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Fábio Porchat: 'É uma época ótima para fazer piada'

Prestes a estrear novo programa no GNT, comediante diz que quer menos lacração e mais boas histórias na TV
O comediante Fábio Porchat posa no cenário do seu novo programa de TV Foto: divulgação/wee! digital
O comediante Fábio Porchat posa no cenário do seu novo programa de TV Foto: divulgação/wee! digital

RIO - Uma moça que quase foi presa no dia do casamento. Um galã de novela que trabalhou dando sustos fantasiado de alienígena na adolescência. Uma sobrevivente de um câncer de mama, que, insegura com o que o parceiro acharia dos seus seios na primeira vez na cama, acabou descobrindo uma peculiaridade sobre a aparência dele. Essas foram algumas das experiências compartilhadas durante a gravação do programa “Que história é essa, Porchat?” , que o apresentador Fábio Porchat estreia no GNT em 6 de agosto. Na entrevista a seguir, o comediante explica que criou o formato para fugir da cultura da lacração das redes sociais, fala do medo de ficar desatualizado e ainda revela que quer ser pai no ano que vem.

Me explica o que é o seu novo programa.

Quando estava fazendo talk show (o extinto “Programa do Porchat”, na Record) , percebi que todo mundo estava dando opinião. Gente que você nem quer saber opinião sobre as cotas, está falando sobre as cotas. Gente que não tem nada a ver com feminismo, está falando sobre feminismo. Bolsonaro em todo lugar. Senti que as pessoas estavam lacrando nas redes sociais, no programa da Fátima, na Luciana Gimenez, no Danilo (Gentili) , no Bial, e isso começou a me incomodar um pouco. Porque no fundo, o que a gente lembra do “Programa do Jô”? Eram das histórias que as pessoas contavam. Criei esse programa porque não quero saber a opinião dos meus convidados nem o que eles estão fazendo, quero ouvir a melhor história que eles tenham para me contar, famosos e anônimos. Pode ser alegre ou triste. Para mim, história boa é quando a pessoa vira e fala “Mentira?!”. Logo no piloto, por exemplo, tinha uma mulher que já tropeçou no Dalai Lama.

A gente estava perdendo o hábito de ouvir o outro, de conversar? Por quê?

As pessoas estão muito indignadas com as coisas e querendo ser ouvidas. Porque nunca foram, nunca puderam ser ouvidas. E as redes sociais dão uma falsa ilusão de que elas estão sendo ouvidas. Aí você vai ver, a pessoa tem 12 seguidores, mas ela se sente muito poderosa. É lógico que eu acho que tem que falar. O que estou dizendo que só está se falando e não está se aproveitando o que as pessoas têm como experiência de vida.

Você falou do Jô. Você sente falta do estilo de talk show dele?

Não disse isso, o que eu falei foi “lembra do Jô”. O Jô era o youtuber da época. Eu adoro os talk shows que estão aí. Estou falando dele porque foi quem popularizou esse formato. Ele para mim é um modelo do cara que quer o melhor para si e isso é o que eu persigo. Quando as pessoas dizem, "mas por que você saiu da Record se o programa estava bem?", eu falo que eu não conseguia ver um futuro para ele. Não queria fazer um programa meia-boca. Não preciso me pautar pela audiência, pelo dinheiro. Tenho que me pautar pelo artístico. Então parei por ali. Saí muito bem com a Record, falo com todo mundo até hoje.

A gente vive numa época em que os comediantes estão sendo classificados por espectros políticos. É um período complicado para o humor?

Não acho. É uma época ótima para fazer piada. Difícil foi na ditadura. Difícil é fazer humor para o censor. As pessoas estão mais sensíveis, mas tudo bem. O humor não está sendo podado, não está tendo uma censura ao humor. Está havendo um momento político com pessoas mais inquietas, querendo que não se brinque com certas coisas. A gente está aprendendo o que é democracia ainda, o que é liberdade de expressão. A gente gosta de democracia só para o bem, mas é também para o mal. Mas tudo é melhor do que você ser impedido de dar uma opinião.

