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Economia Investimentos

Dólar é porto seguro, mas pode não ser a melhor opção

Fundos cambiais têm ganho de 24% no ano. Especialistas, porém, ressaltam que aplicação só é indicada a quem precisa de proteção
Investimento em dólar serve para quem tem obrigações atreladas à moeda Foto: Pixabay
Investimento em dólar serve para quem tem obrigações atreladas à moeda Foto: Pixabay

SÃO PAULO - Num cenário dominado pelo pânico nos mercados devido aos prejuízos que a pandemia do coronavírus pode causar na economia global, a Bolsa de Valores brasileira sofreu uma venda de ações maciça , o que levou as empresas a perderem mais de R$ 1,7 trilhão em valor de mercado este ano.

Nem aplicações consideradas seguras, como a renda fixa , escaparam. E o dólar, que se tornou o principal porto seguro na atual crise, nem sempre é a melhor indicação para o investidor pessoa física.

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George Wachsmann, chefe de gestão e sócio da gestora de recursos Vítreo, ressalta que os fundos cambiais, aplicações que acompanham de perto a variação da moeda americana, são instrumentos de proteção para quem tem compromissos em dólar. Pode ser um filho estudando no exterior, uma viagem internacional ou a compra de produtos cotados na moeda americana. Esses fundos oferecem proteção a quem corre risco cambial, mas não são 100% seguros.

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— Se a moeda americana voltar a R$ 3,80, quem entrou em um fundo cambial com uma cotação acima desta vai perder. Na crise, esse instrumento de proteção é bom, já que a moeda sobe. Mas, quando a situação se normalizar, pode não ser assim. Portanto, talvez não faça sentido aplicar nesse produto se a pessoa não está correndo algum risco cambial efetivo — explica o gestor da Vítreo, que acaba de lançar um fundo da categoria, que aplica os recursos em contratos futuros de dólar, com taxa de administração de 0,07% ao ano e investimento mínimo de R$ 1 mil.

‘É utopia tentar ganhar’

A oscilação do dólar, que acumula valorização de 25% no ano, é provocada por grandes investidores, que fazem operações no chamado mercado futuro, explica o consultor de investimentos Paulo Bittencourt. Portanto, não é o movimento de compra de moeda nas casas de câmbio pelos brasileiros que fez o dólar comercial superar os R$ 5.

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— É uma utopia tentar ganhar com o dólar. O pequeno aplicador sempre vai entrar atrasado — diz Bittencourt.

Fundos cambiais deram retorno de quase 25% no ano Foto: Editoria de Arte
Fundos cambiais deram retorno de quase 25% no ano Foto: Editoria de Arte

Segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), até 16 de março, os fundos cambiais acumulavam no ano rendimento de 24,69%. Só este mês subiram 11,07%. É uma valorização muito superior à dos fundos de renda fixa, que aplicam em títulos do governo, cujo rendimento no ano é de 0,77%. Já os fundos de ações livre têm perdas de 33,78%.

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Ainda assim, o levantamento mostra que os fundos cambiais têm um patrimônio de apenas R$ 4,6 bilhões, contra R$ 2,1 trilhões nos de renda fixa. Os fundos de ações, mesmo com todas as perdas, têm R$ 489 bilhões, e os chamados multimercados (que aplicam em ações, moedas, juros) têm patrimônio de R$ 1,2 trilhão.

Neste mês, de maior turbulência, os fundos cambiais captaram apenas R$ 568 milhões, frente a R$ 2 bilhões dos de renda fixa e R$ 3,9 bilhões dos de ações. Já os multimercados registram saques de R$ 1,8 bilhão.

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No caso da renda fixa, dos 15 tipos classificados pela Anbima, oito tinham rentabilidade negativa até 16 de março — em alguns, a queda superava os 3%. Nos últimos 12 meses, porém, todos têm rentabilidade positiva. Esses papéis também são negociados no chamado mercado secundário, e seu valor oscila.

— Como ninguém sabe o que vai acontecer com a economia nos próximos meses, a expectativa de juros futuros sobe, mesmo com o BC reduzindo a Selic. Quando os juros futuros sobem, o preço dos títulos acaba caindo, porque eles perdem valor no mercado — esclarece Francisco Levy, especialista em planejamento financeiro da Allea WM.

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Levy orienta que não se deve sair da aplicação neste momento, porque o título terá de ser vendido no mercado com valor menor.

Ouro em baixa

Até mesmo o ouro, outro ativo visto como seguro em tempos de crise, que é oferecido por meio de fundos ou em barras, acabou perdendo valor recentemente. A onça-troy (31,1g) encerrou 2019 valendo US$ 1.515, com valorização de 18% no ano. Na sexta-feira, acumulava recuo de 1,12%.

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Um dos motivos dessa queda, dizem especialistas, é que os investidores estão vendendo tudo em busca de liquidez.

— Outra explicação é que o ouro é uma commodity usada em eletreletrônicos. Como a indústria terá um impacto muito forte, a expectativa é que o metal perca valor — diz Bittencourt.