Economia

Com pressão da inflação, Banco Central sobe taxa básica de juros para 4,25%

Copom sobe Selic pela terceira vez seguida e sinaliza outra alta de 0,75 ponto percentual para a próxima reunião
Choques nos preços de commodities e energia têm pressionado a inflação Foto: Marcello Casal JrAgência Brasil / Marcello Casal Jr/Agência Bras
Choques nos preços de commodities e energia têm pressionado a inflação Foto: Marcello Casal JrAgência Brasil / Marcello Casal Jr/Agência Bras

BRASÍLIA — O Banco Central subiu a taxa básica de juros, a Selic, de 3,5% para 4,25% ao ano na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) finalizada nesta quarta-feira. O aumento já tinha sido sinalizado e era amplamente esperado pelo mercado financeiro.

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A alta de 0,75 ponto percentual (p.p) é a terceira seguida na Selic, depois de atingir a mínima histórica de 2% no ano passado.

No comunicado desta quarta-feira, o BC ainda sinalizou outra alta de 0,75 p.p na próxima reunião, mas ressalvou que uma piora das expectativas de inflação pode exigir altas maiores.

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Ainda no comunicado, o Copom afirmou que deve levar os juros até um patamar considerado neutro. Para os economistas, uma taxa neutra está em torno de 6% a 6,5%.

Essa é uma mudança em relação aos comunicados anteriores, quando o Copom afirmava que faria um ajuste parcial de juros. Ou seja, o Comitê está sinalizando por uma alta mais intensa de juros nos próximos meses.

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"Esse ajuste é necessário para mitigar a disseminação dos atuais choques temporários sobre a inflação. O Comitê enfatiza, novamente, que não há compromisso com essa posição e que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar o cumprimento da meta de inflação", diz o comunicado.

O principal objetivo do Banco Central é atingir a meta de inflação e o instrumento para isso é a taxa Selic. Ao aumentar os juros, o crédito tende a diminuir, assim como o consumo, o que diminui a inflação. No entanto, esse efeito tende a demorar de seis a nove meses para chegar na economia real.

. Foto: Editoria de Arte
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Guilherme Loureiro, economista-chefe da Trafalgar Investimentos, avalia que a linguagem e as sinalizações do Banco Central foram positivas para controlar as expectativas de inflação para 2022.

— No Brasil todos os fatores jogam nessa direção de uma linguagem um pouco mais dura, atividade é mais forte, persistência maior de inflação, risco novo no radar crise hídrica, expectativa de inflação acima da meta. Nesse aspecto, acho que ele adotou um tom mais duro de política monetária para ancorar as expectativas do ano que vem que estavam começando a subir aos poucos — disse.

Inflação

A trajetória de alta registrada neste ano é um reflexo do aumento da preocupação do Banco Central com a inflação. Os preços vêm subindo além das expectativas do início do ano por conta de diferentes choques, como a alta nos preços de commodities e a crise energética .

Em maio, a inflação registrou a maior alta para o mês em 25 anos e bateu 8,06% nos últimos 12 meses , acima do teto da meta. Para 2021, a meta é de 3,75%, com intervalo de tolerância entre 2,25% e 5,25%.

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Diferente dos comunicados anteriores, quando a avaliação do Copom era de que a alta na inflação era temporária, o comunicado divulgado nesta quarta-feira ressalta que a persistência da pressão inflacionária é maior do que a esperada, principalmente sobre os bens industriais.

"Adicionalmente, a lentidão da normalização nas condições de oferta, a resiliência da demanda e implicações da deterioração do cenário hídrico sobre as tarifas de energia elétrica contribuem para manter a inflação elevada no curto prazo, a despeito da recente apreciação do Real", aponta o Copom.

Para João Leal, economista da Rio Bravo Investimentos, o comunicado do Copom foi bastante “hawkish”, indicando que o Banco Central está preocupado com a inflação.

