Pioneira na televisão brasileira, a jornalista e apresentadora Glória Maria, morta na manhã desta quinta-feira, pode ser resumida em uma palavra: referência. Em praticamente todas as homenagens feitas a ela, principalmente por jornalistas e artistas mulheres e negras, essa palavra apareceu. Uma breve análise da trajetória dela dentro e fora da TV pode comprovar que Glória Maria é uma referência para profissionais negros e, principalmente, para as mulheres.
Considerada a primeira repórter negra de TV no país, Glória também foi a primeira brasileira a usar a Lei Afonso Arinos contra o racismo. Em 1977, foi a primeira repórter a entrar ao vivo no Jornal Nacional. Em 1998, se tornou a primeira mulher negra a apresentar o Fantástico.
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Para Flávia Oliveira e Aline Midlej, ambas da GloboNews, Glória está no centro da história do Brasil e das mulheres negras como um todo, e não "somente" de suas trajetórias pessoais.
"Toda jovem, toda menina, toda mulher negra brasileira que um dia, a partir dos anos 1970 do século XX, imaginou ser jornalista, teve Glória Maria como referência. É um dia de luto e, ao mesmo tempo, de gratidão. Por esta mulher que teve como nome a glória e como principal característica a coragem. Glória Maria foi corajosa ao ousar ser um corpo negro feminino no jornalismo de televisão. Não é trivial. Não é trivial ser uma mulher negra no Brasil. Mulheres negras no Brasil estão na base dos indicadores socioeconômicos. [...] Glória foi a mulher que ousou tirar os nossos corpos da fatalidade da precarização e exibir em cadeia nacional contando as histórias do Brasil", afirmou Flávia.
Relembre momentos de Glória Maria
"A televisão não seria a mesma se Glória não tivesse existido. E a televisão se tornou algo muito melhor, mais verdadeiro, emocionante e marcante com ela. A existência dela na tela já era uma revolução, mas ela foi tão além, revolucionando linguagem, estilo e presença. Alcançou uma autenticidade que foi se renovando ao longo das décadas. E isso vale também pela forma como lidava com o racismo", destaca Aline.
Maju Coutinho, que hoje ocupa o lugar que foi de Glória Maria entre 1998 e 2007 na apresentação do Fantástico, publicou uma homenagem para a companheira de profissão em seu perfil no Twitter.
"A presença negra, intensa e assertiva de Glória na maior emissora do país sinalizava para mim que era possível, era preciso, era também meu direito e de outros parecidos comigo ocupar lugares de destaque. Celebro aqui a existência dessa mulher que me ajudou a existir e a resistir", escreveu Maju.
Artistas como Ludmilla, Mano Brown, Liniker e Luedji Luna também homenagearam a jornalista. "Glória, você abriu caminhos e inspirou muitas meninas como eu. Descanse em paz!", publicou a funkeira Ludmilla. "Uma das maiores personalidades negras desse país, descanse em paz Glória Maria. Foi uma honra te receber no 'Mano a Mano', trocamos um 'papo mil grau'. Com certeza ficará para a eternidade", escreveu o rapper Mano Brown.
Glória também foi muito homenageada ainda em vida. Em 2021, quando participou do programa Papo de Segunda, no GNT, ficou emocionada com uma fala do rapper Emicida sobre ela.
No ar, Emicida disse que, antes mesmo de adquirir um "letramento racial", ver a jornalista todo domingo no Fantástico o incentivava a não desistir. "Quando eu via a Glória Maria todo domingo na televisão, eu tinha nela uma espécie de referência de possibilidade. Eu não podia desistir porque a Glória Maria era a pessoa que me dizia que era possível vencer nesse lugar", afirmou. "Obrigado por você existir, Glória Maria. Se hoje tem um Emicida, é porque antes existiu uma Glória Maria."
O rapper também desejou que Glória Maria chegasse aos "duzentos e pouco" para que novas gerações pudessem continuar a vê-la na TV.