Economia

Ao indicar mudança na política de preços da Petrobras, Bolsonaro afeta ações da estatal e o dólar. Entenda por quê

Declaração zera ganhos dos papéis da petroleira na Bolsa e impulsiona alta do dólar com reforço na percepção de intervenção na companhia
Ata de reunião monetária do Fed e discussão sobre o Orçamento para 2021 são observadas pelos investidores. Foto: Cris Faga / Agência O Globo
Ata de reunião monetária do Fed e discussão sobre o Orçamento para 2021 são observadas pelos investidores. Foto: Cris Faga / Agência O Globo

RIO — O dólar fechou em alta frente ao real nesta quarta-feira, um dia em que a moeda apresentou volatilidade durante todo o dia. Terminou negociada a R$ 5,64, alta de 0,74%.

A divisa americana se valorizou na reta final do pregão, após a divulgação da ata do Fed, o banco central americano, e da fala do presidente Jair Bolsonaro sobre o recente aumento do gás anunciado pela Petrobras.

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Bolsonaro indicou que a política de preços da estatal pode mudar com a troca de comando que determinou na companhia, reforçando a percepção no mercado de intervenção. Com isso, as ações da estatal praticamente zeraram os ganhos no dia.

As ações ordinárias da Petrobras (PETR3, com direito a voto) subiram 0,46%. Já as preferenciais (PETR4, sem direito a voto), caíram 0,08%.

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O Ibovespa, principal índice da Bolsa de São Paulo, a B3, também foi afetado e terminou um dia de instabilidade com leve alta de 0,11%, aos 117.624 pontos.

Bolsonaro reforça percepção de intervenção

A declaração de Bolsonaro sobre o reajuste nos preços do gás natural também estressou os investidores e influenciou no desempenho dos papéis da Petrobras, que chegaram a ter altas maiores do que os resultados do fechamento.

Jair Bolsonaro compareceu à posse do novo presidente da Itaipu Binacional, João Francisco Ferreira Foto: TV Brasil/ Divulgação
Jair Bolsonaro compareceu à posse do novo presidente da Itaipu Binacional, João Francisco Ferreira Foto: TV Brasil/ Divulgação

Durante visita a Foz do Iguaçu (PR), o presidente chegou a cogitar uma possível mudança na política de preços, ao afirmar que "podemos mudar essa política de preços lá".

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— A fala de Bolsonaro sobre uma possibilidade da mudança de preços da Petrobras gerou estresse para os papéis da estatal. O que ajudou a segurar a Bolsa em pontos foram as altas da Vale e Eletrobrás — afirmou Paloma Brum, analista da Toro Investimentos.

Também influenciou a alta do dólar, segundo analistas, o cenário interno em que as atenções seguem voltadas para o combate à pandemia, um dia após o país ter registrado número recorde de mortes, e para as discussões sobre o Orçamento de 2021.

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A divisa vinha sofrendo uma correção dos lucros obtidos na semana passada, quando chegou a passar dos R$ 5,80, tendência que perdeu força.

Edifício-sede da Petrobras, no Centro do Rio Foto: Ricardo Moraes / Reuters
Edifício-sede da Petrobras, no Centro do Rio Foto: Ricardo Moraes / Reuters

Na avaliação do economista-chefe da Órama, Alexandre Espírito Santo, o real seguirá sensível por conta dos problemas fiscais e o recrudescimento da pandemia no país, havendo pouco espaço para quedas bruscas do dólar.

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— A mudança na postura do Banco Central, com a alta da Selic, até colabora, mas acredito que não há espaço para quedas nesse momento. Creio que entre R$5,50 e R$5,60 seja um bom preço para o quadro atual — explica.

Sinalização do Fed

A ata da última reunião do Fed mostrou que o banco permanece cauteloso com os riscos da pandemia, mesmo com a recuperação apresentada pela economia americana.

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“Os participantes concordaram que a economia permanece longe dos objetivos de longo prazo (do Fed) e que a trajetória à frente continua altamente incerta", mostrou o documento.

A ata destaca que levará algum tempo até que as condições melhorem de forma suficiente para que o Fed avalie uma redução do seu apoio à economia.

