Exclusivo para Assinantes

Ruth Rocha diz que reação contra a ciência hoje é ‘vergonhosa’

Aos 90 anos, preocupada com os rumos do país, a autora de clássicos da literatura infantil relança ‘Meu amigo dinossauro’, de 2006, com um final mais ecológico, e afirma que gostaria de escrever mais e melhor sobre a escravidão
A escritora Ruth Rocha: "A reação que vemos hoje contra a ciência é vergonhosa, de um atraso horroroso e me preocupa muito" Foto: Vânia Toledo / Divulgaçao

Todos os dias, às 15h30, Ruth Rocha recebe um telefonema de sua irmã, Rilda. A escritora, que comemorou virtualmente seus 90 anos no dia 2 de março, não aguenta, com a vista cansada, passar muito tempo debruçada sobre um livro. Rilda reserva uma hora do dia para ler para Ruth ao telefone. Juntas, elas atravessaram as mais de 1.500 páginas de “Guerra e paz”, de Tolstói, e também o primeiro volume de “Escravidão”, de Laurentino Gomes, e “Uma terra prometida”, as memórias presidenciais de Barack Obama (504 e 764 páginas, respectivamente).

As duas irmãs são sociólogas e, às vezes, interrompem a leitura para conversar sobre temas políticos e econômicos que aparecem no meio dos livros. Também conversam sobre a situação do Brasil, que tem deixado Ruth, um dos maiores nomes da literatura infantil do país, “muito desgostosa”. Ela anda preocupada com a “grita contra a ciência” que une setores do governo e parte da sociedade.

— Estou achando que este governo vai atrasar o Brasil uns 50 anos — diz Ruth, por telefone. — Como foi que demos essa marcha à ré?

O cantor e compositor Zeca Pagodinho é imunizado contra a Covid-19 nesta sexta-feira, dia 19 de abril Foto: Divulgação
A atriz Regina Casé foi vacinada em Mangaratiba, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro Foto: Reprodução - 29/03/2021
O cantor Neguinho da Beija-flor, 71 anos, foi vacinado contra a Covid-19 em Copacabana, na Zona Sul do Rio. Ele tomou a primeira dose do imunizante Foto: Reprodução - 29/03/2021
Ana Maria Braga, 71 anos, foi vacinada contra a Covid-19 Foto: Reprodução - 26/03/2021
O ator Luiz Fernando, 71 anos, foi vacinado em Itaguaí, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro Foto: Reprodução - 29/03/202121
Ator Antônio Fagundes, de 71 anos, recebeu primeira dose do imunizante no Rio de Janeiro: "Que o resto do Brasil também possa (se vacinar) em breve", escreveu na legenda do vídeo recebendo a vacina Foto: Reprodução - 29/03/2021
Maria Odete Brito de Miranda Marques, a Gretchen, de 61 anos, exibe orgulhosa o certificado da primeira dose da vacina em Belém, no Pará Foto: Reprodução - 28/03/2021
O ator Tony Ramos, 72 anos, foi vacinado na Zona Sul do Rio Foto: Reprodução - 27/03/2021
A filósofa, ativista e escritora Sueli Carneiro, de 70 anos, foi vacinada contra Covid-19 em São Paulo Foto: Reprodução
O cantor Djavan, 72, também foi vacinado no Rio de Janeiro Foto: Reprodução - 27/03/2021
A cantora Alcione, de 73 anos, recebeu a vacina contra Covid-19, no drive thru do Parque Olímpico, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio Foto: Reprodução
A cartunista Laerte, de 69 anos, postou foto em rede social a frente de UBS São Remo, na Vila Butantã, Zona Oeste da capital paulista para celebrar a primeira dose da vacina. Em janeiro, ela ficou 10 dias internada por conta da Covid-19 Foto: Reprodução
O cantor e compositor Milton Nascimento, de 78 anos, estava isolado esse tempo todo com o filho, Augusto, em Juiz de Fora. Após receber a primeira dose da vacina, desabafou nas redes: 'VACINADO! VIVA A CIÊNCIA, VIVA O SUS E FORA BOLSONARO!' Foto: Reprodução
O ator Reginaldo Faria, de 83 anos, já recebeu as duas doses da vacina contra o coronavírus Foto: Reprodução
A cantora, sambista e deputada estadual de São Paulo Leci Brandão, 76 anos, recebeu a primeira dose da vacina no drive-thru do Clube Atlético Monte Líbano, no Jardim Luzitania Foto: Reprodução / Instagram
Cantora Gal Costa, 75, exibe certificado de vacinação contra Covid-19 Foto: Reprodução / Instagram
O casal de atores Tarcísio Meira, 85 anos, e Glória Menezes, 86, receberam a segunda dose da vacina contra o coronavírus, em São Paulo Foto: Reprodução / Instagram
O compositor e escritor Chico Buarque, de 76 anos, tomou a primeira dose da vacina contra Covid-19, no posto montado no Planetário, na Gávea Foto: Reprodução / Instagram
O apresentador Silvio Santos, de 90 anos, foi vacinado contra a Covid-19 nesta quarta-feira (10), em um posto de vacinação da Prefeitura de São Paulo, na Zona Sul da capital Foto: Reprodução
Fernanda Montenegro recebendo vacina contra Covid-19 Foto: Carmen Mello para Ancelmo Gois
Paulinho da Viola, 78 anos, se vacinou no no drive thru do Parque Olímpico, na Zona Oeste do Rio Foto: Divulgação
Caetano Veloso, 78 anos, foi vacinado no Rio de Janeiro: "Sempre acho que vacinar-se é o certo", disse o músico Foto: Divulgação
Pelé tomou a primeira dose da vacina contra a Covid-19 nesta terça-feira (2), em Santos, aos 80 anos Foto: Reprodução / Instagram
Aos 90 anos, a Elza Soares foi a um posto em Copacabana, no Rio, com a bandeira do Brasil tomar a primeira dose da vacina Foto: Reprodução / Instagram
Aos 90 anos, a cantora foi a um posto em Copacabana, no Rio, com a bandeira do Brasil tomar a primeira dose da vacina Foto: Divulgação
Aos 90 anos, a cantora foi a um posto em Copacabana, no Rio, com a bandeira do Brasil tomar a primeira dose da vacina Foto: Reprodução / Instagram
O sambista Monarco, de 87 anos, foi um dos primeiros a participar da vacinação no Sambódromo. A Velha Guarda das escolas de samba foram os primeiros a receber o imunizante no drive-thru na Avenida Marquês de Sapucaí Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo - 13/02/2021
Com máscara do Vasco da Gama e camisa da Mangueira, o sambista Nelson Sargento, de 96 anos, foi vacinado em cerimônia organizada pela prefeitura do Rio para marcar o início da vacinação em idosos Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo
Na mesma cerimônia que em esteve Nelson Sargento, o comediante e dublador Orlando Drummond, o inesquecível Seu Peru, da "Escolhinha do professor Raimundo"de 101 anos, recebeu sua primeira dose de vacina anti-Covid Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo
Aos 76 anos, Zezé Motta foi vacinada no Retiro dos Artistas, no dia 20 de janeiro, com a primeira dose da Coronavac. Ela é vice-presidente da instituição e contou que mais de 50 residentes começaram a ser imunizados Foto: Reprodução / Instagram

