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Cristian Budu tinha contas a acertar com a música brasileira, depois de ser um dos mais bem sucedidos pianistas clássicos do país, com um álbum sobre Chopin e Beethoven lançado pela Klassik e elogiado pela revista inglesa Gramophone e registros ao lado de luminares como Antonio Meneses (violoncelo). O diademense de 35, que tem pais romenos, nunca se esqueceu das investigações do repertório nacional que fazia quando era aluno de Antônio Nóbrega, há 20 anos, e essa curiosidade gestava um projeto.

– Ali a gente estudava muita percussão e danças brasileiras, essa veia do Ariano Suassuna, e comecei essa questão de entender os Brasis que a gente tem, como essas identidades e essa história tão complexa, profunda, que vai muito além daquilo que muitas vezes, mesmo no Brasil e fora do Brasil, se vende como uma imagem superficial ou simplesmente alegre.

Essa semente germinou neste ano, em que Budu lança em CD e streaming o álbum duplo "Pianolatria", uma tentativa de criar uma ponte com um repertório muito brasileiro e pouco valorizado pelas escolas de música, segundo o pianista. O nome surge de um texto do escritor e pesquisador modernista Mário de Andrade, que, na intenção de delinear uma identidade musical brasileira, criticou em 1920 a onipresença do piano na cena paulistana.

Lançado pelo selo Sesc, o álbum tem sérias ambições: conta com textos do escritor e professor da USP José Miguel Wisnik, entre outros, e apresenta um caleidoscópio da produção de compositores consagrados e outros que acabaram conhecidos como "pianeiros", autores de uma vertente mais popular da música, menos consagrada pela musicologia clássica, frequentemente ouvida nos salões e saraus entre os séculos XIX e XX.

Apoiado na pesquisa de Alexandre Dias, que comanda o Instituto Piano Brasileiro, e da curadora e historiadora Claudia Toni, Budu tira do ostracismo autoras como Clarisse Leite ("Lendas e Nada Mais") e Tia Amélia, colocando-as ao lado dos consagrados Villa-Lobos, Camargo Guarnieri e Francisco Mignone. Além disso, mostra a influência dos ritmos afrobrasileiros, como na Suíte Litúrgica Negra, de Brasílio Itiberê, que representa Xangô, Ogum e Exu musicalmente. Inclusive, "Exu" é um dos três clipes que acompanham o álbum, além de um minidocumentário.

Para Budu, são mostras de que havia muita coisa definitivamente brasileira antes da obsessão da Semana de 22 de decretar o nascimento do Brasil nas artes.

– Ernesto Nazareth e Chiquinha Gonzaga já estavam fazendo algo essencialmente brasileiro no fim do século XIX, entre outros. A gente está falando dos pianeiros, os músicos práticos, os músicos que tocavam na noite, os músicos que estavam na rua. Eles estavam já incorporando um monte de influências sem que alguém precisasse validá-los. Mas, ao mesmo tempo, foi muito importante que esse meio intelectual quisesse admitir essa necessidade de incorporar esses trabalhos. Mesmo os que estavam imitando muita coisa de fora, mas de um jeito brasileiro, incorporando, sem nenhuma vergonha, os traços que só existiam aqui, com origens não europeias, e colocaram na própria escrita. Então, aí a gente percebe que, no fundo, existe uma admissão do que é brasileiro.

Há também elementos de uma jornada pessoal do menino que falava romeno em casa, mas que sempre foi estimulado pela mãe a se sentir brasileiro e que ganhou o mundo ao conquistar o Prêmio Clara Haskil, em 2013, na Suíça. Hoje, "Pianolatria" não deixa de soar como um projeto de embaixada dessa música, que não deixa de ser um trunfo para um músico sul-americano: em maio, ele se apresenta em Miami, Washington e Boston, e já tem agendadas idas a Buenos Aires e França e uma vinda ao Rio, para tocar o empolgante "Concerto em Formas Brasileiras" de Hekel Tavares com a Sinfônica Brasileira nos dias 22 e 23 de junho. E a "munição" já foi testada lá fora.

– Eles ficam muito intrigados, porque é um repertório completamente desconhecido para eles. Quando toquei no Festival de La Roque d'Anthéron, o crítico francês Alain Lompech ficou especialmente tocado pelos ponteios de Camargo Guarnieri, que ele colocou não como simples pecinhas curtas, mas como demonstrações de um universo muito mais profundo, de uma paisagem, um traço brasileiro muito enigmático.

Piano internacional no Copa

A pianolatria também vai se manifestar, em sua forma internacional, no Teatro do Copacabana Palace (332 lugares), que receberá a série Pianissimo. Promovida pela Casa de Cultura GES-2, de Moscou, a iniciativa leva jovens ases do piano a localizações inesperadas ao redor do mundo.

Depois de passar pelo Hermitage de São Petersbursgo e pelos Alpes Suíços, a série aterrissa nas Américas, com o croata Jan Nikovich, de 23 anos, que se apresenta nesta quinta (25) tocando peças de Rameau, Mozart, Liszt, Debussy, Scriabin e Tchaikovsky. Na sexta (26), o multipremiado turco Can Saraç, de 16 anos, se apresenta com Liszt, Brahms e Chopin.

Completam a série o italiano Massimiliano Grotto (2 de maio) e o russo Dmitry Shishkin (3 de maio). Todos os espetáculos começam às 20h, e os ingressos vão de R$ 50 a R$ 300, disponíveis na plataforma Sympla.

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