Há alguns dias, o governo federal disse que não patrocinaria mais filmes que "atentem contra valores tradicionais" . Isso não te preocupa?

É, isso é perigoso. Quem que vai fazer esse censo? Quando a pessoa fala que vai fazer uma banca para analisar projeto, acabou, a gente perde aí. O que tem que ser é uma análise abrangente: é um filme pornográfico? Então não pode. Mas se é um filme de esquerda, de direita, se é político, se conta a história de um gari, de um presidente, de uma garota de programa, aí tudo bem, conta a história que quiser e assiste quem quiser. E assim é a democracia. Qualquer edital de cultura no mundo não tem julgamento de valor. Tem julgamento de valor financeiro.

Mas você acha que isso é só uma fase, vai passar?

Não faço a menor ideia. Todo dia temos uma novidade. Não sei o que pode acontecer. Me parece que todo dia se fala uma coisa maluca, e daqui a pouco volta-se atrás e ajeita um pedaço ou outro. A gente ainda está entendendo este governo. Nem o próprio governo está se entendendo, que dirá a gente dele.

Não só na política, há o sentimento de que vivemos o tempo dos absurdos. Como o humor lida com isso? Tem que ficar mais absurdo ainda?

O humor observa tudo isso. Tem situações que são absurdas e a piada já vem pronta. Mas não acho que esteja mais maluco do que antes. A gente já viveu momentos piores, com menos informação, com mais racismo, mais pobreza, mais machismo, mais homofobia. Só da gente poder falar disso, já mostra que estamos num bom caminho. Claro que a passos lentos. Mas eu tenho certeza de que vivo num mundo melhor do que a minha avó viveu. A gente tem que esperar. E quanto mais maluquice, melhor para o humor.

Fábio Porchat posa no cenário do seu novo programa, durante gravações nos Estúdios Globo, no Rio Foto: divulgação/wee! digital
Fábio Porchat posa no cenário do seu novo programa, durante gravações nos Estúdios Globo, no Rio Foto: divulgação/wee! digital

Como humorista, você tem medo de ficar desatualizado com o tempo?

Com certeza. Meu maior medo é ficar um velho sem graça. Dando opinião maluca. Geralmente as pessoas vão ficando mais velhas e vão dando opiniões pavorosas.

Dá pra piorar com a idade?

Geralmente se piora. Eu já quero com 60 anos jogar meu celular no mar e viver numa aldeia na Itália para ninguém me achar. Porque imagina, daqui a vinte anos, ninguém vai mais comer bicho, vai ser uma vergonha. Vão virar e falar: “Ai, como é que você comia vaca?” E eu vou dizer: “Comia mesmo!!!”. É que nem os que falam hoje que “é um viadinho” ou que “mulher precisa de homem”. Só que vai ser eu falando: “Bom mesmo era gasolina, que queimava e poluía!” Vão dizer que não existe mais carro assim e eu vou responder: “ Esses elétricos não estão com nada! Eu gostava da época em que eu pegava meu carro e atropelava gente!”. Aí vai ser um constrangimento. Eu tenho pavor (risos) .

Você quer ter filhos?

Talvez ano que vem eu tenha (Ele é casado desde 2017 com a executiva do Porta dos Fundos Nataly Mega).

É a coisa mais difícil do mundo?

De ter filho? Ah, é. Educar. Porque a gente é um poço de coisas equivocadas. A gente acha que uma coisa é certa, e não é. E filho é uma esponja, a criança vai observando tudo. É tão difícil explicar as coisas que acontecem. E ao mesmo tempo não transformar seu filho em você. Seu filho tem que ser uma evolução de quem você é. Eu não queria que meu filho fosse conformado com as coisas como eu já sou. Queria que ele olhasse uma criança na rua e visse que isso não pode ficar assim. E já vejo isso nessa geração. Eu falei outro dia numa entrevista e disseram que era horrível, mas as pessoas precisam morrer! As pessoas são horríveis, a maioria. Então elas precisam morrer para surgir novas pessoas. Se formos ficar vivendo 300 anos, o mundo acaba.