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Por Ruan de Sousa Gabriel — São Paulo

O escritor tcheco Milan Kundera, uma das grandes vozes da literatura mundial, morreu aos 94 anos em Paris, anunciou sua editora Gallimard, em Paris, e a porta-voz da biblioteca que leva seu nome em sua cidade natal, Brno.

O autor de "A imortalidade" (1990) e "A Insustentável Leveza do Ser" (1984) morreu ao meio-dia de terça-feira, 11 de julho de 2023", disse a Gallimard em um comunicado. "Infelizmente, posso confirmar que Milan Kundera faleceu ontem (terça-feira) após uma longa doença", disse à AFP Anna Mrazova, porta-voz da Biblioteca Milan Kundera em Brno.

Sarcástico retratista da condição humana, Kundera foi um dos raros autores incluídos na prestigiosa coleção La Pléiade (em 2011) em vida. O romancista vivia na França desde que emigrou da antiga Tchecoslováquia em 1975, então sob o regime comunista.

Kundera perdeu a nacionalidade tcheca depois de cair em desgraça com as autoridades de seu país durante a Primavera de Praga, o movimento reformista de 1968 esmagado pelos exércitos sob o comando soviético. Recuperou a nacionalidade apenas em 2019, embora tenha se naturalizado francês em 1981.

Em 1984, publicou o livro que o estabeleceu internacionalmente: "A Insustentável Leveza do Ser", um retrato sarcástico da condição humana e um dos romances mais influentes do mundo. Cheio de referências filosóficas (de Parmênides a Nietzsche), o livro discute temas como liberdade, amor e sexo, repetição histórica e como dar sentido à vida ao acompanhar os impactos na repressão política que se seguiu à Primavera de Praga, em 1968, na vida de cinco personagens: Tomas, Tereza, Sabina, Franz e a cadela Kariênin.

“A insustentável leveza do ser” transformou Kundera num best-seller — inclusive no Brasil, onde alguns intelectuais questionaram as razões de tamanha popularidade. No GLOBO, Muniz Sodré acusou o “mestre do texto digestível” de “excessiva adequação ao espírito mercadológico do momento”. O livro virou filme hollywoodiano em 1988, com Daniel Day-Lewis e Juliette Binoche. O autor não gostou do resultado e nunca mais autorizou a adaptação cinematográfica de seus romances. No Brasil, a produção estreou na mesma semana em que chegou aos cinemas americanos e passou nada menos que dois anos em cartaz.

Expulso duas vezes

Kundera nasceu em Brno, na então Tchecoslováquia, em 1º de abril de 1929. “Isso tem significado metafísico”, disse certa vez, associando ter nascido no Dia da Mentira a seu conhecido sarcasmo. Em sua prosa, o trágico e o cômico se misturam a discussões existenciais em frases bem torneadas. Do pai, herdou o gosto pela música clássica (também frequente em seus romances).

Na juventude, abraçou o comunismo, mas foi expulso do partido duas vezes por apoiar reformas democratizantes, primeiro no início dos anos 1950 e depois em 1970, ano em que publicou “Risíveis amores”, reunião de contos sobre arte de iludir e ser iludido.

Milan Kundera posa com a mulher em 1973 — Foto: AFP
Milan Kundera posa com a mulher em 1973 — Foto: AFP

Ele já havia satirizado a burocracia comunista no romance “A brincadeira”, no qual um estudante é condenado a trabalhos forçados por ironizar o regime em um cartão-postal. Kundera caiu no ostracismo após a expulsão definitiva. Sustentou-se com trabalhos braçais tocando piano e escrevendo sob pseudônimo (inclusive uma coluna de astrologia).

Em 1973, lançou “A vida está em outro lugar”, ambientada na Tchecoslováquia sob ocupação nazista. Dois anos depois, exilou-se na França com a esposa, Vera, em busca de liberdade política e criativa. Lá, publicou “A valsa dos adeuses” (1976) e “O livro do riso e do esquecimento” (1979), no qual coloca em foco a vida na Tchecoslováquia após a invasão soviética.

Após o estouro de “A insustentável leveza do ser”, vem à luz o último romance de Kundera escrito em sua língua materna: “A imortalidade”, de 1990. A partir de “A lentidão”, de 1995, Kundera passou a escrever em francês, idioma do qual seus livros já eram traduzidos mundo afora. No Brasil, começou a ser publicado, ainda nos anos 1980, pela Nova Fronteira. Em 1998, entrou para o catálogo da Companhia das Letras. Desde o princípio, o autor estabeleceu uma relação de amizade com sua tradutora brasileira, Teresa Bulhões Carvalho da Fonseca.

A mudança do tcheco para o francês também marcou o deslocamento do interesse do autor de questões políticas para discussões filosóficas em livros como “A lentidão” (1995), “A identidade” (1998) e “A ignorância (2000). Neste último, debate a impossibilidade de retornar à República Tcheca depois de mais de duas décadas de exílio. Embora tenha passado a frequentar a lista de candidatos ao Prêmio Nobel de Literatura, Kundera se afastou da ficção nos anos 2000 e só em 2014 publicou um novo romance: “A festa da insignificância”, que tem pitadas da filosofia de Schopenhauer.

Também se dedicou ao ensaio. Em obras como “Os testemunhos traídos”, “O encontro” e “A cortina”, filiou-se à grande tradição literária ocidental, elegendo como companheiros nomes como Cervantes, Goethe, Kafka e Carlos Fuentes.

Quando lhe perguntavam se era “comunista”, “dissidente”, “de esquerda ou de direita”, Kundera invariavelmente dava a mesma resposta: “Não, sou romancista”. No ensaio “Os testamentos traídos”, de 1993, ele escreveu que “ser romancista” era “uma atitude, uma sabedoria”, “uma posição que excluía toda identificação com uma política, com uma religião, com uma ideologia”. Pode parecer paradoxal que essa seja a profissão de fé de um escritor cuja obra (de “A brincadeira”, de 1967, a “A ignorância”, de 2000) está intimamente associada à história política de seu país do domínio stalinista à democracia. Mas Kundera apreciava os paradoxos. Tanto romance mais célebre se chama “A insustentável leveza do ser”.

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