Cultura
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Por Vagner Fernandes*

Clara Nunes, que morreu há 40 anos após sofrer uma anafilaxia durante cirurgia de varizes, era uma extraordinária vendedora de discos. Foi a primeira das grandes vozes femininas a ultrapassar a marca das 100 mil cópias de um álbum, deixando para trás Gal, Bethânia e a própria Elis. Isso já justificaria o relançamento de sua obra em formato físico, em vinil ou CD. Seus discos não eram para se ouvir apenas, mas também para se apreciar, pois capas e encartes levavam a experiências singulares. Na TV, ela explodia em musicais antológicos no “Fantástico”.

Clara foi uma cantora esteticamente impactante. Uma artista solar que, com indumentária, canto e dança assimilados das religiões de matriz africana, impôs respeito e dignidade às maiorias minoradas. Não foi no grito. Não foi lançando mão do “nós contra eles”. Mas com o canto afetuoso e o branco, cor mais presente em seu vestuário, identidade do povo de axé. Clara não era panfletária. Por isso circulou por meios tão complexos quanto diversos. Frequentava as rodas de samba da Doca, em Oswaldo Cruz, como encantava quem pagava para vê-la no Macksoud Plaza, hotel de luxo que não resistiu à pandemia.

Clara merece muitas reverências por tanto que fez em tão pouco tempo. Gravou 16 álbuns, sendo que, desses, quatro não lhe deram o prestígio ansiado. A carreira de sucesso durou, de fato, oito anos. Desfilou pela Portela em fevereiro, internou-se sem alardes em março, morreu em abril de 1983, após 28 dias em coma.

Há uma nova geração que pesquisa sua obra, omitida sabe-se lá por que motivos pela gravadora Universal, detentora dos direitos após incorporação da EMI. A caixa com sua discografia completa virou tabu. Muitos pedem, mas são ignorados. Dois vinis, recém-lançados em edição especial, “O canto das três raças” e “Brasil mestiço”, têm feito sucesso. Mas para comprar o segundo é necessário se associar a um clube do vinil, cuja mensalidade não é barata. Para uma cantora que arrebatou multidões, o que vem sendo ofertado é pouco diante de sua grandiosidade histórica na música popular do Brasil. No streaming, há uma desorganização da obra que merece ser revista. O antológico “Poeta, moça e violão”, de 1973, está de fora. É o registro de um projeto importante, que Clara protagonizou ao lado de Vinicius e de Toquinho, dando-lhe o status de estrela da MPB. É preciso que a gravadora dê mais atenção à obra de Clara Nunes.

Quando o mestre capoeirista Môa do Katendê foi morto em Salvador numa discussão política, seu velório no Pelourinho foi embalado pelo “Canto das três raças”, canção com a qual Clara, de forma didática, apresentou-nos que somos fruto de uma miscigenação incondicional entre pretos, brancos e índios. A pauta continua na ordem do dia. Clara foi pioneira ao tocar em tema tão delicado em 1976. Em quatro décadas de ausência, a guerreira mantém-se presente. Foi enredo de escolas de samba ao menos três vezes; ganhou homenagem numa infinidade de espetáculos; serviu de tema de mestrado e doutorado; vem sendo disputada por plataformas de streaming que desejam contar sua história. Este ano, a mineira que adotou o Rio será celebrada com a maior exposição sobre sua vida e obra no Museu Afro Brasil Emanoel Araújo, em São Paulo. Apesar dos que lhe viram as costas, Clara resiste ao tempo e aos que investem fortunas em campanhas com influenciadores, mas não destinam um centavo à preservação da memória de fundamentais personagens que ajudaram no alicerçamento da cultura brasileira.

* Biógrafo de Clara Nunes

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