Economia

Com preço da carne em alta, produção de ovos bate recorde e Brasil já produz 22,5 dúzias por habitante

Demanda chinesa e dólar alto elevaram valor da carne bovina. País tem mais boi que gente
Na foto, cultivo das galinhas sem o uso de gaiolas Foto: Custódio Coimbra / Agência O Globo
Na foto, cultivo das galinhas sem o uso de gaiolas Foto: Custódio Coimbra / Agência O Globo

RIO - Em meio à disparada nos preços da carne na pandemia, a produção de ovos de galinha bateu recorde em 2020 e chegou a 4,8 bilhões de dúzias, aumento de 3,5% em relação à 2019. Com esse resultado, o Brasil já produz 22,5 dúzias por habitante. O número é recorde na série histórica, iniciada em 1974.

Os dados são da Pesquisa da Pecuária Municipal (PPM) 2020, divulgada nesta quarta-feira pelo IBGE.

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O dólar alto pressionou o preço dos insumos pecuários, como a ração, o que refletiu no preço da proteína animal. A demanda chinesa pelas carnes bovina e suína também contribuíram para a alta, levando o brasileiro a optar pelo ovo para economizar com alimentação.

A Região Sudeste respondeu por 43% de toda a produção nacional de ovos. São Paulo seguiu como o maior estado produtor, responsável por 25,6% do total produzido no país.

Mariana Oliveira, supervisora da pesquisa do IBGE, lembra ainda que o preço da arroba do boi gordo e do bezerro subiram no ano passado. Houve ainda um incentivo na produção de frango, por exemplo, dado o seu ciclo mais curto de criação e produção na comparação com os de outros animais.

— Além da produção estar cara, tivemos mais incentivo para o mercado externo do que para o mercado interno, o que resulta numa diminuição da oferta (no mercado doméstico) e aumento de preços. Esse aumento aconteceu para todas as proteínas em geral.

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O cenário mais desfavorável para o consumo de proteínas no mercado interno intensifica o habitual comportamento do brasileiro de consumir apenas o que cabe no orçamento, avalia:

— A gente já tem um comportamento de crescimento (da produção de ovos) que vem desde 1999. E, quando fazemos pesquisa sobre comportamento do consumidor, vemos que o ovo de galinha sempre foi uma fonte de proteína mais acessível. Mas nesse ano atípico de 2020 acabou ficando ainda mais importante encontrar essa alternativa. O consumidor vai de acordo com o que dá no bolso, ainda mais com as dificuldades econômicas  — explica Mariana.

No Grupo Mantiqueira, maior produtor de ovos do país, a demanda aumentou em cerca de 9% em 2020, conta Leandro Pinto, presidente da empresa:

— Aumentamos nossa produção em 20% para atender a demanda no ano passado. Mas este crescimento não vem de um ano para cá, estamos acompanhando esta curva nos últimos 10 anos. Temos um planejamento estratégico independente de ondas, e estamos crescendo continuamente em produção de ovos cage-free (aves livres de gaiolas), que é nosso maior objetivo — conta o executivo.

Leandro Pinto, presidente do grupo Mantiqueira Foto: Divulgação
Leandro Pinto, presidente do grupo Mantiqueira Foto: Divulgação

Na Central de Abastecimento do Estado do Rio de Janeiro (Ceasa-RJ), distribuidoras que abastecem desde o pequeno varejo a grandes supermercados também sentiram impacto positivo nas vendas.

Mayara Uliana, gerente de marketing da Casbri, conta que a empresa prevê um crescimento de 20% nas vendas desse mix de produtos no próximo ano:

— No início da pandemia tivemos um aumento expressivo nas vendas de ovos, nossos clientes não queriam ficar sem produtos para revender. Depois, a demanda continuou crescente em razão do aumento do preço de outras proteínas - apesar de sofrermos também o impacto do preço do milho, que encarece o produto final. Prevemos um consumo ainda maior em 2022.

