Exclusivo para Assinantes
Economia Coronavírus

Com pandemia, cresce procura por uma casa no campo

Famílias buscam imóveis para quarentena em cidades como Campos do Jordão. Quem pode pagar compra pela internet

Imóvel à venda em Campos do Jordão: mercado de luxo aquecido na quarentena.
Foto:
Divulgação
/
Fotos de divulgação
Imóvel à venda em Campos do Jordão: mercado de luxo aquecido na quarentena. Foto: Divulgação / Fotos de divulgação

RIO - Angela Cristina Quintilio Bernardes realizou um sonho: ter uma casa na bucólica Campos do Jordão, encravada na parte paulista da Serra da Mantiqueira. E tudo foi feito pela internet, sem sequer visitar o imóvel. A empresária de 44 anos, moradora da Vila Romana, na Zona Oeste de São Paulo, acelerou seus planos devido à pandemia do coronavírus . O desejo de ter um recanto para o isolamento a levou a fazer a compra de R$ 450 mil, à vista.

Auxílio: Justiça derruba liminar que proibia corte de serviços essenciais por inadimplência

— Espero ir para lá logo, já estou comprando os móveis em uma loja na cidade, que vai entregar tudo. Quero um local tranquilo para passar a quarentena com meu marido e meus dois filhos pequenos — diz ela, dona de um café na capital paulista que, por causa das restrições sociais, está fechado. — Aqui estamos vivendo toda essa angústia de forma enjaulada.

Emprego: Governo quer permitir que empresas emprestem funcionários ociosos a outras

A tentativa de sair dos grandes centros, geralmente onde a pandemia avança em velocidade mais forte, tem criado uma tendência de negócios imobiliários. Todos com pagamentos à vista — sem a necessidade de financiamento imobiliário — em troca de espaço para um isolamento social de qualidade e a possibilidade de posse imediata.

Entenda: Caixa vai suspender pagamento de prestações atrasadas no crédito imobiliário

Patrick Progin Nicolau, diretor da imobiliária Cadij, a maior de Campos do Jordão, conta que casos como o de Angela estão se tornando comuns nesta pandemia:

— Só nesta semana, vendi dois imóveis assim. As pessoas transferem o dinheiro na hora, sem visitar o local, desde que possam se mudar imediatamente. E já ligam para a loja de móveis para mobiliar a casa — conta Nicolau. — Anunciei agora uma casa de R$ 1,7 milhão e já recebi propostas apenas pelas fotos.

Ele explica que este tipo de negócio não existia antes do coronavírus. Nessas compras às escuras, o valor médio está em R$ 700 mil. Quem não pode comprar tenta alugar por temporada, apenas para passar o período da quarentena em Campos do Jordão, famosa no início do século passado como local de recuperação de tuberculosos, devido ao seu clima ameno:

— O que vimos crescer como nunca é a tentativa de locação por temporada, para dois, três meses, mas a cidade proibiu isso, para evitar que forasteiros tragam casos de coronavírus para a cidade.

Coronavírus: Crise ameaça a indústria dos super-heróis

Se a locação está proibida, a venda segue em alta para quem tem interesse e recursos para isso. A maioria destes clientes pede sigilo de seus nomes. Em parte, por temerem ser considerados potenciais vetores do vírus, embora queiram apenas fugir da doença.

Muitos dos que têm adquirido estes imóveis são casais na faixa dos 50 anos, próximos ao chamado grupo de risco, ou famílias com filhos pequenos, que querem fugir do confinamento em apartamentos e sonham com uma casa com quintal, varanda e piscina.

Aumento de 52%

Fora da Serra, o litoral também é procurado pelos interessados em uma quarentena mais leve. No entanto, muitas cidades litorâneas adotaram bloqueios para evitar a contaminação da população.

Búzios, na Região dos Lagos do Rio, por exemplo, fechou a cidade para turistas e transações imobiliárias. O mesmo ocorre com Ilhabela, no litoral norte de São Paulo. Muitas cidades estão fazendo controle, deixando entrar somente pessoas que comprovem que moram no local, mediante apresentação de contas de consumo. Mas, em municípios de serra, há mais margem:

— Os negócios estão crescendo na casa de 40% — comenta Cleiton de Paula Bento, da imobiliária Plenitude Imóveis, de Ibiúna (SP), região de chácaras a 55 quilômetros da capital paulista. — A prefeitura proibiu a locação. Se pudesse, seria muito negócio, a procura disparou.

Coronavírus : socorro ao setor elétrico deve fazer conta de luz subir 20%

Ele explica que, na cidade, é possível adquirir uma chácara boa, segura e com piscina por cerca de R$ 400 mil. E que, no atual momento, a preferência é por casas mobiliadas, que antes eram mais difíceis de serem vendidas.

Sites e aplicativos de locação confirmam esse movimento. Tiago Gadino, diretor financeiro da Imovelweb, afirma que, na plataforma, que conta com cinco milhões de usuários únicos por mês, a busca por imóveis rurais em março foi 52% maior que em fevereiro e 124% superior a março de 2019:

— Um crescimento desta magnitude é totalmente atípico. Pelo que vemos, muita gente passou a pensar em locais tranquilos e com espaço para a quarentena.

Ele afirma que, por outro lado, a pandemia está fazendo com que mais pessoas busquem, decidam e fechem negócios apenas olhando fotos e vídeos da plataforma, sem a necessidade de tantos encontros presenciais.

Não apenas as vendas de imóveis com espaços amplos estão em alta nesta fase de restrições sociais impostas pelo coronavírus. A maior plataforma de locação de imóveis do mundo, o AirBnb, confirma que há uma tendência nos centros urbanos do Brasil de busca por imóveis para longas estadias.

“Houve aumento da demanda de hóspedes por estadias mais longas, nos municípios em que moram, especialmente com o objetivo de preservar a saúde das pessoas que fazem parte do grupo de maior risco para a Covid-19”, diz a empresa em nota. O número de reservas acima de 28 dias em março foi 24% maior que no mesmo período de 2019.