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Economia

Desoneração da folha dá 'estímulo para empresas manterem empregados e tirarem investimentos do papel', diz José Pastore

Para o professor da USP, projeto que prorroga regime para 17 setores precisa ser sancionado logo para não atrapalhar planejamento das empresas
O sociólogo e professor da USP José Pastore Foto: Adriana Lorete / Agência O Globo
O sociólogo e professor da USP José Pastore Foto: Adriana Lorete / Agência O Globo

RIO - Às vésperas do fim do ano legislativo, o Senado aprovou nesta quinta-feira a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos dos 17 setores que mais empregam no país.

Em entrevsita ao GLOBO, José Pastore, professor da FEA-USP e presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomercio-SP, diz que a aprovação da desoneração por mais dois anos é essencial para setores que são grandes empregadores .

No país, 17 setores que empregam 6 milhões de pessoas podem aderir ao modelo, por meio do qual é possível trocar a contribuição previdenciária de 20% sobre a folha pela alíquota de 1,5% a 4,5% do faturamento bruto.

Para Pastore, a incerteza em relação à medida afetava o planejamento das empresas. Veja os principais trechos da entrevista a seguir.

Qual a relevância da desoneração da folha para as empresas?

Essas empresas empregam muita gente, são muito intensivas em trabalho. É o caso, por exemplo, do call center. É basicamente tocado a trabalho (de pessoas), o equipamento é minoritário.

A construção civil também é muito intensiva em mão de obra. O setor de proteína animal, aqueles que estão desossando frango nos frigoríficos, aquilo é mão de obra pura.

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São setores que empregam muito e têm muito impacto no custo de vida. Você pega, por exemplo, o transporte urbano. Se você subir a passagem do ônibus, tem um impacto imenso na população e em toda a economia.

Pega o transporte de caminhão. Subiu o frete? Tem um impacto enorme no custo e na inflação. São setores críticos porque empregam muito e tem muitos gastos na inflação e custo de vida.

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Qual a vantagem para as empresas?

As empresas mudam de base de contribuição para a previdência. No lugar de recolher 20% sobre a folha, recolhem de 1,5% a 4,5% do faturamento bruto.

Isso dá uma redução de despesa significativa para as empresas. O que o governo decidiu fazer foi dar um estímulo para essas empresas manterem seus empregados e se possível expandirem o seu quadro de pessoal.

Isso é importante para o momento atual em que estamos, além desses fatores citados, no meio de uma pandemia. Se isso não fosse aprovado, as empresas abruptamente teriam uma elevação de despesas grande, que poderiam resultar em dispensa de pessoal.

Temporariamente, isso é uma boa solução que deveria ser estendida a todos os setores, mas depende de estudos mais aprofundados.

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Estamos na virada para 2022. Qual a importância para o planejamento das empresas a desoneração ser sancionada logo pelo presidente?

Já devia ter sido sancionada. O presidente anunciou que estava disposto a fazer a desoneração há mais de um mês.

As empresas se programam para o próximo ano com certa antecedência.

Isso deve estar dando muita aflição para empresas importantes que tem uma massa grande de trabalhadores e que se vê na iminência de enfrentar uma despesa inesperada de maneira abrupta.

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(A desoneração) É crucial para esses setores. Ela alivia as despesas com folha do salário, mantém o emprego e ajuda os negócios, permitindo a eles expandirem e contratarem mais empregados.

O setor de serviços, que está indo bem porque as famílias estão voltando a demandar, é o que mais contrata, com 65% da mão de obra empregada no setor.

Isso abre caminho para investimentos?

Elas (as empresas) podem se planejar e tendo uma economia nas despesas do trabalho, elas podem tirar investimentos do papel. Nesse momento da economia, ajuda. A gente espera que não haja nenhum fator negativo pra anular isso.

O país já lida com o desemprego elevado. Se a prorrogação da desoneração não fosse aprovada, haveria riscos para muitos desses empregos formais, com pressões sobre o mercado de trabalho?

Nós já estamos com uma taxa (de desemprego) muito alta e seria lamentável. Essas empresas têm uma composição de força de trabalho muito variada, com alto nível de qualificação.

Mas tem uma grande parte com pessoas muito simples que, se perderem o emprego, vão cair na informalidade na melhor das hipóteses. É bem provável que caia no desemprego.

No ano que vem, seria bom se o Congresso reivindicasse resolver essa questão do excesso de tributação na folha dos salários para todos os setores porque o Brasil tributa muito o trabalho.

Se você pegar todos os encargos sociais examinando de maneira fina, eles somam 102% da folha de salário. É muito grande, uma das maiores do mundo.

O Brasil precisava levar a sério (esse assunto) e encontrar uma maneira de desonerar todos os setores.