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Economia

Cidades brasileiras ainda não estão antenadas com a tecnologia 5G

Regras municipais obsoletas dificultam o básico: a instalação de antenas. Fila de pedidos nas prefeituras chega a 5 mil
Antenas de telecom em SP: burocracia atrapalha avanço Foto: Edilson Dantas
Antenas de telecom em SP: burocracia atrapalha avanço Foto: Edilson Dantas

SÃO PAULO - Se o uso de equipamentos chineses na futura rede de 5G no Brasil virou tema polêmico, o país tem outro obstáculo mais concreto e urgente a transpor para implementar a quinta geração de telefonia: a falta de antenas. Há cerca de 100 mil hoje, mas a Federação Nacional de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e Informática (Feninfra) estima que serão necessários até sete vezes mais equipamentos do tipo estação rádio base, como são chamados.

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O problema é que, para instalar as antenas, as empresas de telecomunicações precisam seguir regras diferentes em cada município, consideradas burocráticas, restritivas e ultrapassadas pelos especialistas em termos ambientais e urbanísticos. Atualmente, há uma fila de cinco mil pedidos de instalação de antenas, ainda da rede 4G, em todo o país. Alguns aguardam uma decisão há mais de sete anos.

Essa demora na autorização pode atrasar a implantação da tecnologia 5G, que precisa de antenas mais próximas umas das outras para transmitir os dados com a alta velocidade esperada: vinte vezes maior do que no 4G. A expectativa é que o leilão das frequência de 5G aconteça em 2021.

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— Essa demora pode levar o país a perder bilhões em investimentos e em ganhos de competitividade — diz a presidente da Feninfra, Vivien Suruagy.

Só com o atraso na instalação das antenas de 4G, o país perde R$ 2 bilhões em investimentos e deixa de abrir 45 mil postos de trabalho, estima a Conexis Brasil Digital, nova marca do SindiTelebrasil, entidade que representa as empresas de telecomunicações. Com a tecnologia 5G, ficam em xeque investimentos de R$ 35 bilhões até 2022.

1,8 mil pedidos na fila em SP

Em São Paulo, onde há cerca de sete mil antenas instaladas, pelo menos 1,8 mil pedidos aguardam autorização. A prefeitura informou que, em 11 de agosto, publicou um decreto específico de cadastramento de novas tecnologias de antenas que não provoquem impacto paisagístico.

Segundo o município, houve desburocratização para a instalação de antenas mais compactas, que utilizam a infraestrutura já existente. Na Câmara de São Paulo, tramita um projeto para simplificar o licenciamento de antenas, cuja lei é de 2004.

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A fila revela um problema crônico das prefeituras na avaliação da instalação desses equipamentos, diz Marcos Ferrari, presidente-executivo da Conexis Brasil Digital. A falta de técnicos treinados é um dos principais problemas, mas a regulação antiga, elaborada nos anos 2000, quando as antenas eram grandes e interferiam na paisagem urbana, também precisa ser atualizada.

Antes, uma antena equivalia a duas geladeiras. Era preciso um guindaste para erguê-las até o topo dos prédios. Hoje, são do tamanho de dois livros. A Ericsson, por exemplo, está desenvolvendo uma antena para 5G parecida com um fita de LED, que pode ser fixada na fachada de um prédio com mínima interferência visual.

— Em 2015, o Congresso aprovou a Lei Geral das Antenas, que tenta uniformizar e agilizar as regras para a instalação. Mas ela só foi sancionada há dois meses — diz Ferrari.

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Além da lei, lembra o dirigente da Conexis, a Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara dos Deputados aprovou a regra do “silêncio positivo”. Se as administrações municipais não responderem aos pedidos de instalação em até 90 dias, eles serão automaticamente autorizados. Mas as empresas ainda não usam esse mecanismo, diz Ferrari, por insegurança jurídica. Segundo a Constituição, a competência de legislar sobre uso do solo urbano é dos municípios.

— A tecnologia avança de forma rápida, mas a legislação dos municípios não acompanha, o que vai dificultar o desenvolvimento do 5G no país. E a pandemia mostrou como a demanda por velocidade na internet será fundamental nos próximos anos — alerta Jaqueline Lopes, chefe de Relações Governamentais e Industriais da sueca Ericsson no Brasil.

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A empresa é uma das principais fabricantes de equipamentos de telecomunicações do mundo, ao lado da finlandesa Nokia e da chinesa Huwaei, alvo de um boicote liderado pelos EUA ao qual o Brasil cogita aderir.

Cidades que já perceberam a importância de facilitar a instalação do 5G se anteciparam e mudaram suas leis para antenas. Desde 2018, Porto Alegre concede a autorização em um dia, por um processo digital. Antes, o pedido dependia do aval de 15 órgãos municipais, o que levava dois anos.

— Criamos um modelo de autolicenciamento. As empresas já sabem o que é proibido. Então fazem uma declaração de responsabilidade técnica, pagam a taxa, e o pedido é atendido em um dia. Hoje, a fila de pedidos está zerada — diz o secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Porto Alegre, Germano Bremm.

Distância não é problema

Na Assembleia do Rio, foi aprovada recentemente uma lei que estimula os 92 municípios fluminenses a atualizarem suas legislações para atender pedidos das teles em até 180 dias. Nilo Pasquali, superintendente de regulamentação da Anatel, agência reguladora do setor, diz que a Lei das Antenas vai uniformizar a regras municipais. Um dos entraves mais comuns, diz, é a exigência de distância mínima de 500 metros entre antenas:

— Havia a preocupação de que a emissão de ondas eletromagnéticas afetasse a saúde, mas a Organização Mundial de Saúde (OMS) já afirmou que não há problema.