Cultura
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Por Talita Duvanel — Rio de Janeiro

Num texto publicado em 2019 na revista Época Negócios e reproduzido no no livro “Desmistificando a inteligência artificial” (Editora Autêntica), Dora Kaufman terminou suas reflexões com a pergunta: “Arte de inteligência artificial é capaz de nos emocionar como a arte humana”? Professora do Programa Tecnologias da Inteligência e Design Digital da Faculdade de Ciências Exatas e Tecnologia da PUC-SP, a pesquisadora, quatro anos depois, defende que é preciso olhar para as criações da IA generativas como inéditas, mas não como criativas.

— Inteligência artificial, no estágio em que está, não entrou nesse espaço da criatividade humana — diz Dora ao GLOBO, que aborda também direito autoral e regulação na entrevista a seguir.

O GLOBO: Quais as áreas da cultura que sofrem mais impacto da IA?

Dora Kaufman: É difícil responder. Eu, pelo menos, nunca vi pesquisas nesse sentido. Mas o advento da IA generativa (um exemplo é o ChatGPT, capaz de gerar um texto a partir de uma imensa base de dados) atingiu mais a indústria criativa como um todo. A (anterior) IA preditiva automatizou funções, mas houve um entendimento de que a parte criativa estava protegida porque as máquinas não conseguiam criar. Porém, a generativa entrou nesse domínio. Acho, no entanto, que vale repensar o que é criatividade. Hoje, faço uma distinção entre “inédito” e “criativo”. Imagens e textos produzidos pela IA são inéditos, porque não existiam antes, apesar de baseados em outras obras. Pondero, no entanto, se são criativos. Criatividade, para mim, é trazer alguma contribuição inovadora ao que já existe. E a IA generativa não faz isso. Se considerarmos que as produções da IA são criativas, temos que supor que todas as pessoas são criativas também. E nunca consideramos isso. A criatividade ainda é um atributo do ser humano.

Dora Kaufman, especialista em IA — Foto: Ilana Bessler/Divulgação
Dora Kaufman, especialista em IA — Foto: Ilana Bessler/Divulgação

Há autores processando a OpenIA, criadora do ChatGPT, por terem seus livros armazenados na base de dados sem autorização. O New York Times tem negociado com a empresa sobre remuneração para que suas matérias abasteçam a tecnologia. Como a senhora enxerga a discussão entre IA e direito autoral?

Acredito que também temos que repensar o que é direito autoral e propriedade intelectual (hoje). Estou colocando questões, não tenho respostas fechadas. Qual a diferença entre buscar referências e usar uma base de dados para fazer o treinamento de um sistema? Isso é toda uma discussão. Mas há outras questões complexas.

Quais, por exemplo?

Quando um volume extraordinário de dados é usado para treinar a base de um sistema, não existe a possibilidade de identificar qual foi, por exemplo, a obra de arte ou o texto de determinada pessoa que compôs aquele resultado final apresentado. Uma imagem produzida pela IA generativa foi baseada em bilhões de outras. Quais foram elas? Não há como saber e remunerar o artista. O que se pode fazer é não incorporar no sistema nada do que for protegido por direito autoral. Só que isso também é muito complicado. Hoje, as grandes bases de dados usadas para treinar a IA generativa são captadas por um processo de rastreamento de tudo o que existe na web, sem seleção. Entram desde as piores coisas que podem existir até as coisas protegidas por direito autoral. Da maneira como é feito hoje, nessa terra de ninguém, sem uma regulação, não tem como fazer isso. É tudo muito novo.

Qual a sua opinião sobre o projeto de lei 2338/2023, que está em tramitação para regular a inteligência artificial no Brasil?

Todos os PL que foram apresentados no Senado e na Câmara eram inócuos. Esse é um ponto de partida para a discussão, mas longe de estar pronto para se tornar um marco regulatório da IA no Brasil. Precisa ser discutido amplamente, e o tempo é essencial. O Marco Civil da internet (de 2014) foi discutido durante cinco anos. A proposta de regularização da IA da Europa, que está longe de ser resolvida, começou a ser preparada em 2018. O processo é tão importante quanto o resultado final. A sociedade, as empresas, as universidades, todos precisam participar ativamente dessa discussão. O tempo é necessário também para os parlamentares começarem a se familiarizar com o assunto. A percepção nas minhas interações em consultas públicas é que deputados e senadores desconhecem o que se trata. Como você vai propor e desenvolver um marco regulatório de um objeto que você não conhece?

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