— Deixou claro que não vê a inflação como temporária, mas sim que observa uma persistência e ainda endereçou quais são as principais preocupações, incluindo o comportamento dos preços de serviços, que deve aumentar ao longo dos próximos meses em linha com a recuperação e retomada da economia — destaca ele.

Na avaliação de Leal, a possibilidade de ser realizado um ajuste maior do que 0,75 p.p. na próxima reunião foi uma declaração importante, já que as pressões inflacionárias podem surpreender novamente até agosto, quando haverá a próxima reunião, e influenciar nas expectativas de inflação para 2022.

Ele pondera ainda que a elevação da Selic abre um espaço maior para a apreciação do câmbio, o que reduz parcialmente a pressão sobre os preços, sobretudo de commodities, aliviando a inflação. Contudo, sozinho não é suficiente para conter todas incertezas:

— Projetamos que o câmbio chegue a R$ 5,20 ou R$ 5,30 no final deste ano e a R$ 5,40 no final do ano que vem, por causa do risco eleitoral e risco fiscal. O juros ajuda, mas não é suficiente para tirar o nosso risco-país.

Para 2021

A expectativa do mercado é que a inflação caia no restante do ano, mas ainda assim fique acima da meta. De acordo com o relatório Focus, o índice deve finalizar 2021 em 5,82%.

“Acho que ele (BC) adotou um tom mais duro de política monetária para ancorar as expectativas do ano que vem que estavam começando a subir aos pouco”

Guilherme Loureiro
Economista-chefe da Trafalgar Investimentos

Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter, explica que o Banco Central está olhando para a inflação de 2022, já que atingir a meta deste ano seria muito custoso e difícil, dada a defasagem de atuação da política monetária.

— A inflação mais alta foi de choques externos, não foi resultado de política monetária. A gente está tendo estímulo muito alto de fora, as commodities estão em alta. Eu acho mais prudente o BC considerar que a meta desse ano não dá para ser cumprida — disse.

O cenário econômico básico do Copom aponta para uma inflação em 5,8% para este ano, acima do teto da meta, e de 3,5% para 2022. Já a Selic fecharia 2021 em 6,25% e subiria para 6,5% no próximo ano.

Para o próximo ano, a meta da inflação é de 3,5% ao ano e o mercado já está projetando índices um pouco acima, em 3,8% ao ano. Já para a Selic, a expectativa é a mesma do Copom.

Fernando Gonçalves, superintendente de pesquisa econômica do Itaú Unibanco, avalia que o comunicado do Copom de manter certa flexibilidade sobre o próximo aperto monetário indica que o BC está olhando para as expectativas de inflação de 2022.

— No fundo, o comunicado diz que o diferencial de juros pode ser um pouco maior e isso vai na direção de apreciação do câmbio. Nossa previsão é de que o câmbio chegue a R$ 4,75 no final do ano, muito por conta do diferencial de juros e pela revisão de projeção da dívida bruta para baixo, o que traz um certo alívio de curto prazo na questão fiscal.

Atividade

Na avaliação do Copom, a atividade econômica vem surpreendendo positivamente mesmo com a intensidade da segunda onda da Covid-19 e os riscos para recuperação "reduziram-se significativamente".

O Comitê também ressaltou uma "recuperação robusta" em países desenvolvidos que devem manter os juros baixos por mais tempo. Essa situação pode causar uma incerteza elevada para países emergentes por conta de questionamentos sobre os riscos inflacionários.

Sobre esses riscos, o Copom entende que é possível que a inflação fique abaixo do cenário básico se houver uma reversão do aumento do preço das commodities, mas que o risco fiscal continua sendo muito relevante para que os índices de preços fiquem acima do esperado.

"O Copom reitera que perseverar no processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira é essencial para permitir a recuperação sustentável da economia. O Comitê ressalta, ainda, que questionamentos sobre a continuidade das reformas e alterações de caráter permanente no processo de ajuste das contas públicas podem elevar a taxa de juros estrutural da economia", ressaltou.