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Economia

No Natal, brasileiro aposta em itens mais baratos para ter ceia farta e presentes

Com auxílio, Confederação Nacional do Comércio prevê aumento de 2,2% em vendas neste fim de ano em comparação ao ano passado
O chef Christophe Lidy criou cestas para o Natal, no Supermercado Zona Sul Foto: Ana Branco / Agência O Globo
O chef Christophe Lidy criou cestas para o Natal, no Supermercado Zona Sul Foto: Ana Branco / Agência O Globo

RIO E SÃO PAULO - Após o ano difícil de pandemia, as famílias buscam um alento no Natal. Ter uma ceia farta e presentes sob a árvore serão desafios principalmente para as classes C e D, em meio ao auxílio emergencial reduzido à metade, desemprego recorde e dólar alto, que fez saltar o preço dos alimentos. Ainda assim, o varejo e especialistas apostam no aumento do consumo. Será o Natal das aves, dos vinhos e espumantes nacionais, da diversidade de pratos, mas em porções menores.

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Há dois pontos para a aposta de crescimento. Um é que mesmo os mais pobres vão privilegiar os gastos no Natal pela indulgência que a data permite após meses de limitações. Em paralelo, com a renda preservada, os mais ricos terão festa mais farta. O outro eixo é que, com restrições de circulação, o número de reuniões em família pode crescer.

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— Será uma ceia diferente porque as famílias vão usar o alimento para compensar o ano difícil. Vão reduzir quantidades para não abrir mão do que desejam. Com o dólar alto, produtos nacionais e de mercados mais próximos ganham protagonismo. Vai ter menos vinho da Europa e mais do Brasil e da América do Sul. O consumidor faz essa troca — diz Fábio Queiroz, presidente da Asserj, que reúne o setor supermercadista fluminense.

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As vendas do segmento no Rio neste Natal, afirma ele, devem subir 5% este ano.

A rede carioca Zona Sul estima vender 10% mais. Contando novas lojas abertas em 2020, o avanço pode chegar a 20%. O grupo montou uma gama de ceias e pratos prontos assinados pela dupla de chefs Christophe Lidy e Dominique Guerin. Há opções P, M e G.

O Zona Sul percebeu que o morador das áreas onde atua — a clientela está nas classes AB — pretende cear em casa e quer comer bem, mas com praticidade, diz Carlos Blajberg, lembrando que muitas famílias nesse grupo dispensaram ou estão por ora sem empregada doméstica.

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Com isso, o número de pratos prontos subiu de seis para 20, com o tradicional bacalhau entre eles. As sobremesas vão do pudim de leite à Casa de Gingerbread, bolo de gengibre em formato de casa decorado com guloseimas.

O aumento de preço de aves e suínos é inevitável. Mas a rede reduziu margens para atenuar o reajuste de importados.

Prazer ao cozinhar e beber

É estratégia similar à do Prezunic, que também abriu mão de margem para frear preços:

— Esperamos aumento de 10% em vendas. Teremos produtos para todos os públicos, prevemos alta no consumo com mais reuniões em família — diz Patricia Rotelli, gerente comercial do grupo.

Economistas não apostam num Natal que alavanque a retomada do país. Ainda assim, acreditam que o brasileiro, mesmo com menor poder aquisitivo, vai às compras. O Brasil chegou à taxa recorde de 14,4% de desemprego, com 13,8 milhões em busca de uma vaga no trimestre encerrado em agosto, segundo o IBGE.

— As pessoas que não estão ocupadas começam a voltar a procurar emprego, e isso fará a taxa de desemprego chegar a 17% até o fim do ano — diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.

Há ainda o auxílio emergencial reduzido à metade, para R$ 300, além da antecipação do 13º para os aposentados no segundo trimestre, o que reduz o orçamento disponível para as festas. Soma-se à queda da renda o impacto da alta do dólar. A inflação do grupo de alimentos e bebidas subiu 11,7% em 12 meses.

Mesmo assim, a Confederação Nacional do Comércio (CNC) revisou para cima sua estimativa para o Natal. Prevê aumento de 2,2% em vendas sobre 2019, contra previsão anterior de queda de 3%.

— A redução de recursos destinados ao varejo, com a alta do dólar, deverá ser de R$ 1,8 bilhão. O brasileiro vai ter de fazer escolhas e ajustar a quantidade de produtos ao orçamento — diz Fabio Bentes, economista da CNC.

Os meses de pandemia trouxeram mudanças ao comportamento do consumidor usadas para desenhar tendências para o fim do ano, explica Rafael Kröger Couto, gerente sênior de estratégia de consumo e varejo da Kantar:

— No início da pandemia, as pessoas queriam conveniência. Depois, passaram a buscar prazer ao cozinhar e beber em casa. Cresce a venda de produtos para preparar refeições, surgiram embalagens menores, pratos prontos de proposta mais saudável.

Auxílio foi para alimento

Essas tendências explicam por que o vinho importado dará lugar ao nacional, num movimento para manter a bebida à mesa. Na Região Metropolitana de São Paulo, cresceram em 21% as ocasiões de consumo de vinhos e champagne no lar no segundo trimestre, ante igual período de 2019. O vinho, sozinho, avançou 18,7%.

Estudo da Kantar mostrou que a compra de alimentos e bebidas foi o principal uso do auxílio emergencial.

— Quanto menor o benefício, mais ele é convertido para o consumo imediato. Será o ano dos produtos nacionais e das aves, porque carne bovina e suínos tiveram aumento maior — reforça Sidney Manzaro, vice-presidente de Mercado Brasil da BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão.

A empresa, que costuma ter 15 produtos lançados no Natal, este ano terá quase o dobro, da linha básica à premium, como peru Sadia e chester Perdigão, além de opções em aves e sobremesas.

Ele aponta o Círio Nazaré de 2020, festa religiosa paraense, como prévia do Natal:

— Ampliamos vendas em 15% no Círio deste ano. As restrições de viagens e aglomerações externas levam as pessoas a celebrar em casa. A tendência é de reuniões menores, mas de haver mais ceias.

A Seara lança o bacalhau vegetal da linha Incrível, além do peru defumado gourmet e de cortes suínos da raça duroc, carne mais macia e suculenta.