Maior fornecedor de produtos agrícolas básicos ao Império do Meio, o agronegócio brasileiro garante que tem condições de suprir a demanda de alimentos do mercado chinês para os próximos anos de maneira sustentável e aposta na economia verde como a próxima fronteira a ser aberta para produtos de maior valor agregado. Sustentabilidade é palavra vem ganhando força nos anos recentes nos discursos do presidente Xi Jinping, que tem sido cobrado pelas economias do Ocidente.
Importante voz do segmento, a senadora Katia Abreu (PP) afirmou que o país está pronto para vender aos chineses, por exemplo, o DDG (dry distillers grains, ou grãos secos por destilação). Trata-se de subproduto do etanol fabricado a partir do milho, altamente proteico, que pode alimentar o rebanho bovino.
— O que o Brasil produz hoje de DDG daria para alimentar quatro milhões de cabeças de gado confinado pelo período de um ano. Só que não se pode comercializar DDG com a China. Não há um acordo para isso firmado entre os ministérios de agricultura dos dois lados — disse Abreu, que é ex-ministra da Agricultura durante o Brasil China Meeting — uma iniciativa LIDE e Valor, com apoio institucional do GLOBO e CBN — que acontece em Shenzhen, na China.
Abreu afirmou que o milho já responde por 30% do etanol brasileiro, mas destacou que isso está longe afetar a produção voltada para a exportação. No ano passado, o Brasil começou a vender milho para os chineses. O item não fazia parte da pauta que é dominada por açúcar, carnes e minério de ferro. O país tenta ocupar um espaço perdido pelos Estados Unidos, até então maior fornecedor da commodity para a China, por conta da guerra comercial. A expectativa é a de que o Brasil tome a posição americana este ano ainda.
A senadora afirmou que China e Brasil devem procurar áreas de complementaridade para atuarem juntos em terceiros mercados. E citou o exemplo do segmento do hidrogênio de baixo carbono.
— A China é especializada na produção de peças, equipamentos para energia solar e eólica. O Brasil domina a expertise para a produção do hidrogênio verde. Os dois podem unir forças — destacou.,
Mas esta não é a única oportunidade de negócios apontada pelos especialistas que participaram do debate em Shenzhen. O setor de logística agrícola também pode abrir caminho para novas parcerias.
O ex-secretário de Agricultura de São Paulo, Francisco Matturro, afirmou durante o debate que os gargalos logísticos brasileiros são desafio para aumento da produtividade do país e oportunidade para novos investimentos chineses. Ele afirmou que o Brasil tem um déficit de 124 milhões de toneladas de armazenagem no âmbito das fazendas.
— Isso provoca perdas de resultados para a agricultura, porque tem pressão forte de preços de frete e caminhão nas datas das colheitas, que coincidem com o período do plantio da safra seguinte. A soja não espera a colheita, tem que ser retirada em três dias, se não cai no chão e se perde — afirmou.
A cabotagem é outro setor a ser explorado, segundo Katia Abreu.
— Hoje há grande viabilidade para a iniciativa privada investir no setor, após a mudança do marco regulatório. Vai ser grande solução para a agricultura do país nos próximos 10 anos para escoar o aumento da produção. Hoje, 93% da matriz de transportes brasileira estão concentrados em estradas, quase nada de ferrovias e praticamente zero de cabotagem.
Matturro, que também é do conselho da LIDE, afirmou que o Brasil vem investindo pesado em aumento de produtividade. E ressaltou que isso se dá sem que se toque em áreas nativas.
— A agricultura usa 7,8% do no uso território — destacou.
Investimentos em novas tecnologias, biosinsumos e na chamada agrofloresta têm mostrado resultados jamais vistos em outros países, segundo o especialista, que citou o estudo de caso de fazenda em Ipameri, em Goiás, onde os ganhos de produção de carne ultrapassaram os 1.000% em apenas três anos.
— Aprendemos que, no Brasil, em se plantando, tudo dá. Mas não é bem assim. Se fizer de maneira consciente com tecnologia e muito suor corre o risco de dar certo, como tem dado. Isso mostra a possibilidade que o Brasil tem de produzir mais em uma mesma área, sem aumentar um hectare e poupando florestas nativas
No mesmo painel sobre o agronegócio o secretário de Comércio da cidade de Tianjin, Li Jian, afirmou que parte expressiva do comércio entre China e Brasil passa pelo porto da cidade de 13 milhões de habitantes. Oitavo do mundo, o porto de Tianjin atende 180 países e movimentou 470 milhões de toneladas de produtos em 2022. Ele afirmou que a vocação da cidade como zona de produção especial, onde se produzem 44 categorias manufaturas industriais (e suas cadeias produtivas), e suas 56 faculdades, são oportunidades para programas cooperação e pesquisa com o Brasil.
— A cidade quer mais empresas brasileiras em programas de cooperação que tragam benefícios recíprocos — salientou.
Em duas décadas, a China tornou-se o principal consumidor de produtos agrícolas do Brasil, que já tem uma participação nas exportações do país superior à de que União Europeia (UE) e Estados Unidos juntos. Em 2022, a fatia do país no total enviado pelo setor agro ao exterior chegou a 32%. Esse percentual não passava de 2,7% em 2000. E a participação de Estados Unidos e UE nesta pauta caiu de 41% ara 23%. No mesmo período, as exportações brasileiras de produtos agrícolas cresceram pouco mais de seis vezes.