Economia

‘A Constituição brasileira é igual ao Universo, está em constante expansão’, diz Pérsio Arida

Para um dos idealizadores do Plano Real, políticas econômicas deveriam ser retiradas da Constituição para agilizar mudanças
O economista Pérsio Arida Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
O economista Pérsio Arida Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

RIO — Um dos idealizadores do Plano Real, o economista Pérsio Arida acredita que, entre as diversas reformas que são necessárias no país, é preciso atualizar também a Constituição. Para ele, as políticas econômicas deveriam ser implementadas através de leis complementares, e não de emendas constitucionais, o que agilizaria as mudanças.

O economista ressaltou a importância de desconstitucionalizar, e destacou que, para que haja reformas, é preciso haver um presidente da República que queira, de fato, reformar.

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— A Constituição é que nem o Universo, está em constante expansão. Chegamos ao absurdo de ter que aprovar na Constituição um auxílio emergencial para os mais pobres na pandemia — disse Arida, durante um webinar realizado pelo Meio e o portal Jota.

Segundo ele, isso ocorre porque, apesar de a Constituição ter nascido como parte de um pacto social em defesa dos direitos fundamentais e da democracia, houve também diversos lobbies na ocasião que mantiveram o que Árida caracteriza como “privilégios” e efeitos anacrônicos no texto.

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O economista citou como exemplo o BNDES, que conseguiu atrelar impostos ao seu financiamento, e as estatais, que cristalizaram o monopólio que teriam sobre telecomunicações e petróleo.

— A política econômica muda o tempo todo e as necessidades políticas e econômicas mudam o tempo todo. As prioridades mudam. Nós geramos uma situação em que, além de estar tudo na constituição, cada governo faz emendas constitucionais para adaptar aspectos da Constituição aos seu plano de voo.

Além disso, Arida aponta que em muitos casos mudanças que poderiam ser questionadas no Supremo Tribunal Federal (STF) acabam sendo incluídas na Constituição para evitar que isso ocorra, gerando uma série de emendas constitucionais.

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Para resolver esse problema, o economista sugere que fosse criada uma emenda transferindo todas as políticas econômicas para leis complementares.

— Precisamos desconstitucionalizar para dar mais velocidade. Ninguém está falando de mudar princípios, mas de tirar as amarras de políticas econômicas da Constituição.

Arida também acredita que é preciso atualizar as prioridades da Constituição, incluindo temas como o Meio Ambiente, educação tecnológica e rede de proteção social, que estão presentes de alguma forma no documento, mas ganharam uma importância maior atualmente.

O economista destacou a importância das reformas tributária e administrativa, mas ressaltou que esse tipo de medida precisa ter continuidade, e não ser resultado de um governo específico. Disse ainda que a iniciativa de reformar o Estado deve partir do Executivo e, consequentemente, do presidente da República.

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Para ele, o próximo governo precisa renovar o setor público através de “linhas programáticas de ação”, que sejam interministeriais e tenham indicadores de eficiência.

— É preciso ter novas ideias, que reflitam as nossas prioridades hoje e sirvam de gestação para um estado novo. Desconstitucionalização, mudança no setor público, transparência no Orçamento, regime parlamentarista, grupos interministeriais, como juntar essas coisas todas evidentemente é uma arte que eu espero que tenhamos um governante à altura em 2023 — finalizou.

Brasil precisa voltar a investir, diz Lara Resende

No mesmo evento, que tem como objetivo debater o tipo de Estado que o Brasil precisa, o economista André Lara Resende defendeu que o país volte a investir em infraestrutura, independentemente das restrições orçamentárias e fiscais. Para ele, a “verdadeira” responsabilidade fiscal não está em equilibrar as contas públicas a qualquer custo, mas em ter projetos que viabilizem um futuro melhor para o país.

— É preciso voltar a ter investimentos públicos, e que eles sejam avaliados pelo seu retorno, não pela disponibilidade orçamentária e financeira. É definir projetos de longo prazo, é ter metas para investir e adaptar a economia aos desafios do seu tempo. No caso do Brasil, educação, pesquisa, energia. Adaptar a matriz energética às exigências do ponto de vista do meio ambiente. Essa é a verdadeira responsabilidade fiscal e cívica.

Lara Resende também ressaltou que, apesar de o estado em geral ser menos competente em termos de gestão do que a iniciativa privada, existem áreas que não podem ser privatizadas, como a Segurança Pública.

— Se a gente começa a delegar a segurança, vamos acabar em um Estado de milícias. Existem áreas que são bens públicos e precisam ser feitas pelo Estado. Mas o Estado precisa ser competente, sério e respeitado.