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Por — Rio de Janeiro

Um novo filme da Netflix defende que comportamentos extremistas como o 6 de Janeiro de 2021 nos EUA e o 8 de Janeiro de 2023 no Brasil são consequência da luta por liberdade na internet dos anos 2000. A bagunça teria começado no fórum 4Chan e crescido dentro do coletivo Anonymous. Em ambos, os participantes podiam esconder suas identidades verdadeiras, eram incentivados a se expressar sobre todos os assuntos e encontravam bolhas on-line de apoio para qualquer ideia, inclusive terraplanismo e teorias da conspiração.

Enfim, o documentário “A rede antissocial — Dos memes ao caos” diz que tudo o que a gente vive hoje surgiu com brincadeiras de adolescentes no início do milênio. E é incrível como ele soa tão real.

O filme é uma produção americana, dirigida por Arthur Jones e Giorgio Angelini. Ele estreou em março deste ano, no festival South by Southwest, nos EUA. Chegou à Netflix menos de um mês depois, sem muita divulgação, mas com jeitão de manifesto. Num ano de eleição tensa como promete ser a dos EUA para presidente, ele trata de temas delicados e não esconde o tom crítico. O pacote está todo lá: de ataques antidemocráticos a fake news, de manipulações nas redes sociais ao delírio conspiratório do QAnon.

Para contar sua história, o roteiro de “A rede antissocial” costura depoimentos de antigos usuários que estavam na fundação do 4Chan e na criação do Anonymous.

Um desses entrevistados é Jeremy Hammond, hacker americano que foi preso em 2012 e acabou condenado a dez anos depois de roubar e expor milhões de dados privados em nome de denunciar a corrupção de empresas e governos. Outro é Aubrey Cottle, ativista e hacker conhecido pelo apelido “Kirtaner” e que foi um dos participantes dos ataques organizados contra a Cientologia em 2008. Na ocasião, milhares de jovens foram para frente dos templos da igreja em todo o mundo usando as máscaras de Guy Fawkes, um símbolo de ativismo criado na graphic novel “V de Vendetta”, dos anos 1980, e popularizado em sua versão para o cinema de 2006. Foi nessa luta contra a Cientologia que as ações do coletivo anárquico digital Anonymous passaram a ser conhecidas fora da internet e foram cobertas pela mídia tradicional.

Mas o fio de “A rede antissocial” começa a ser puxado anos antes da existência do Anonymous, ainda pelo 4Chan, um fórum de troca de textos e imagens lançado por um adolescente americano em 2003. Por trás da iniciativa, estava o desejo de que nenhum adulto poderia impedir seus jovens integrantes de serem livres.

Ingenuidade

Parte da turma, no entanto, entendeu que ser livre representava fazer o que se bem entendesse. Era quase um vale-tudo digital. Foi lá, por exemplo, que se espalhou o termo trollagem como referência a pegadinhas on-line em massa. Veio de lá o meme do Rickrolling: uma brincadeira juvenil que prometia revelações incríveis em links para os internautas clicarem, mas que simplesmente levavam para um vídeo de YouTube do Rick Astley cantando “Never gonna give you up”. Olhando depois de tantos anos, aquilo não parecia ter graça alguma, mas a turma que viveu aquela sensação ingênua de liberdade on-line morria de rir.

Para quem é muito jovem, é importante situar que era um tempo na internet sem TikTok ou Instagram, ainda muitíssimo distante de o Twitter ser transformado em X e em quintal da casa do Elon Musk. Já para quem tem mais de 40 e achava que defendia a liberdade, como eu, é o nosso tempo.

No entanto, o documentário mostra que houve um momento em que as intenções se dividiram: alguns seguiram num ativismo digital com pautas progressistas e de anticorrupção, querendo enfrentar instituições e governos; enquanto outros só queriam trollar sem restrições — o que no Brasil é chamado de “sem mimimi”. Um caso famoso aconteceu no fim dos anos 2000, quando um grupo fez o gesto de saudação nazista usando a máscara de Guy Fawkes numa conferência de Anime.

“As pessoas estavam mais confortáveis para fazer e falar coisas que faziam antes. Coisas racistas e muito ofensivas. Como se sentiam confortáveis no grupinho, acharam que não teria consequência”, analisa no filme o jornalista americano Dale Beran, autor do livro “It came from something awful: how a toxic troll army accidentally memed Donald Trump into Office” (“Veio de algo horrível: como um exército tóxico de trolls acidentalmente transformou Donald Trump em meme até a Presidência”, em tradução livre).

Milícia on-line

Beran acrescenta que estrategistas políticos perceberam o que se passava na internet e usaram isso em nome de interesses que pouco tinham a ver com o que aquela turma defendia inicialmente. Por um lado, foi a mobilização do Anonymous que fez com que o movimento Occupy Wall Street ganhasse o vulto que ganhou e inspirasse outras ações semelhantes no mundo, entre elas as jornadas de 2013 no Brasil. Por outro, um cara como Steve Bannon, estrategista de Trump e ideólogo de muitos políticos da extrema-direita, buscou atrair aquela massa digital para sua milícia on-line, chamada certa vez por ele de “homens brancos sem raízes do 4chan”.

Manifestantes tomam as ruas de Washington, em 2011, mostrando apoio ao movimento Occupy Wall Street: mobilização nascida nas redes inspirou ações semelhantes pelo mundo — Foto: Karen BLEIER/afp/7-12-2011
Manifestantes tomam as ruas de Washington, em 2011, mostrando apoio ao movimento Occupy Wall Street: mobilização nascida nas redes inspirou ações semelhantes pelo mundo — Foto: Karen BLEIER/afp/7-12-2011

A proposta juvenil de liberdade do início dos anos 2000 se transformou então em manifestações de preconceito, ódio e mentiras. O movimento conspiratório QAnon, que defende barbaridades como a existência de uma seita satânica de abusadores de criança que atua junto à esquerda contra Donald Trump, surgiu no 4Chan e logo migrou para o 8Chan, outro fórum criado por jovens.

E é aí que “A rede antissocial” completa seu manifesto: o filme conclui que os ataques ao Capitólio nos EUA de 6 de janeiro de 2021, quando partidários de Donald Trump invadiram o Congresso americano por não aceitarem o resultado da urnas, foi fruto de duas décadas de luta por liberdade digital.

A explicação é um tanto reducionista e deixa de lado muitos outros acontecimentos paralelos ao longo do tempo. Mas, quando a gente assiste a Elon Musk falar de liberdade de expressão e democracia numa plataforma em que é permitido pagar para uma voz ter mais alcance do que outra, percebe-se que “A rede antissocial” coloca o dedo numa ferida ainda bem exposta e sem horizonte para cicatrizar.

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