Cultura
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Por Bolívar Torres — Rio de Janeiro

O esporte de C. J. Tudor, a rainha da literatura de horror, é a corrida. Quando a autora britânica precisa definir a diferença entre escrever romance e conto, ela não poderia usar outra analogia. Romance é maratona. Conto é sprint.

Os leitores brasileiros, que conhecem bem a maratonista graças ao best-seller “O homem de giz” (mais de 400 mil livros vendidos desde 2018), podem agora descobrir a corredora de pequenas distâncias. O novo lançamento de Tudor no país, “Onze portas para a escuridão” (Intrínseca), é a sua primeira incursão no conto. As histórias da coletânea são estranhas, intensas e assustadoras, como os fãs já estão acostumados.

— Eu adoro o formato curto porque não tem um pano de fundo, então você pode mergulhar bem no meio da história —diz em entrevista por Zoom, de sua casa em Nottingham, Inglaterra, onde vive com o marido e a filha de 7 anos. — Quando escrevo romances, meu maior problema é que fico ansiosa para chegar no fim da história. Com um conto você pode ter uma ideia maluca e detonar ela em uma semana.

Belo e creepy

Tudor sempre gostou de histórias curtas, mas o caminho até publicá-las foi um tanto acidental. Na verdade, nasceu de um processo doloroso para qualquer escritor. Entre 2020 e 2021, ela passou 12 meses escrevendo as 86 mil palavras de um romance que acabou sendo recusado por seu editor. Incapaz de reescrevê-lo, decidiu oferecer um projeto de contos para não deixar seus leitores na mão.

A autora britânica C. J. Tudor — Foto: Divulgação/ Bill Waters
A autora britânica C. J. Tudor — Foto: Divulgação/ Bill Waters

Por aqui, as histórias são acompanhados de ilustrações de Amanda Miranda, feitas especialmente para a edição brasileira — e que a autora classifica como “belas e ao mesmo tempo muito creepy (assustadoras)”

Tudor já foi rotulada de “Stephen King de saias”. Só que esse não é o maior elogio que ela gosta de ouvir (apesar da admiração pelo mestre americano, que, por sinal, é recíproca). Nada deixa a escritora mais feliz do que ver os leitores chamarem seus livros de “chiller” (resfriador em inglês).

Chiller para mim é tipo aquele formigamento que você tem, aquela leve apreensão de que a história está indo para alguma direção assustadora — define. — Tipo: eu sei que isso não é bom, mas não consigo desviar o olhar. Você sabe que algo está à espreita, mas se sente obrigado a ler.

Nos contos, ela busca provocar esse sentimento por vários caminhos — ou “portas”, para ficar fiel ao título da coletânea. O repertório é variado, sempre explorando o limite entre o fantástico e o terror. Uma entrada leva o leitor para um prédio abandonado, carregado de segredos, visitado por jovens inconsequentes. Outra para uma Arca de Noé travestida em cruzeiro, onde privilegiados vivem após a Terra ter sido envenenada. Uma terceira para um posto de gasolina em que uma garota com dons estranhos se afeiçoa a uma assassina. E por aí vai.

— Gosto de escritores que não são limitados por gênero ou expectativas — diz ela. — Acho engraçado quando as pessoas ainda falam de Stephen King como um escritor de terror, porque você sabe que, se olhar para o trabalho dele, pouca coisa se encaixa na definição. Ele superou o gênero, porque todos os seus livros oferecem algo diferente. Quero ser assim também. Em cada livro crio um playground totalmente novo.

Dez anos de recusas

Os lançamentos brasileiros de Tudor transitam entre o suspense com ares sobrenaturais (“O que aconteceu com Annie”), o thriller macabro (“Garotas em chamas”) e a ação hipnótica (“As outras pessoas”). Mas o cartão de visitas dela é mesmo a obra de estreia, o perturbador “O homem de giz”, sobre um jogo infantil que toma rumos assustadores.

Antes do sucesso mundial, porém, ela passou dez anos vendo as editoras rejeitar seus projetos e manuscritos. Para pagar as contas, Tudor trabalhou como redatora, dubladora e podcaster, além de alguns bicos. Pouco antes de o livro sair, passeava com cachorros pelas ruas de Nottingham. “Se um passeador de cães consegue virar best-seller, qualquer um consegue”, costuma dizer a autora, que volta e meia relembra os anos de perrengue.