Centro de distribuição da Casbri, empresa distribuidora de ovos, no Ceasa-RJ Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo
Centro de distribuição da Casbri, empresa distribuidora de ovos, no Ceasa-RJ Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo

Exportações de carne crescem

De acordo com a pesquisa, o rebanho bovino apresentou mais um ano de alta em 2020. Houve um acréscimo de 1,5% no rebanho, totalizando 218,2 milhões de cabeças de gado. O número é maior do que o da população brasileira estimada pelo IBGE, de 213,3 milhões em 2021.

Os principais estados responsáveis por essa alta foram Mato Grosso, Goiás e Pará.

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Seguindo a tendência de alta do ano anterior, o ano de 2020 foi marcado pela alta do preço do boi gordo. De acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior, foram exportadas 1,7 milhão de toneladas de carne in natura em 2020, alta de 10% em relação ao ano anterior.

"O novo recorde de exportação da carne bovina, explicado, especialmente, pela demanda chinesa – que teve alta de 74,5%, refletiu-se nos preços de toda a cadeia, do bezerro ao consumidor final", concluíram os pesquisadores.

Só a China comprou 868,7 mil toneladas de carne bovina in natura.

Rebanho de gado em uma fazenda em Rurópolis, estado do Pará, na floresta amazônica brasileira Foto: NELSON ALMEIDA / AFP
Rebanho de gado em uma fazenda em Rurópolis, estado do Pará, na floresta amazônica brasileira Foto: NELSON ALMEIDA / AFP

O país também aumentou o apetite por carne suína, fazendo com que as exportações brasileiras praticamente dobrassem: aumento em 98,8% em 2020

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"A China, em 2020, continuou com baixo estoque de carne suína, tendo, assim, a necessidade de suprir a sua demanda interna por meio da importação de proteína animal", explicou a equipe de pesquisa do IBGE.

Produção de leite bate recorde

A produção nacional de leite atingiu a marca de 35,4 bilhões de litros em 2020, um aumento de 1,5% em relação a 2019. É a maior produção já registrada na pesquisa.

A Região Sudeste, com alta de 1,9%, liderou pelo segundo ano seguido esse segmento, com 34,3% de participação, ao produzir 12,2 bilhões de litros de leite.

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Minas Gerais permaneceu como o estado com o maior volume de leite produzido. Foram 9,7 bilhões de litros de leite, 27,3% da quantidade total. A quantidade representa um aumento de 2,6% em relação a 2019.

Assim como a produção, o valor de produção leiteira bateu recorde. Houve um acréscimo de 30,8% em relação ao ano anterior, resultado da combinação de aumentos de volume e de preço, atingindo R$ 56,5 bilhões.

O preço médio nacional pago ao produtor pelo litro do leite teve alta de 28,9% em 2020, chegando a R$ 1,59 por litro.

"A alta no preço do leite, no ano de 2020, tem como motivos fundamentais a elevação do preço da ração e a alta do preço de insumos, especialmente medicamentos, que foram impactados pela valorização do dólar", disse a equipe responsável pela pesquisa.

Exportação de frangos e suínos deve crescer em 2021

Repetindo o desempenho do ano passado, a produção e a exportação de carne suína e de frangos vai crescer este ano no Brasil, segundo estimativas da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). E a China continua sendo o principal comprador desses produtos brasileiros.

— As empresas do segmento investiram cerca de R$ 1 bilhão para manter a produção de frangos e suínos e garantir esses alimentos na mesa dos brasileiros. O consumo doméstico desses produtos também vem crescendo - disse Ricardo Santin, presidente executivo da ABPA.

A produção de frangos deve crescer 3,5% este ano, para algo como entre 14,1 milhões e 14,3 milhões de toneladas, e as exportações vão aumentar até 7,5%. Já o consumo doméstico vai crescer 2% este ano, estima a entidade. Para 2022, a estimativa é de crescimento da produção de 4% e de 13% nas exportações.

Em relação a suínos, a produção vai crescer 6% este ano e as exportações até 12%. Já o consumo doméstico vai crescer  até 5,5% este ano. No caso de suínos, a China é responsável pela compra de 52% das exportações brasileiras. O Brasil é o quarto maior exportador e produtor de carne suína do mundo.

— É importante lembrar que a produção desses produtos está longe da Amazônia, portanto é uma exportação sustentável, sem desmatamento - disse Santin.