Defensora do conhecimento científico, Ruth aproveitou o confinamento para se dedicar a livros que lembram as crianças de que a Terra é redonda, alertá-las dos perigos ambientais dos combustíveis fósseis e reafirmar que o homem descende do macaco.

Este mês, sai uma nova edição de “Meu amigo dinossauro”, publicado originalmente em 2006. O livro, lançado pela Leiturinha, clube de assinatura de livros infantis, traz novas ilustrações de Elisabeth Teixeira e um final diferente, no qual o dinossauro Joaquim ensina que o petróleo, quando queima, “deixa o clima amalucado”. Na versão anterior, as crianças aprendiam que os dinossauros já tinham virado petróleo e lembravam os produtos originados do óleo negro: garrafas, brinquedos, gasolina e até o zíper da fantasia de Joaquim.

— A reação que vemos hoje contra a ciência é vergonhosa, de um atraso horroroso e me preocupa muito — diz Ruth, que, antes de começar a publicar suas histórias, foi orientadora educacional.

Ilustração do livro "Meu amigo dinossauro", de Ruth Rocha Foto: Agência O Globo

Emicida:   Rapper lança livro infantil sobre medo do escuro

Em setembro de 2020, em parceria com a filha, Mariana, Ruth lançou “Almanaque do Marcelo e da turma da rua nossa” (Salamandra). O livro apresenta os personagens mais queridos da escritora, como o protagonista de “Marcelo, Marmelo, Martelo”, e seu cãozinho Godofredo (ou Latildo). E também exorta crianças a evitar o uso de objetos de plástico, ensina a reciclar papel e afirma que quem diz que a Terra é plana “é um grandíssimo banana”.

Giovanna Ewbank, nossa Jennifer Aniston Foto: Reprodução
Deborah Secco apontou sua 'sósia' Fernanda de Freitas Foto: Reprodução
O youtuber Felipe Neto apostou na semelhança com Kelly Key Foto: Reprodução
O divulgador científico Átila Iamarino apelou para o biscoito Trakinas Foto: Reprodução
Rafael Portugal apontou o xará Rafael Almeida em começo de carreira Foto: Reprodução
Seria Miá Mello mais uma das encarnações de Tatiana Maslany em 'Orphan black'? Foto: Reprodução
O músico Lucas Silveira, da Fresno, se acha parecido com o Tirullipa Foto: Reprodução
Leandro Hassum viu semelhança com versão 'adulterada' de Vin Diesel Foto: Reprodução

Por falar em banana... Ruth passou os últimos meses escrevendo “O livro dos macacos”, ainda sem data de publicação, no qual recorda as histórias contadas pelo avô e explica como as espécies evoluíram.

