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Economia Reforma tributária

Reforma tributária: saiba o que será discutido no Congresso

Para especialistas, simplificação de impostos deve vir acompanhada de medidas para garantir melhor uso da arrecadação e retorno para a sociedade
A carga tributária no Brasil supera 30% do PIB Foto: Ilustração O Globo
A carga tributária no Brasil supera 30% do PIB Foto: Ilustração O Globo

RIO - Não há caminho fácil para simplificar o emaranhado tributário do país, que cruza impostos federais, estaduais e municipais, em uma carga que abocanha 33,26% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, segundo dado da Receita Federal. A despeito das discussões feitas há anos para reformar o sistema abarcando diversos impostos, o governo está propondo começar pela tributação federal, criando a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), ao unir PIS/Pasep e Cofins.

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Com isso, foge ao conflito com estados e municípios, mas cai em novos entraves: agrada a indústria e encontra resistência no setor de serviços. Os avanços terão de ser negociados, dizem especialistas.

— Ao invés de mirar a Lua, o governo parece estar decidindo dar um passo de cada vez. A carga tributária é altíssima, vinda de um sistema complexo que dá margem à incerteza. Juntar PIS/Cofins não será a solução para as mazelas do país, mas toda simplificação é bem-vinda. A questão está no tipo de reforma que virá — pondera Hermano Barbosa, sócio tributarista do BMA Advogados.

E acrescenta:

— Como reunir tributos e preservar a capacidade econômica dos prestadores de serviços? Como reduzir impostos sem recursos orçamentários e sem garantir administração eficiente do dinheiro público? São debates casados.

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Na ponta, o consumidor entende o peso da tributação quando ela chega no bolso, no consumo de produtos e serviços, avalia Fábio Bentes, economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

— O modelo de tributação atual agrava a precariedade da distribuição de renda no país, porque metade da carga tributária está concentrada no consumo. As pessoas percebem isso com clareza quando vão ao supermercado ou encher o tanque do carro. É um problema que também colabora para tornar o ambiente de negócios do país pior, afastando o investimento.

Entenda o efeito dos impostos

33,26%

  • É o tamanho da dentada tributária no PIB do país, informa a Receita Federal com base em dados de 2018. No cenário internacional, segundo ranking da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a taxa do Brasil é de 32,3%, abaixo da média para os países do grupo, que é de 34,2%.
  • O Brasil vem em 24º num ranking de 33 países. “O problema é que no retorno dessa arrecadação em serviços à população, estamos na lanterna”, diz Bentes.

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67,5%

  • É a participação da União no total da arrecadação. Os outros entes da federação têm mordidas menores, com 25,9% para os estados e 6,26% para os municípios. Mexer em tributações federais, explica Barbosa, pode surtir efeito na cadeia como um todo, como ao reduzir o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
  • “Simplificação pode trazer transparência à tributação, o que permite que as pessoas percebam com que objetivos pagam cada imposto e o efeito deles”, diz o advogado.

12%

  • Será a alíquota da CBS, que reunirá PIS e Cofins. Nesse fronte, a ideia faz sentido para a indústria, porque o setor já recolhe esses dois tributos em regime cumulativo, descontando créditos gerados a cada etapa da produção. No caso dos serviços, o calo aperta.
  • “Na prática, em serviços, incide 3,65%, então seria um aumento de tributação, porque eles já pagam os dois tributos juntos sobre um percentual do faturamento, lembrando que eles não contam com créditos gerados na compra de insumos”, pondera Bentes.

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14,88%

  • É a carga tributária vinda do consumo. Dentre as fontes de arrecadação para chegar a um terço do PIB, 1,54% vêm de tributação sobre propriedade; 7,19% sobre renda; 9,11% sobre a folha de salários e 14,88% de bens e serviços, ou quase metade do total.
  • “É escancarado o desequilíbrio. Taxação sobre propriedade afeta as classes AB apenas; sobre folha, vem trazendo em ‘pejotização’ e informalidade no mercado de trabalho, já em renda deixa grande parte da população de fora. O efeito vem no consumo”, diz o economista da CNC.

124ª

  • É a colocação do Brasil no ranking Doing Business, elaborado anualmente pelo Banco Mundial, que avalia o ambiente de negócios em 190 países. Em 2019, o país perdeu 15 posições. O imbróglio tributário pesa nesse mau desempenho.
  • No Brasil, as empresas gastam 1.501 horas por ano com burocracia para pagar impostos, enquanto a média nos países da OCDE é de 158,8 horas. É a pior posição do ranking global.
  • “A reforma administrativa é fundamental. Se reduzirmos tributos e o gasto público for crescente terá de haver uma compensação. Ou seja, tem de haver revisão orçamentária, gestão eficiente da arrecadação”, afirma Barbosa.