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Economia

Governo do Rio quer concentrar voos domésticos no Galeão e deixar Santos Dumont com ponte aérea

Ideia é ampliar conectividade do aeroporto da Ilha do Governador para fortalecê-lo como ‘hub’ internacional e torná-lo competitivo com Guarulhos, Brasília e Fortaleza
Movimento no aeroporto internacional Galeão Tom Jobim Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo
Movimento no aeroporto internacional Galeão Tom Jobim Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo

RIO — O governo do Estado do Rio quer concentrar no Galeão os voos domésticos e manter no Santos Dumont a ponte aérea, com ligações para São Paulo e Brasília. A ideia é ampliar a conectividade do aeroporto da Ilha do Governador e, assim, fortalecê-lo como hub internacional. Quanto mais cidades o terminal atender, mais atraente ele se torna para as companhias que operam voos com destino ou origem no exterior.

Dessa forma, quando as fronteiras se reabrirem para o Brasil no pós-pandemia, o Galeão estaria mais forte para disputar voos com Guarulhos e até Brasília e Fortaleza, que despontaram mais recentemente como porta de entrada a turistas estrangeiros.

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Para analistas, o atual momento é propício para uma articulação com as empresas aéreas, com o objetivo de criar ou retomar voos a partir do Galeão para destinos como o Nordeste, pois as viagens a lazer devem se recuperar mais rapidamente que as de negócios, que costumam usar o Santos Dumont como ponto de apoio. Eles ressaltam, porém, que a decisão depende da estratégia comercial de cada companhia.

Alertam ainda que uma eventual transferência de voos do Santos Dumont para o Galeão vai reduzir a atratividade do aeroporto do Centro do Rio em sua licitação, prevista para 2022.

Movimento no aeroporto Santos Dumont Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo
Movimento no aeroporto Santos Dumont Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo

Incentivo no ICMS

O governo fluminense não tem ingerência sobre os aeroportos — o Galeão é concessão federal administrada por uma empresa privada, e o Santos Dumont, gerido pela Infraero, estatal federal — mas pode dar incentivos para atrair empresas.

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Foi o que fez com a sanção da lei que reduz à metade o ICMS sobre o querosene de aviação, no mês passado. Ela vale apenas para hubs internacionais e terminais do interior, não para o Santos Dumont.

— A gente espera, com a sanção e a regulamentação da lei pela Secretaria de Fazenda, conseguir iniciar esse projeto de recuperar o Galeão — diz o secretário estadual de Turismo, Gustavo Tutuca, acrescentando que o combustível representa de 35% a 40% do custo das companhias aéreas.

O aeroporto está com grande ociosidade. Em abril, passaram pelo Galeão 102 mil passageiros. No mesmo mês em 2019, antes da pandemia, foram 947.246, segundo a concessionária RIOgaleão.

Para dezembro, a expectativa é de 600 mil. Esse processo de retomada deve ganhar um empurrãozinho com a lei do ICMS.

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Há expectativa de um incremento de 22% dos voos já neste mês, com a chegada da novata ITA e a ampliação de voos da Gol. Em julho, a Latam também vai ampliar a malha, com mais 26 voos semanais para Recife, Natal e Maceió. A Azul não planeja novas conexões.

A Gol é a empresa com maior presença no aeroporto. Hoje, são 23 voos diários. Em julho, serão 31.

— O Galeão é estratégico para a Gol. É onde temos a melhor oferta de voos entre as companhias aéreas, com conexões com parceiros internacionais, malha própria internacional. A redução de ICMS ajuda. A gente ganha competitividade, mais possibilidades de adicionar oferta — diz Eduardo Bernardes, vice-presidente comercial da Gol.

Percy Rodrigues, consultor e ex-presidente da Rio Sul Linhas Aéreas, lembra que o plano de fortalecer o Galeão é uma ambição antiga do governo do estado, mas que esbarra na política comercial das empresas. Alessandro Oliveira, economista na área de transporte aéreo e professor do ITA, frisa que, no atual arcabouço regulatório, não cabe a qualquer governo definir a malha aérea.

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Mas ressalta que concentrar voos em um aeroporto neste momento faz sentido para reduzir custos:

— O cenário, agora, é de redução de viagens a negócios. E o internacional não volta tão cedo. Se as viagens domésticas a lazer voltarem mais cedo que as demais, pode fazer sentido não dar tanta atenção para a ponte aérea agora. É pouco provável que as empresas coloquem ênfase em dois aeroportos neste momento. Então, pode ser um grande momento de lobby pelo Galeão. Mas isso é decisão das empresas.

Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão Foto: Luiza Moraes / Agência O Globo
Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão Foto: Luiza Moraes / Agência O Globo

Impacto na privatização

Apesar de menor, o Santos Dumont tem capilaridade quase igual à do Galeão. São 18 cidades atendidas contra 23 no terminal da Ilha do Governador. Embora as viagens de negócios tenham bom peso na malha — 40% dos voos têm como destino São Paulo e Brasília, segundo a Infraero — essa conectividade também é aproveitada para o turismo.

Por isso, um eventual crescimento de voos no Galeão com essa finalidade pode impactar a privatização do aeroporto, na avaliação de Oliveira:

— Já há o cenário de que viagens a negócio vão cair. Uma política de incentivo (para fomentar voos no Galeão) pode reduzir a atratividade do Santos Dumont em termos de valor, embora não chegue a comprometer a privatização.

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Para o governo do estado, é a privatização do Santos Dumont que pode ameaçar o desempenho do Galeão.

— Queremos acompanhar de perto para que haja uma concessão saudável e não atrapalhe o Galeão como hub internacional. É importante saber vocacionar cada aeroporto — disse Tutuca.

Em abril, o prefeito Eduardo Paes chegou a ameaçar ir à Justiça contra o modelo de privatização do Santos Dumont, por avaliar que ele pode prejudicar o Galeão. O leilão ainda está em formatação, mas o governo já deixou claro que pretende liberar voos mais longos para o futuro concessionário.

O Ministério da Infraestrutura, responsável pela concessão, disse que a expectativa é que o edital seja lançado no segundo trimestre de 2022. (Colaborou Glauce Cavalcanti)