Economia

Congresso aprova lei que define diretrizes do Orçamento e afasta risco de apagão nas despesas em 2021

Projeto prevê salário mínimo de R$ 1.088 e segue para sanção do presidente Jair Bolsonaro
Sessão da Câmara dos Deputados Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Sessão da Câmara dos Deputados Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

BRASÍLIA — O Congresso aprovou nesta quarta-feira o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o ano que vem, essencial para que a máquina pública continue a funcionar a partir de 1º de janeiro de 2021. Na Câmara, o texto foi aprovado por 444 votos favoráveis e apenas 10 contrários. No Senado, a apreciação foi simbólica, por acordo, portanto sem contagem de votos nominais. A matéria vai à sanção presidencial.

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O projeto enviado pelo Executivo anualmente é responsável por estabelecer as metas e prioridades para o ano seguinte e precisa ser chancelado pelo Congresso.

Os deputados aprovaram o texto e recusaram as sugestões de mudanças na proposta. Após a votação na Câmara, os senadores também apreciaram o relatório de maneira célere, em menos de 10 minutos. Apenas com a votação do texto é possível iniciar o recesso parlamentar.

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Além das metas do governo, a LDO também estabelece as regras e os limites para as despesas da União.

A LDO foi apresentada às pressas, sob críticas de parte dos parlamentares e mais de duas mil emendas foram apresentadas à medida.

A versão final da proposta só foi apresentada pelo relator, senador Irajá (PSD-TO), na terça-feira. O projeto confirmou a sugestão do governo de prever meta de déficit primário de R$ 247,1 bilhões e salário mínimo de R$ 1.088 no ano que vem.

Os deputados se queixaram da Comissão Mista de Orçamento (CMO), colegiado responsável pela análise inicial do texto, não ter sido instalada neste ano. A CMO foi alvo de uma queda de braço que teve como pano de fundo a antecipação da disputa entre os grupos do líder do centrão Arthur Lira (PP-AL) e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pela presidência da Câmara.

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Outro questionamento foi a decisão do presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP), de não pautar os vetos presidenciais na sessão do Congresso.

Normalmente, o Congresso aprova dois projetos para balizar os gastos do governo no ano seguinte: a LDO, com as regras gerais das finanças públicas, costuma ser sancionada ainda em agosto. A Lei Orçamentária, com a descrição das fontes de receitas e destino das despesas, é apreciada até dezembro.

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Neste ano, esse processo atrasou principalmente por causa da pandemia e da turbulência política causada pela disputa pela presidência da Câmara dos Deputados. A Lei Orçamentária só será votada em fevereiro.

Sem o Orçamento, há a previsão de que a máquina pública seja custeada por meio de liberações mensais, baseadas na proposta de despesas definida pelo governo. Mas, para que esse mecanismo provisório entre em ação, era necessária a aprovação ao menos da LDO.

Se isso não ocorresse, o governo não poderia liberar gastos essenciais, como salários de servidores, pagamento de benefícios e compras de equipamentos.

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Meta flexível

A primeira versão do projeto foi apresentada pelo governo em abril, com previsão de uma meta fiscal flexível , por causa das incertezas em relação à projeção para as receitas em 2021. O Tribunal de Contas da União (TCU) alertou que essa manobra poderia desrespeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Diante do alerta e da melhora no cenário para preparar estimativas, a equipe econômica voltou atrás da decisão. Inicialmente, projetou meta de R$ 232,1 bilhões na semana passada. Dias depois, elevou essa previsão para R$ 247,1 bilhões por causa de mudanças nas projeções dos parâmetros econômicos.

A definição de um limite para o resultado das contas públicas é importante porque baliza a liberação de recursos ao longo do ano. A cada dois meses, o governo avalia se a meta corre risco de ser descumprida e, se necessário, faz um contingenciamento no Orçamento — ou seja, bloqueia temporariamente recursos dos ministérios.

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Essa regra foi suspensa neste ano por causa do decreto de estado de calamidade pública, editado para permitir a autorização de gastos emergenciais para combater a pandemia de Covid-19. A medida se encerra em 31 de dezembro, mas já há pressões para prorrogar esse prazo.

Mais poder ao Congresso

O texto da LDO aprovado pelo Congresso dá mais poder aos parlamentares em relação a emendas, retirando as barreiras à execução de obras. Foi autorizado às bancadas estaduais a apresentarem emendas ao orçamento para repasses diretos a prefeitos e governadores.  Atualmente, isso só é possível nas indicações individuais dos parlamentares.

Chamada de emenda sem carimbo, o recurso pode ser aplicado livremente por estados e municípios, desde que  70% do montante sejam destinados a investimentos.

Segundo especialistas, a não necessidade de convênio e não definição de utilização do recurso pode, inclusive, levar à fragmentação desses recursos para diversos municípios.

Comissão não foi instalada

A influência da disputa pela presidência da Câmara na instalação da Comissão Mista de Orçamento (CMO) é alvo de queixas, especialmente da oposição.

Entre setembro e outubro, a indicação para o comando do colegiado se tornou em uma espécie de prévia da disputa pelo comando da Câmara, com um embate entre aliados do atual presidente da Casa, Rodrigo Maia, e o deputado Arthur Lira, que já vinha se aproximando do Planalto e se tornaria o candidato do Executivo.

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— Quero registrar, como coordenador da bancada do PT na CMO, com parlamentares da Câmara e do Senado, que marcamos presença em todas as reuniões convocadas para a instalação da CMO. A disputa política em torno da presidência passou para nós ao largo. Não se justifica a CMO não ter sido instalada — afirmou Afonso Florence (PT-BA) durante a sessão de hoje.

O deputado Marcelo Ramos (PL-AM) também se queixou da inconstitucionalidade de levar a LDO diretamente ao plenário do Congresso e pediu o compromisso de Alcolumbre para que ela seja instalada já em janeiro para votação da Lei Orçamentária.

A Constituição prevê que a LDO seja votada na CMO antes de ir a plenário, como ocorre nesta quarta-feira.

— O mais grave não é que o Congresso Nacional excepcione a regra constitucional para trazer a matéria direto ao Plenário. O mais grave é que isso seja feito sem o compromisso de instalar a CMO. Nós vamos votar a LDO hoje sem nenhum compromisso de que nós teremos CMO para analisar a Lei Orçamentária a partir de fevereiro do ano que vem — disse o deútado antes da votação.

E cobrou:

— Eu acho que o mínimo que deveria ser construído como um acordo político aqui nesta Casa é que fique estabelecido como condição para a votação da LDO neste momento o compromisso de instalar a CMO antes do recesso parlamentar.

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Votação de vetos atrasados

Outro ponto criticado por parte de parlamentares é a decisão de iniciar a sessão do Congresso pela análise da LDO, e não dos vetos.

A medida contraria o regimento interno do Congresso e a Constituição, que prevê que vetos que não forem analisados em 30 dias tranquem a pauta. Isso significa que parlamentares não poderiam analisar nenhuma outra medida, antes de votar vetos atrasados.

Hoje, 22 vetos estão trancando a pauta, inclusive alguns que tratam de medidas polêmicas, como o veto ao marco legal do saneamento.

Essa medida é acompanhada de perto pelo governo. Se a decisão presidencial for revertida, concessionárias estaduais renovarem sem licitação por até 30 anos contratos de programas com os municípios — manobra que vai na direção contrária do projeto de lei aprovado e defendido pelo governo para ampliar a concorrência no setor.

Sem a certeza de que tem votos suficientes para manter o veto, o governo adotou a estratégia de avançar apenas com a votação da LDO, sem avançar com a discussão sobre os vetos.