Cultura Música

Zé Renato deixa grupo Boca Livre por discordar de posições de colega bolsonarista

Lourenço Baeta também saiu por divergências com Mauricio Maestro, apoiador do presidente Jair Bolsonaro; apesar das diferenças, David Tygel afirma que permanece por ‘amor ao grupo’
Da esquerda para direita. David Tygel, Lourenço Baeta, Zé Renato e Mauricio Maestro Foto: Leonardo Aversa / Divulgação
Da esquerda para direita. David Tygel, Lourenço Baeta, Zé Renato e Mauricio Maestro Foto: Leonardo Aversa / Divulgação

O grupo vocal Boca Livre é mais uma vítima da polarização ideológica que, desde 2018, já deu muita briga em família, desfez amizade e até casamento. Zé Renato, integrante desde a primeira formação, em 1978, e Lourenço Baeta, que entrou em 1980, deixaram o quarteto por divergências com Mauricio Maestro, um dos fundadores. Maestro, alinhado com o presidente Bolsonaro e Olavo de Carvalho, e sempre compartilhando conteúdo de ambos em suas redes sociais, agora segue apenas com David Tygel, na banda desde 1978, entre idas e vindas. O anúncio foi feito pela empresária do grupo, Memeca Moschkovich, no Facebook.

Leia mais : 'Chateado, talvez, mas é tudo passageiro', diz Mauricio Maestro sobre separação do Boca Livre

— Não deixa de ser uma posição política, mas vai além disso. Vejo como preservação de liberdade, no sentido mais amplo da palavra — disse Zé Renato, por telefone, frisando que a decisão foi bastante amadurecida. — Não tenho filiação partidária. Mas comecei a ter dificuldade em participar de um grupo em que uma pessoa pensa exatamente o contrário. Não tenho problemas em dialogar, mas o que está acontecendo é a tentativa de cerceamento da liberdade.

A ideia do músico agora é investir ainda mais na carreira solo: lança ainda neste ano um álbum infantil, “Água para crianças” (Sesc), e outro com uma gravação de um show ao vivo, de 2004, com repertório de Orlando Silva (Discobertas).

Mauricio foi procurado pela reportagem, mas preferiu não se pronunciar sobre a saída dos colegas e sobre os novos rumos da banda.

Atualização : no dia seguinte, ele atendeu à reportagem e comentou o ocorrido: 'Chateado, talvez, mas é tudo passageiro'

Amor ao grupo

Lourenço Baeta também calculou a decisão há tempos e diz que ela está além do espectro “esquerda e direita”.

— Você convive com divergência politica, mas tem hora que vai chega num ponto mais difícil aceitar certas coisas. Até pelo fato do desgaste do tempo — disse o músico, ainda sem planos para os próximos passos.

Remanescente, David Tygel diz que já esperava que isso fosse acontecer, mas frisa que sua decisão de permanecer na banda não tem relação ideológica com Maestro.

— Ele tem uma posição contrária a minha. (Mas o Boca Livre) é um grupo que eu amo muito, não gostaria que acabasse. No sentido do trabalho musical, tenho uma relação muito boa com o Maurício — disse David.

MPB refinada

O Boca Livre tinha sua formação original composta por Zé Renato, Claudio Nucci, Maestro e Tygel. Seu álbum de estreia, “Boca livre” (1979), ultrapassou a marca de 100 mil cópias vendidas, impulsionado pelos sucessos de “Toada” e “Quem tem viola”. Nucci sairia no ano seguinte, sendo substituído por Lourenço Baeta. Referência de uma MPB refinada, com arranjos e harmonias vocais que fogem do convencional, o grupo tem no currículo parcerias com Milton Nascimento, Tom Jobim e Edu Lobo, entre outros.