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Na reunião de março, o Fed não fez mudanças em sua taxa de juros, que está próxima de zero, nem no ritmo de 120 bilhões de dólares em compras mensais de títulos. Os membros ainda acreditam que deve levar algum tempo para que as metas de emprego e inflação da instituição sejam atingidas.

"A maioria dos participantes notou que considerava os riscos para as perspectivas para a inflação amplamente equilibrados", indicou o comunicado, ressaltando que a inflação pode aumentar neste ano devido à escassez de materiais, mão de obra, bem como gargalos no transporte marítimo.

Segundo a ata, a inflação foi projetada para ficar um pouco abaixo de 2% no próximo ano e, em seguida, atingir a marca em 2023.

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O Fed já havia demonstrado certa tolerância com uma possível inflação a longo prazo, mesmo que um pouco acima da meta de 2%, e com o aumento de gastos por parte do governo.

Para o analista da Órama, a política monetária expansionista do Fed, combinando juros baixos com gastos altos, preocupa os analistas pelo possível aumento da inflação. No entanto, ele destaca que a defesa da política do banco presente na ata já era esperada pelo mercado.

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— A combinação dos gastos altos na pandemia com juros baixos preocupa os analistas, pois não podemos descartar que a inflação pode aparecer num horizonte não muito distante. Acredito que essa preocupação demonstra uma desconfiança do mercado em relação ao BC.

Impasse do Orçamento e jantar

As discussões para resolver o impasse criado no Orçamento de 2021 devem seguir no radar dos investidores até a sanção do texto pelo presidente Bolsonaro.

Nesta semana, as negociações parecem caminhar para uma solução, o que pode melhorar o humor dos investidores, sobretudo, se houver uma sinalização no texto final de respeito ao teto de gastos, com a retirada de recursos para emendas parlamentares.

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Em parecer técnico, o Tribunal de Contas da União (TCU) afirmou que precisa de mais informações para analisar as falhas no Orçamento aprovado pelo Congresso.

No documento, a área técnica da Corte aponta problemas no projeto e pede que o Ministério da Economia e a Casa Civil se posicionem oficialmente sobre a proposta, levando-se em consideração as normas fiscais vigentes.

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Na terça-feira, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, afirmou que o impasse envolvendo o Orçamento criou "incerteza" para a economia.

— O Orçamento é crucial. As especulações de que as conversas políticas estão prosperando ajudam a Bolsa. Todavia, o volume dos últimos dias vem sendo relativamente baixo, o que pode sinalizar que está havendo muito giro e menos posições — afirma o analista da Órama.

Bolsonaro, por sua vez, deve comparecer a um jantar , nesta quarta-feira, para tentar se reaproximar com uma parte de empresários. A expectativa é que sejam tratados temas como a vacinação, inclusive pelo setor privado, e a, paralisada, agenda de reformas econômicas.

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Na B3, Vale sobe, bancos descem

As ordinárias da Vale (VALE3) tiveram alta de 2,46%, contribuindo para a alta da Bolsa.

Os bancos, por outro lado, terminaram com sinal negativo. As preferenciais do Bradesco (BBDC4) e do Itaú (ITUB4) caíram 1,09% e 0,88%, respectivamente, após terem registrado tombos maiores.

As ordinárias da CCR (CCRO3) cederam 1,82%, mesmo com a conquista de dois de três blocos no leilão de aeroportos , promovido pelo governo.

Bolsas no exterior

Nos Estados Unidos, os mercados registram pequenas altas. O índice Dow Jones subiu 0,05%, ao passo que o S&P teve alta de 0,15%. Já Nasdaq cedeu 0,07%.

As bolas europeias fecharam em baixa, após uma terça-feira positiva. A Bolsa de Londres teve alta de 0,91%, ao passo que o índice CAC 40, da Bolsa de Paris teve leve baixa de 0,01%. Em Frankfurt, a queda foi de 0,24%.

Na Ásia, as bolsas fecharam sem direção única. O índice Nikkei, da Bolsa de Tóquio, encerrou em alta de 0,12%. As bolsas de Hong Kong e China caíram a 0,91% e 0,10%, respectivamente.