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Amil: empresa que assumiu planos individuais quer dobrar carteira, mas usuários relatam redução da rede

Negócio depende da ANS. Para garantir manutenção dos atendimentos, APS diz que vai contratar a própria Amil por 6 meses e renovar credenciamentos por 5 anos
Fachada de prédio da Amil Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo
Fachada de prédio da Amil Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo

RIO - Os novos controladores da APS (Assistência Personalizada à Saúde), que detém os planos individuais e familiares da Amil no país , afirmam querer dobrar a carteira da operadora atual de 330 mil beneficiários em dois anos, com o objetivo de, mais adiante, tornarem-se líderes nesse segmento no país. Os clientes, no entanto, já vêm se queixando do descredenciamento de clínicas e hospitais.

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A transação, que ainda depende de análise e aprovação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), prevê que a Fiord Capital e mais dois sócios assumam o controle da APS, recebendo aporte de R$ 2,4 bilhões da Amil, além de quatro hospitais.

O gigante americano UnitedHealth Group (UHG) se prepara para deixar o Brasil, segundo fontes próximas à companhia. O grupo comprou a Amil há dez anos, por quase R$ 10 bilhões.

— A operação prevê um aporte de R$ 2,4 bilhões de UHG/Amil. Perto de metade disso vai para constituição da reserva técnica (exigida pela legislação). O restante será usado para viabilizar o crescimento — explica Henning Von Koss, ex-executivo de operadoras como Hapvida, Medial e Amil, que participa da negociação, ao lado do Fiord.

Ele diz que, ao contrário do que vem sendo dito, a carteira de planos individuais e familiares da Amil não é deficitária:

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— Ela tem um faturamento de R$ 3 bilhões, com margem operacional de quase 10%. Essa carteira sai porque a Amil e o UHG não têm o mercado individual em seu DNA.

ANS aguarda informações

Enquanto isso, consumidores enfrentam problemas. Cliente da Amil há 24 anos, o aposentado Laércio Gonçalves, de 72, teme pelo futuro do seu plano de saúde, após superar três cânceres. O laboratório no qual sempre fazia seus exames foi descredenciado.

Aposentado Laércio Gonçalves, de 72 anos e cliente da Amil Foto: Arquivo pessoal
Aposentado Laércio Gonçalves, de 72 anos e cliente da Amil Foto: Arquivo pessoal

— Eu me senti desprezado, porque não se quebra um relacionamento de mais de 20 anos assim. Nunca atrasei nenhuma parcela, mas parece que isso não importa para eles — diz Gonçalves, que paga, para ele e sua mulher, R$ 2.470 por mês.

O advogado Thiago Moraes Gonçalves, especialista em seguros privados e planos de saúde, ressalta que é obrigação da operadora informar sobre descredenciamentos:

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— Eles acham que é suficiente só atualizar no site. O problema é que a maioria dos clientes da Amil é de idosos.

A nova empresa ainda esbarra na falta do aval da ANS. O presidente da agência, Paulo Rebello, afirmou que, até o fim da tarde de ontem, não havia recebido informações de Amil e APS sobre a operação:

— Nós nos reunimos com representantes da Amil na última terça-feira, mas eles não prestaram os devidos esclarecimentos sobre a transferência de controle da APS. Mencionaram a existência de investidores, sem juntar documentos solicitados. Sem termos as informações, interrompemos a transferência do controle.

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Os executivos garantem que a papelada está em mãos, que se trata apenas de burocracia.

Segundo Von Koss, as negociações tiveram início entre agosto e setembro, tendo havido concorrência com outros grupos e veículos de investimento. A aproximação veio por meio do economista Nikola Lukic, ex-executivo da Starboard, que atuava junto a negócios em dificuldades, como a Máquina de Vendas, dona da Ricardo Eletro.

O terceiro integrante do grupo é a Seferin & Coelho, holding da Rede de Hospitais e Centros Clínicos LifePlus. Cláudio Seferin e Daniel Coelho, ambos com mais de três décadas de experiência no setor, foram sócios da operadora LifeDay Saúde até o fim de 2020, quando foi vendida ao grupo GNDI, leia-se NotreDame Intermédica.

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Para garantir a manutenção da estrutura de operação da Amil na APS e o atendimento dos beneficiários, a negociação prevê duas medidas.

— A APS vai contratar a Amil para fazer o back office (gestão da operação) por um período de seis meses, que pode ser renovado por mais seis. E haverá manutenção da rede credenciada, tanto da Amil quanto de terceiros, por cinco anos — destaca Von Koss.

Foco nas classes B e C

A estratégia inicial do grupo é expandir a carteira da APS no mercado em que já está consolidada e com rede disponível, ou seja, São Paulo, Rio e Paraná. A meta é dobrar o número de usuários em dois anos. Segundo Von Koss, é a forma “mais simples, mais rápida e mais eficiente” de crescer:

— Nascemos uma empresa grande. Afora as Unimeds, quem vende planos individuais no Brasil hoje são Prevent Senior e Hapvida. Não tem mais ninguém nesse nicho, o que mostra uma distorção do mercado. Existe demanda.

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Com foco nas classes B e C, o objetivo é atrair novos usuários com produtos variados. Hoje a mensalidade média é de mil reais.

— A ideia é oferecer planos fechados em um grupo de municípios, estadual ou regional, com um grupo ou outro de hospitais, para o cliente escolher o que melhor cabe no bolso — diz Coelho.

E Von Koss admite que o salto para mais de 660 mil contratos vai exigir nova capitalização. Mas não está definido se será via oferta pública de ações ou investidor privado:

— Ficará a cargo do Fiord avaliar a melhor janela de oportunidade.