um até mesmo sem a guitarra (mas não sem a cartola). Foi uma segunda-feira divertida, e aqueles que foram adolescentes nos anos 1990 ficaram nas redes tal qual Michael Jackson, comendo pipoca naquele meme do "Thriller".
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Já o Tiozão do Rock, aquela figura que a gente ama, fumegou e espumou de indignação. E o Tiozão do Indie Rock, que nunca achou os Guns N’Roses grande coisa, tripudiou. E alguns objetaram: tem uma criançada que de fato não sabe quem é Slash. Era útil que se explicasse, e tal. (Ainda vale lembrar que ali, junto com Ryan Gosling e Slash, estava o Bob Marley — ou Kingsley Ben-Adir, um dos Ken de Barbie, que também interpretou o ídolo jamaicano no filme "One Love".)
Uma questão que surge em torno de toda essa celeuma é: por que tanta gente vê o rock como um valor absoluto, que não se degrada – e nem mesmo se transforma – com o passar do tempo?
Para quem era jovem na virada dos anos 1980 para os 1990, o Guns N’Roses não surgiu sob o aspecto dos Valores Imutáveis do Rock (tal qual Led Zeppelin, Deep Purple, etc), mas como novidade. Era uma junção improvável da classe do Aerosmith com a fúria dos Sex Pistols, muito necessária no ambiente sanitizado do rock da época.
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Depois eles deixaram de ser a boa novidade, e tudo bem. O menino que foi em frente em sua busca encontrou Slayer, Faith No More, Metallica e Nirvana.
Corta para o Rock in Rio de 2022 quando, sob o olhar de um garoto de 15 anos, o show do Måneskin – banda de reality show, ainda sem repertório, longe de ser genial ou inovadora, mas com um instinto muito aguçado sobre como se fazer um show – foi mais empolgante do que o dos Guns. O Guns, para ele, era a banda com um guitarrista que alongava as canções ao infinito da paciência, só para fazer justiça a essa tradição chamada solo de guitarra.
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O Tiozão do Rock (pode ser Tiazona também, claro) se descabela: falhei como mãe/pai, tia/tio, madrinha/padrinho, avó/avô... Enquanto muitos que seguiram em frente, podem sonhar, por exemplo, que os filhos ou sobrinhos sejam fãs de trap. Seria a continuação mais justa do exemplo do filho que rejeita a MPB dos pais e abraça o rock porque ali está sendo feito algo vivo, perigoso, e só para ele. Desconfio muito do garoto de 2024 que é fã de Pink Floyd – em 1986, eu mesmo tinha deixado de ser.
Há, enfim, que se reconhecer também a capacidade de um astro de outros tempos em renovar o seu fã-clube – e a internet está aí para isso, ela é a grande benção nesse sentido. Pode ser até o Slash, mas isso tem que ser uma descoberta do jovem, não uma imposição do orgulho ferido de um Tiozão.