— Isso está sempre lá, no fundo da minha mente — lembra. — Eu via “O homem de giz” como minha última chance de conseguir publicar um romance. E certamente era. Se não tivesse dado certo, teria continuado a escrever, mas só pelo prazer. A vida teria sido diferente, mas não ruim. Eu tenho uma filha e um marido maravilhosos. Não teria realizado um sonho, mas teria outras coisas.

Horror no Minecraft

A filha, aliás, está na origem de duas ideias de livro. A do primeiro veio após a menina, então com 2 anos, passar a tarde desenhando com giz na calçada. Ao abrir a porta dos fundos à noite, Tudor percebeu que as figuras ficavam assustadoras no escuro. Já “Garotas em chamas” surgiu após uma noite presa no tráfego, imaginando o que aconteceria se um rosto estranho surgisse do lado de fora do vidro e levasse uma criança em um carro.

Cada vez que é mencionada (ou que ouve um assunto que a interessa), a filha se intromete na entrevista, gritando algo em outro cômodo da casa. As intervenções fofas contrastam com o caráter um tanto macabro da conversa.

Quando o papo chega à literatura de horror contemporânea, com histórias e personagens coletivos surgindo em fanfics de videogames e tramas publicadas anonimamente em fóruns on-line, ela dá mais uma vez a sua contribuição.

— Minha filha está jogando Minecraft e tem esse personagem... — diz Tudor, tentando lembrar o nome.

— Herobrine! — grita a filha.

O personagem é um fantasma que foi adicionado misteriosamente ao universo do jogo. O que se conta é que seria uma homenagem ao falecido irmão de seu criador, mas ninguém até hoje descobriu se o caso é lenda ou realidade. Para Tudor, Herobrine tem tudo para ser o novo Slender Man, personagem que surgiu nos fóruns, foi ganhando corpo como criação coletiva e, em pouco tempo, virou filme, livro e videogame.

— Não é muito diferente de quando eu era criança e tínhamos mitos sobre pessoas que apareciam na mata aonde íamos brincar. Acho ótimo como as mesmas coisas se reinventam e se transformam. Eu mesmo às vezes tento criar histórias bem curtas na cabeça como fazem no Twitter.

A autora lembra que, não faz muito tempo, leu uma história de “gelar a espinha” no forum Reddit.

— É mais ou menos assim: um pai vai dar boa noite para o filho, e o filho diz que tem um monstro debaixo da cama — conta a escritora. — Para tranquilizá-lo, o pai olha debaixo da cama. Ele encontra o próprio filho, que diz: “Pai, tem um monstro na minha cama”. Brilhante, não?

Ainda que não seja gamer e não passe muito tempo em fóruns, Tudor se diz levemente influenciada pelas novas tendências no horror:

— Sei que temos essas divisões em rótulos porque isso deixa as pessoas mais confortáveis nas livrarias, mas livros cruzam gêneros o tempo todo. Li tantos livros que foram classificados como thriller ou crime, mas acabaram sendo muito mais gráficos e sangrentos do que muitos romances de horror. A linha que separa todos esses gêneros é muito tênue.

Profecia pandêmica

Lançado nos EUA em janeiro, mas ainda inédito no Brasil, o mais recente livro de Tudor, “The drift”, também embaralha as fronteiras entre os gêneros. Ele é definido por ela como um “thriller de horror zumbi pós-apocalíptico”. Pela sinopse, daria para adicionar ainda “catástrofe”. O livro reúne três histórias que se interligam durante uma tempestade de neve em um local atingido por uma pandemia viral. A premissa ecoa traumas recentes que o mundo conhece bem.

— Queria explorar essa ideia: por que todas essas pessoas estão presas? Por que ninguém vem resgatá-las? — explica a autora. — O que sabemos na história é que a sociedade não está funcionando muito bem e, na verdade, todos estão tentando chegar ao mesmo lugar com segurança. Então, há uma história maior a ser construída entre tudo isso. Tive a ideia em 2019, mas só consegui escrever em 2021. De certa forma, eu me senti um tanto profética.

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