Cultura
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Por — Rio de Janeiro

“Estou sempre bêbada com as minhas próprias lágrimas, não foi isso que todos disseram?”, canta Taylor Swift em “Who’s afraid of little old me?”, a 10ª das 16 faixas de “The Tortured Poets Department” — o seu novo álbum (na verdade, o álbum musical mais aguardado mundialmente este ano), que chegou ao streaming à 1h do Brasil desta sexta-feira. Ou seja: Taylor não poderia ter sido mais Taylor no momento em que mais se esperava dela. E ainda teve uma surpresa: duas horas depois ela lançou uma segunda parte do álbum, batizada como "The Anthology", com outras 15 canções.

Matar e morrer de amor, denunciar o mau amor, mas tudo com muita classe, sintetizadores bonitos e tiradas espirituosas em canções que vão render ainda um ano inteiro de especulações acerca de quem foram compostas: a cantora segue à risca o script de seus últimos álbuns (inclusive com a colaboração de seus parceiros e produtores de fé, Jack Antonoff e Aaron Dessner) em um disco que se propõe a inaugurar uma nova era, mas não muito.

Definitivamente, “Poets” não é um “Cowboy Carter” de Beyoncé, disco que chega para reivindicar o papel de reorganizador político do pop. É, isto sim, uma boa coleção de canções muito bem produzidas, com a intenção de criar um pouco mais ou um pouco menos de drama, em uma audição que pode até ser um pouco exaustiva num fim de dia — mas que traz bons momentos, típicos de quem vem fazendo isso por boa parte da sua vida e conhece muito bem o ouvinte com quem está falando ao pé do ouvido.

“Eu te amo, isso está arruinando minha vida”, anuncia Taylor em “Fortnight”, faixa de abertura, com feat discreto de Post Malone, que dá um bom resumo do que vem pela frente, com suas camas de sintetizadores (forradas com bom gosto por Antonoff) e uma melancolia que, a cada disco, a aproxima mais de Lana Del Rey. Na faixa-título, evocativa do Fleetwood Mac dos anos 1980, a cantora faz umas boas piadas de fundo literário, na descrição irônica dos seus (quase sempre ex-)amores: “Eu ri na sua cara e disse: ‘Você não é Dylan Thomas, eu não sou Patti Smith, este não é o Chelsea Hotel, somos idiotas modernos’.”

Da ala mais triste do disco “Down bad” surge como a de letra mais violenta (“como você ousa pensar que é romântico / deixar-me segura e encalhada? / porque foda-se, eu estava apaixonada / então vá se foder se eu não posso ter nós”), colada na igualmente melancólica “So Long, London” (“e você diz que eu abandonei o navio, mas eu estava afundando com ele”). Para contrastar, “But Daddy I love him” resgata a velha Taylor interiorana, numa espécie de “Papa don’t preach” da nova era, com passagens deliciosas como “crescer precocemente às vezes significa não crescer” e “escândalo faz coisas engraçadas com o orgulho, mas aproxima os amantes”

O papo de mulheres com Florence Welch em “Florida!!!” também rende boas frases (“então eu fiz o meu melhor para botar para descansar / todos os corpos que já estiveram no meu corpo”) e a memória do Fleetwood Mac e suas inebriantes canções para rádios FM ressoa em “Guilty as sin?” e, com uma sonoridade mais abrasiva, em “My boy only breaks his favorite toys”, canção dos provocativos versos “assim que eu me consertar / ele vai sentir minha falta”.

Por falar em provocação, a climática “Who’s afraid of little old me?” atende às expectativas criadas pelo bom título (“quem tem medo da pequena velha eu? / bem, você deveria ter!”), enquanto “I can fix him (no really I can)” (outra que fala em consertar o que foi quebrado) traz imagens religiosas por cima de uma base musical dramática, de trilha de faroeste: “Eu vou te mostrar o céu se você for um anjo, todo meu / confie em mim, eu posso lidar comigo como um homem perigoso”.

Capa do álbum 'The Tortured Poets Department', de Taylor Swift — Foto: Reprodução
Capa do álbum 'The Tortured Poets Department', de Taylor Swift — Foto: Reprodução

A reta final de “The Tortured Poets Department” não deixa a peteca cair, com um punhado de boas faixas. Caso de “I can do it with a broken heart” (eletrônica, quase um Depeche Mode das antigas, com uma alegria musical que contrasta com a letra – “estou tão deprimida que ajo como se fosse meu aniversário todos os dias” – e dos vocais) e de “The smallest man who ever lived”, na qual o piano ajuda Taylor a destilar uma incrível quantidade de rancor, mas sem sair do salto.

O disco ainda traz a ótima “Clara Bow”, faixa batizada com o nome de uma atriz americana de muito sucesso na época do cinema mudo, que teve um destino sofrido, assolada que foi por problemas psiquiátricos. É uma coleção de histórias de mulheres que tiveram que enfrentar as ilusões das grandes cidades e do showbiz, e que culmina com o que seria uma fala de um homem para uma dessas candidatas ao estrelato: “Você parece Taylor Swift sob esta luz, estamos adorando / você tem pegada, ela nunca teve / o futuro é brilhante e deslumbrante”. É, essa é moça que sofre, mas que também sabe dar uma risada de si mesma.

E isso foi o primeiro disco. Lançado na alta madrugada, com a alegação de que “escrevi tanta poesia torturada nos últimos anos que queria dividir ela inteira com vocês”, “The Anthology” traz um tanto mais de incursões pelo universo Taylor, e mais alguns quilômetros de letras, mas sem o mesmo o sentido de álbum do “Tortured Poets Department”.

É um complemento assumido, um tanto mais de horas para se avançar pela noite (sim, como a capa indica, é um disco mais noturno), com menos produções de Jack Antonoff (“The Black Dog”, “imgonnagetyouback” e a neo-barroca “I look in people’s windows”) — ou seja, bem menos chuva de sintetizadores — e um passeio pelo lado introspectivo, folk e pianístico, que é o departamento Aaron Dessner da obra de Taylor Swift.

E dá-lhe violão em “The albatross”, (“homens sábios já leram notícias falsas / e acreditaram nelas”), “Chloe or Sam or Sophia or Marcus” (“você precisava de mim, mas precisava mais das drogas”), “I hate it here” (dos contro-versos “se tivéssemos que escolher uma década / em que gostaríamos de poder viver em vez desta / eu diria a de 1830, mas sem todos os racistas”), “thanK you aIMee” (com o melhor recado de todos, seja para Kim Kardashian ou para quem for: “compus mil músicas que você acha chatas / construí um legado que você não pode desfazer”), “The Prophecy” e “The bolter”

Fecho de ouro

Já o piano é o guia de “How did it end?”, “Cassandra”, “Peter” (uma daquelas músicas que bem poderiam ter sido Lana Del Rey), “Robin” e “The manuscript”, tristíssima canção que encerra a audição das 31 faixas com o esperado fecho de ouro: “de vez em quando eu releio o manuscrito / mas a história não é mais minha”.

Ah, no meio das produções de Dessner, veio ainda o curioso rock estilo Alanis Morissette “So high school”, completinho em sua intenção retrô, inclusive com menção aos anos 1990 na letra (“estou assistindo ‘American Pie’ com você num sábado à noite”). Missão cumprida, agora é a vez de o público de Taylor embarcar na maratona, decifrar as mensagens e tomar para si essas canções que, desde a madrugada de sexta-feira, não pertencem mais à autora.

Cotação: Bom

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