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Economia Portugal

Brasileiros no interior de Portugal: Covilhã tem custo baixo para pequenos negócios

Cidade tem entre os principais atrativos a Universidade da Beira Interior. Dos oito mil alunos, 10% são brasileiros
Leonardo Araújo: "Dá para viver com € 500 por mês no interior" Foto: Gian Amato
Leonardo Araújo: "Dá para viver com € 500 por mês no interior" Foto: Gian Amato

COVILHÃ, PORTUGAL - Sem a pressão da especulação imobiliária e escassez de empregos das grandes cidades, cada vez mais brasileiros descobrem a possibilidade de ter mais espaço para trabalhar e viver com mais qualidade e menos custos no coração de Portugal.

O GLOBO percorreu alguns desses pequenos oásis despovoados que desenvolvem estratégias econômicas para atrair e manter empreendedores e profissionais em meio a um novo plano do governo português para atacar o crônico problema demográfico do país.

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Caminho para a famosa e gélida Serra da Estrela, a Covilhã tem entre os principais atrativos a Universidade da Beira Interior (UBI). Dos oito mil alunos, 10% são brasileiros, que têm no visto de estudante uma porta de entrada para Portugal.

Foi depois de ir cursar um mestrado na UBI e se envolver com a cidade que Leonardo Araújo convenceu seu pai a empreender na Covilhã. Ele estuda arquitetura e o pai é sócio da Casa do Braille, especializada em sinalização tátil e acessibilidade cultural em eventos e monumentos.

A empresa acaba de assinar o primeiro contrato por lá, com o Museu da Cidade. Antes de descobrir a Covilhã, Araújo tentou estudar em Coimbra, mas desistiu quando viu a taxa anual: € 7 mil. Os aluguéis também eram caros.

— Pago € 3 mil na UBI. Divido um quarto que custa € 200 com minha namorada. Dá para viver com € 500 por mês no interior — diz Araújo, que, apesar de ser filho do sócio da empresa e um dos gerentes do projeto do Museu da Cidade, considera-se ainda um estagiário e chegou a trabalhar como motoboy durante a pandemia.

Arte urbana na Covilhã: cidade tem um museu a céu aberto Foto: Gian Amato / Agência O Globo
Arte urbana na Covilhã: cidade tem um museu a céu aberto Foto: Gian Amato / Agência O Globo

As obras no museu foram orçadas em € 240 mil e a inauguração está prevista para abril de 2021, segundo a catalã Elisabet Carceller, responsável pela museografia do projeto.

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Ela também integra a empresa Formas Efêmeras, criadora do grande festival de arte urbana do país, o Woolfest, um museu permanente ao céu aberto e apoiado pela prefeitura de Covilhã, que encontrou nas tintas e pincéis de artistas do mundo inteiro as ferramentas para atrair gente e escrever o nome da cidade no mapa.

— Aqui estão artistas como Bordalo II, Vhils, Arm Colective e também o brasileiro Douglas Pereira, do coletivo Bicicleta sem Freio, de Goiânia. Há ainda, uma brasileira retratada pelo espanhol Sebas Velasco. O Brasil é bastante presente na Covilhã, não só nestas que mostrei, mas em artes do Nilo Zach, do Raoni Assis e do Filipe Savian, que é tatuador e vive na cidade — enumera Carceller, enquanto guia O GLOBO pelo museu a céu aberto nas ladeiras coloridas da cidade.

Leonardo Araújo e Elisabet Carceller se inspiram nas obras de arte ao ar livre da Covilhã Foto: Pedro Seixo Rodrigues / Divulgação
Leonardo Araújo e Elisabet Carceller se inspiram nas obras de arte ao ar livre da Covilhã Foto: Pedro Seixo Rodrigues / Divulgação

Próximo de uma das peças de arte urbana que fazem da cidade um museu a céu aberto está o café Brasil Uai, do dentista mineiro aposentado Alisson Cassemiro. Ele foi para Portugal acompanhar a filha, estudante de medicina na UBI. A ideia inicial era não fazer nada, mas não deu certo.

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— Eu cansei. Então montei o café com recursos próprios. Tem uma comunidade de quase mil universitários aqui perto, tenho vendido bem e já estou de olho na loja ao lado, para expandir. Aqui eu pago € 600 de aluguel porque é interior. Não conseguiria no Porto ou em Lisboa. Eu abri em fevereiro e fechei em março por causa da quarentena, mas está recomeçando — diz Cassemiro.

De fregueses fiéis aos turistas, a clientela dele é diversificada e permite ao mineiro traçar um panorama dos imigrantes brasileiros na cidade:

— Antes, o aluno vinha sozinho. Hoje, vem com pai e mãe, aposentados, que querem mais qualidade de vida.

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A prefeitura da Covilhã tem um gabinete de apoio à criação de empresa, o GACE, que auxilia empreendedores na busca por instalações, facilita acesso à administração pública e aos programas de financiamento nacionais e europeus. E concede isenção de tributos municipais a negócios que tenham faturamento abaixo de € 150 mil.

Alisson Cassemiro tem um café na Covilhã Foto: Gian Amato / Agência O Globo
Alisson Cassemiro tem um café na Covilhã Foto: Gian Amato / Agência O Globo

Na iniciativa privada, a New Hand Lab (NHL), um antigo lanifício desponta como celeiro para novos talentos e vitrine para artistas e empreendedores locais.

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Um deles é Miguel Gigante, designer de moda que trabalha com burel, a lã utilizada pelos pastores da Serra da Estrela. Em 2021, será lançado um programa para formar 15 alunos de artes residentes em Portugal, que irão fazer intercâmbios por cidades europeias.

— É um projeto piloto e, entre os estrangeiros residentes em Portugal, vamos dar preferência aos brasileiros por causa do idioma. Basta entrar em contato ([email protected])  para disputar a vaga — diz Francisco Afonso, proprietário da NHL.

*Especial para O GLOBO