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Economia

Conheça o juiz e fisiculturista que faz sucesso nas redes como 'influencer fitness'

Membro de família tradicional de magistrados em SP, Ralpho Barros Monteiro não teme exposição e se dedicará a casos como a recuperação judicial da Cavalera
 O juiz Ralpho Barros Monteiro, 43 anos, da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais, é colecionador de bonecos de Super-heróis Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
O juiz Ralpho Barros Monteiro, 43 anos, da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais, é colecionador de bonecos de Super-heróis Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

SÃO PAULO —  É difícil não notar a presença de Ralpho Barros Monteiro. Não tanto por seu 1,72m de altura. O que chama a atenção no paulistano de 43 anos é, na linguagem das academias (de ginástica), o shape , ou a boa forma que exibe no Instagram a mais de 63 mil seguidores. Ele é provavelmente o único juiz de São Paulo que é, ao mesmo tempo, bodybuilder , professor de Direito e influenciador digital.

Magistrado desde 2008, Monteiro foi nomeado há um mês como auxiliar da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da capital paulista, uma das principais dedicadas à insolvência no país e que recebe casos envolvendo grandes empresas.

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Ele substitui Marcelo Sacramone, de 40 anos, professor de Direito da PUC-SP, que ficou por seis anos na função e pediu exoneração em julho para abrir um escritório — o que pegou de surpresa grandes bancas especializadas.

Logo após a nomeação de Monteiro, a conta do juiz no Instagram e fotos suas sem camisa viralizaram entre advogados que lidam com recuperação judicial. A maioria ainda não o conhecia.

Livraria Cultura, em São Paulo: Nomeado em julho como auxiliar da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da capital paulista, Ralpho Barros Monteiro vai cuidar de casos como o da livraria Foto: Agência O Globo
Livraria Cultura, em São Paulo: Nomeado em julho como auxiliar da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da capital paulista, Ralpho Barros Monteiro vai cuidar de casos como o da livraria Foto: Agência O Globo

Reestruturação de empresas

O magistrado já atuou em duas varas de registros públicos em São Paulo e é juiz auxiliar na capital paulista há dez anos.

Sua experiência prévia em casos de reestruturação de empresas, porém, não é grande. Em 2015, substituiu na 2ª Vara de Falências durante uma licença do juiz titular, Paulo Furtado, que foi seu professor e o indicou para o cargo atual.

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Agora, Monteiro herdou de Sacramone, cuja especialização é destacada no meio, casos icônicos como as recuperações judiciais da Livraria Cultura e da grife Cavalera, as falências da Construtora Atlântica e da boate Love Story, e diversos casos relacionados à Queiroz Galvão Energia.

Sacramone, que é amigo do sucessor, afirma que Monteiro é o magistrado ideal para assumir o posto.

— Ralpho tem uma imagem de fortão que pode enganar, mas é um sujeito muito calmo e um professor muito estudioso, o que essa área muito especializada exige — conta.

Musculação e natação

Monteiro admite que o novo trabalho é desafiador e tem se dedicado. O estudo da nova Lei de Falências, promulgada em 2020, entrou em sua rotina, diz:

— Minha impressão preliminar é a de que hoje os credores estão em uma posição melhor do que antes da reforma da norma.

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O magistrado pretende enfrentar recuperações judiciais de grandes empresas com o que aprendeu ainda adolescente, quando começou no fisiculturismo:

— É um esporte que você demora a perceber que, no fundo, é disciplina. As pessoas confundem e menosprezam muito com essa história de hormônio e anabolizante, mas isso é 5% (dos casos).

O juiz Ralpho Barros Monteiro herdou casos como o da recuperação judicial da Cavalera Foto: Agência O Globo
O juiz Ralpho Barros Monteiro herdou casos como o da recuperação judicial da Cavalera Foto: Agência O Globo

No dia a dia, Monteiro acorda por volta das 6h e logo pela manhã encara uma sessão de musculação. Já chegou a treinar duas vezes ao dia: natação de manhã e academia à noite.

No Judiciário, sua jornada começa às 11h e vai pelo menos até 19h. O estudo, a vida acadêmica e o lazer são alocados no período noturno, o que faz com que ele durma pouco. Só vai para a cama depois de 1h.

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Durante a semana, o magistrado ainda consegue tempo para passar com o filho de 9 anos e, de vez em quando, ainda escreve como hobby . Ele trabalha em um livro sobre a Segunda Guerra Mundial,  além de preparar uma reedição de seus livros de Direito já publicados.

Aulas on-line

No fim de semana, o professor ainda costuma usar os sábados para gravar suas aulas. Ele leciona há 20 anos e, atualmente, é docente de Direito Civil e Registros Públicos em cursos preparatórios para concursos públicos na Damásio, uma das maiores do ramo jurídico, e em especializações.

Colecionador de bonecos de super-heróis e de instrumentos musicais, ele diz saber que seu estilo distante do estereótipo do magistrado sisudo e formal lhe rende críticas veladas de alguns colegas, mas desperta admiração entre alunos, que costumam compará-lo ao ator de filmes de ação Vin Diesel:

— Eu não vejo problema em postar fotos. Treinar na academia com uma regata mais cavada, por exemplo, não condiz com a atividade de juiz? O juiz que joga tênis pode postar. O corredor pode postar correndo. O meu esporte é o fisiculturismo.

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Na internet, Monteiro compartilha com seus seguidores suas rotinas de treino e alimentação, além de postar vídeos sobre temas relacionados ao Direito e dicas de estudo a seus alunos.

Sem política ou parceria com marcas

A recente moderação nas fotos, conta, já foi uma concessão aos pedidos da mãe. Também não fala de política e não faz parcerias com marcas de produtos fitness.

— Nego muita coisa. Já fui chamado para fazer campanha publicitária com minha noiva (a biomédica Mayara Stival, ex-musa do Brasileirão) e não topei. Eu poderia, se não recebesse para isso, mas pago por tudo o que recebo, faço questão.

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Ele foge do padrão, mas sua família tem tradição na magistratura. Seu bisavô, Phidias de Barros Monteiro, foi juiz. O avô, Raphael de Barros Monteiro, ministro do Supremo Tribunal Federal no regime militar. O pai, Ralpho de Barros Monteiro, desembargador. Um de seus tios, Raphael de Barros Monteiro Filho, foi presidente do Superior Tribunal de Justiça.

— Passei no primeiro concurso que prestei. Na fase da prova oral, ser de família tradicional pode até ajudar, mas nas primeiras etapas a prova é cega. Apesar desse meu jeitão, sempre trabalhei e produzi muito — diz.

O concurso para a magistratura paulista é um dos mais concorridos do país. Em sua edição mais recente, teve 23.122 candidatos para preencher 310 postos, mas apenas 86 foram aprovados. Isso porque, historicamente, a maioria das vagas não é preenchida porque não há postulantes que atinjam a nota mínima exigida no processo seletivo.