Revisão sem perdas

Ruth não é a única a lançar um olhar atualizado sobre suas obras. Outros autores também têm revisitado seus livros para adequá-los aos novos tempos. Em março, o americano Dav Pilkey, criador da série de histórias em quadrinhos “Capitão Cueca”, autorizou a interrupção da distribuição de “As Aventuras de Ook e Gluk”, de 2010, depois que um leitor denunciou representações estereotipadas de personagens asiáticos presentes nos livros.

Ilustração do livro "Meu amigo dinossauro", de Ruth Rocha Foto: Agência O Globo

Ruth conta que já deu livros do Capitão Cueca de presente para os netos e elogia a disposição de autores em corrigir suas obras para livrá-las de preconceitos. No entanto, quando entram na conversa os livros de Monteiro Lobato, acusados de conteúdo racista, como ela própria lembra, Ruth diz que “aí é um pouco mais complicado”. Ela é contra intervenções no texto do criador do Sítio do Picapau Amarelo, que, em “Caçadas de Pedrinho”, descreve Tia Nastácia subindo numa árvore “que nem uma macaca de carvão”. Embora considere “muito grave” que crianças negras se sintam “depreciadas” ao ler representações preconceituosas de personagens parecidos com elas, Ruth defende que trechos problemáticos sejam explicados aos pequenos leitores, e não excluídos.

— Temos que falar do mesmo jeito que a Dona Benta explicava a Pedrinho, Narizinho e Emília por que havia guerra — afirma a escritora.

"Meu pai": Now, Apple TV e Google Play; a partir de 28-4, também em Sky Play e Vivo Play Foto: Divulgação
"Os 7 de Chicago": Netflix Foto: Divulgação
'Mank': Netflix Foto: Divulgação
"A Voz Suprema do Blues": Netflix Foto: Reprodução
'O som do silêncio':Prime Video Foto: Divulgação
"Pieces of Woman": Netflix Foto: Benjamin Loeb / Netflix
'Quo vadis, Aida?': Now, Vivo Play, Sky Play, iTunes, Apple TV, Google Play e YouTube. Foto: Divulgação
"Borat: Fita de Cinema Seguinte": Prime Video Foto: Divulgação
"Relatos do Novo Mundo": Netlflix Foto: Bruce W. Talamon / Divulgação
'Os 7 de Chicago': Netflix Foto: Niko Tavernise / Netflix
O Tigre Branco: Netflix Foto: Divulgação
"Tenet": YouTube e Google Play Foto: Reprodução
'Uma noite em Miami': Prime Video Foto: Amazon Studios/Divulgação
‘Era uma vez um sonho’: Netflix Foto: Divulgação
'Professor Polvo': Neflix Foto: Reprodução
'Dois irmãos - Uma jornada fantástica': Disney + Foto: Divulgação
"Soul": Disney + Foto: Divulgação
'Shaun, o carneiro': dos mesmos criadores de 'A fuga das galinhas', está na Netflix Foto: Divulgação
'A caminho da lua': animação sobre garota que constrói foguete pode ser vista na Netflix Foto: Divulgação
'Wolfwalkers': indicado ao Oscar 2021, animação diretor irlandês Tomm Moore pode ser vista na Apple TV + Foto: Divulgação

Ruth acredita que mesmo livros marcados pelo racismo podem render lições antirracistas.

— Em “Huckleberry Finn” (de Mark Twain) , que também já foi considerado racista, o protagonista passa uma porção de tempo viajando com um escravo fugido. Quando chegam à cidade, pensa em denunciá-lo porque tinha ouvido na igreja que era pecado ajudar escravos fugitivos, mas termina dizendo que preferiria ir para o inferno a trair seu amigo. É por cenas como essa que a literatura importa.

Capa da nova edição de "Meu amigo dinossauro", da escritora Ruth Rocha, ilustrado por Elisabeth Teixeira Foto: Divulgação

Ruth narrou a amizade entre um homem negro escravizado e um sinhozinho branco em “O amigo do rei”, de 2009. E confessa que gostaria de escrever mais sobre o tema.

— Gostaria de contar às crianças como a escravidão marcou a formação do Brasil e ensiná-las a não serem preconceituosas — afirma. — Tenho alguns heróis negros, como o Matias, de “O amigo do rei”, e o Catapimba. Mas gostaria de escrever mais e melhor sobre o assunto.

A literatura de Ruth sempre pregou valores progressistas —ela até adaptou a “Declaração Universal dos Direitos Humanos” para os pequenos, em parceria com o artista plástico Otávio Roth. Um dos maiores sucessos da escritora é “O reizinho mandão”. Publicado em 1973, durante a ditadura, o livro rendeu leituras políticas até dos adultos e ajudou pelo menos uma criança a não crescer autoritária.

— Uma menina de uns 7, 8 anos me disse que era muito mandona, mas que, depois de ler o livro, tinha mudado e não era mais — lembra Ruth, incapaz de segurar o riso.