Economia

Como é a megaoperação de resgate do navio que fechou o Canal de Suez e 'engarrafou' centenas de embarcações

Dragagem terá de retirar milhares de metros cúbicos de areia para tentar fazer cargueiro flutuar de novo
O Ever Given bloqueando o Canal de Suez Foto: - / AFP
O Ever Given bloqueando o Canal de Suez Foto: - / AFP

SUEZ, Egito - Corre o risco de  durar semanas a libertação do cargueiro gigante Ever Given, de 400 metros de comprimento, 59 de largura e  mais de 200 mil toneladas, que bloqueou o Canal de Suez e deixou 'engarrafados' mais de 200 navios, atrapalhando o comércio internacional. Mas como está sendo feita essa megaoperação?

Segundo especialistas, após dias de tentativas infrutíferas, as equipes de salvamento estão se concentrando na dragagem para remover areia e lama em torno da proa do navio.

Uma draga de sucção especial será usada para mover 2 mil metros cúbicos de areia e lama ao redor do navio a cada hora.

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Além disso, bombas de alta capacidade também são usadas para reduzir os níveis de água que servem de lastro em certas partes do navio.

A primeira tentativa de desencalhar o navio fracassou na sexta-feira, reconheceu a empresa marítima Bernhard Schulte Shipmanagement (BSM), encarregada da gestão técnica do navio.

A empresa informou que "dois rebocadores adicionais de 220 a 240 toneladas" chegariam antes de 28 de março para reforçar as manobras.

Oito piscinas olímpicas em metros cúbicos

Remover a areia é fundamental para tentar fazer o Ever Given voltar a flutuar no canal. Segundo os especialistas dezenas de milhares de metros cúbicos de areia no canal precisam ser retirados para liberar o gigantesco navio.

Dragagem se concentra na proa do cargueiro gigante Foto: - / AFP
Dragagem se concentra na proa do cargueiro gigante Foto: - / AFP

As dragas precisarão mover entre 15 mil a 20 mil metros cúbicos de areia e lama, o equivalente à capacidade de oito piscinas olímpicas.

O objetivo é alcançar uma profundidade de 12 a 16 metros, o que pode permitir que o navio flutue, disse a Autoridade do Canal de Suez (SCA) na quinta-feira.

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Enquanto uma escavadeira e as dragas trabalham, rebocadores tentam puxar o cargueiro para libertá-lo do encalhe.

Marinha dos EUA vai ajudar

Após se comunicar com o governo egípcio, a Marinha americana vai enviar ao canal seus experts em operações de dragagem, para ajudar as equipes de resgate. A Turquia propôs enviar um grande rebocador para auxiliar no socorro.

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Se a dragagem e as bombas não forem suficientes, será preciso remover a carga do navio (que tem capacidade para 20.100 contêineres de aço) e esvaziar os tanques de combustível.

Mas isso vai requerer enormes guindastes, por exemplo, e terá que ser feito com extremo cuidado, dizem os técnicos, porque qualquer desequilíbrio na estabilidade do Ever Given poderá causar danos.

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Navio pode se partir

Segundo disse à BBC Sal Mercogliano, especialista em história marítima da Campbell University, nos Estados Unidos, o pior cenário seria o navio se partir em dois se todo o resgate não for feito com cautela.

O MV Evergreen, que saiu da Ásia e tinha como destino Rotterdam, é a maior embarcação já encalhada no canal desde a sua criação, em 1869. O acidente ocorreu depois de fortes rajadas de vento
O MV Evergreen, que saiu da Ásia e tinha como destino Rotterdam, é a maior embarcação já encalhada no canal desde a sua criação, em 1869. O acidente ocorreu depois de fortes rajadas de vento

Segundo a CNN, numa entrevista à TV holandesa, Peter Berdowski, CEO da Boskalis Westminster, a empresa-mãe da equipe de salvamento, afirmou que pelo menos o cargueiro ainda está em boas condições, o que ajudará no resgate. Mas a primeira impressão que se tem ao ver o Ever Given, admitiu ele, é que está "preso como uma rocha" no canal.

O brasileiro Rodrigo Leandro, 41 anos, que trabalha em Dubai, Emirados Árabes Unidos, como gerente de fretamento da empresa Mur Shipping, disse não esperar uma solução definitiva para o bloqueio no Canal de Suez nas próximas três semanas.

— Não temos nenhum navio agora na rota de Suez, por onde transitam 350 embarcações por semana nas duas pernadas, norte e sul. Mas os que saírem a partir de agora rumo a Europa farão o caminho pela África do Sul, o que vai aumentar a viagem em até 25 dias — disse ele. — Não vejo tão cedo esse canal abrindo. Acho difícil liberar o navio, que é enorme, sem tirar a carga ou o óleo dele. Não vejo melhora do quadro em pelo menos três semanas — acrescentou Rodrigo, que tem experiência de 20 anos em logística do transporte de minérios, fertilizantes e grãos.

Os preços do petróleo tiveram forte alta na sexta-feira depois do fracasso da primeira tentativa de socorro.

O barril de Brent do Mar do Norte para entrega em maio fechou em alta de 4,23% em Londres, a US$ 64,57.

Enquanto isso, em Nova York, o barril de WTI para entrega no mesmo período subiu 4,11%, a US$ 60,97.

Um evento raro ha História

Um bloqueio como este no Canal de Suez é um evento raro na história das principais rotas marítimas comerciais. Desde o início da operação do Canal, em 1869, houve apenas cinco interrupções do tráfego de navios. Confira abaixo um histórico de outros episódios do tipo:

Julho de 2018: o Canal de Suez fechou por várias horas depois que o navio de contêineres de propriedade grega Panamax Alexander sofreu uma falha de motor que levou a uma colisão de cinco navios;

28 de abril de 2016: o navio porta-contêineres MSC Fabiola encalhou no Canal de Suez, bloqueando o tráfego para o sul por dois dias;

Outro ângulo do Ever Given encalhado no canal Foto: MOHAMED ABD EL GHANY / REUTERS
Outro ângulo do Ever Given encalhado no canal Foto: MOHAMED ABD EL GHANY / REUTERS

8 e 9 de dezembro de 2010: O Canal do Panamá fechou por 17 horas por causa de fortes chuvas e inundações, o primeiro fechamento desde a paralisação de um dia em dezembro de 1989 durante a invasão americana do país centro-americano;

Junho de 1967 a junho de 1975: Canal de Suez fechado pelas autoridades egípcias após a Guerra dos Seis Dias, travada entre os dias 5 e 10 de junho de 1967, tendo de um lado do conflito as forças armadas do Estado de Israel e, do outro, as do Egito, Síria, Jordânia e Iraque, que, por sua vez, receberam o apoio de Kuwait, Líbia, Arábia Saudita, Argélia e Sudão;

Julho de 1956: O presidente egípcio Gamal Abdel Nasser nacionalizou a hidrovia, desencadeando a Crise de Suez que levou ao ataque de Israel e à intervenção da Grã-Bretanha e da França. O canal fechou de outubro de 1956 a março de 1957.