Economia Emprego

Governo promete regular trabalho por plataformas, sem vínculo empregatício, ainda este ano

José Carlos Oliveira, novo ministro do Trabalho, confirmou linhas gerais da proposta que havia sido antecipada pelo GLOBO, como obrigatoriedade do recolhimento de trabalhdores pelas empresas
Rappi lança ferramenta para delivery de medicamentos com receita digital controlada Foto: Guito Moreto/Agência O Globo
Rappi lança ferramenta para delivery de medicamentos com receita digital controlada Foto: Guito Moreto/Agência O Globo

BRASÍLIA — O novo ministro do Trabalho e Previdência, José Carlos Oliveira, confirmou nesta quarta-feira que o governo pretende regulamentar ainda este ano o serviço prestado por trabalhadores vinculados às  plataformas de aplicativo, como Uber e iFood. A proposta vai deixar claro que esses trabalhadores não têm vínculo empregatício. Por outro lado, eles terão que recolher para a Previdência Social de forma obrigatória, conforme antecipou O GLOBO .

— Tem um desenho adiantado — disse o ministro, acrescentando que ainda falta conciliar interesses para anunciar a proposta ainda este ano.

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As plataformas também terão que recolher a contribuição patronal para a Previdência, como ocorre com as demais empresas. A principio, as novas regras devem abranger apenas serviços de entrega e transporte e poderão ser diferenciadas por categoria de trabalhadores. Novas modalidades poderão ser enquadradas no futuro.

Serviços próprios de logística de entrega como do Mercado Livre e Magazine Luiza, por exemplo, deverão ficar de fora das novas regras.

Segundo o ministro, o governo ainda avalia se fará as mudanças por medida provisória (MP), com vigência imediata, ou se vai enviar enviar um projeto de lei ao Congresso.

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Regras

Em 30 de março, O GLOBO antecipou que a ideia do governo é deixar clara a não existência de vínculo empregatício, um dos principais temores das empresas. Por isso, esses trabalhadores seriam enquadrados na modalidade de prestador de serviço.

O sistema funcionaria na prática como o existente para os prestadores de serviço enquadrados como pessoa física: as empresas fazem o desconto na fonte e recolhem mensalmente para o INSS a contribuição do trabalhador e a patronal, que deve ser inferior aos 20% cobrados dos empregadores. Tudo seria feito pelo eSocial.

Em compensação, esses trabalhadores teriam direito à cobertura previdenciária. Inicialmente, o governo trabalhava com a possibilidade de enquadrar os trabalhadores em aplicativos no MEI, mas diante da alta inadimplência do regime, optou pelo desconto na fonte.

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A proposta também exige que as empresas deem suporte aos trabalhadores, oferecendo, por exemplo uma estrutura física de apoio, para carregar celular, beber água e um espaço onde possa se alimentar, por exemplo.

Segundo técnicos a par das discussões, as plataformas farão uma retenção “baixa” dos trabalhadores na fonte, um percentual sobre o serviço prestado e recolherão para a Previdência o valor descontado mais a parte patronal que deve ficar inferior a 20%.

Além disso, os trabalhadores por aplicativos que optaram pelo  regime do Microempreendedor Individual (MEI) e recolhem 5% sobre o salário mínimo, deverão migrar para o novo modelo.

Menos de R$ 5,50 por hora

Pesquisa recente aponta que trabalhador de plataforma digital ganha menos de R$ 5,50 por hora e se queixa de não ter acesso a água potável e banheiro. Também não têm proteção contra acidentes, seguro de vida ou saúde e não têm contratos de trabalho justo.

Atualmente, existem três planos para o trabalhador que é contribuinte individual, ou seja, que pode ser adotado por estes trabalhadores de aplicativos: completo, em que o trabalhador recolhe para o INSS 20% sobre o salário mínimo ou mais e pode ter direito à aposentadoria acima do piso nacional e por tempo de contribuição, além de outros benefícios; o modelo simplificado com alíquota fixa de 11% sobre o salário mínimo e o Microempreendedor Individual (MEI), de 5% sobre o salário mínimo.

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Esses regimes asseguram aposentadoria por idade equivalente ao mínimo e demais benefícios, como auxílio doença e pensão por morte.

Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), existe 1,4 milhão de motoristas e entregadores vinculados às plataformas. Representantes das empresas confirmam que o plano do governo é a retenção da contribuição previdenciária dos trabalhadores na fonte, mas evitam se posicionar por considerar o tema polêmico.

Prazos

Ao ser indagado se a proposta será anunciada oficialmente antes das eleições em outubro, o ministro respondeu que a qualquer momento. Assim que for possível encontrar um ponto de equilibrio para não prejudicar esse modelo de negócios, disse o ministro, durante café da manhã com jornalistas, nesta quarta-feira.

Ele destacou que a regulamentação dos serviços por aplicativos é um desafio não só do Brasil, mas de vários países.

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O secretário-executivo do Ministério, Bruno Dalcomo, explicou que o governo não pretende fazer uma legislação pesada e que vai levar em conta interesse da população, das plataformas e dos próprios trabalhadores. Se o custo subir muito, cidades do interior poderão ficar sem o serviço de aplicativo de transporte, destacou.

Ele disse não ver problemas na cobrança obrigatória para a Previdência:

— Todos terão que ceder um pouquinho. Os trabalhadores não se importam em fazer a contribuição se entenderam que haverá benefícios (cobertura previdenciária) — disse Dalcomo.

Detalhes sobre as alíquotas previdenciárias não foram divulgados. Mas a previsão que os trabalhadores possam optar por um recolhimento acima do salário mínimo para ter direito a um benefício maior.

Em nota, a A Associação Brasileira Online to Offline (ABO2O), que reúne algumas das plataformas, informou em nota que "a regulamentação do futuro trabalho focada em motoristas e entregadores de aplicativos, entendemos que qualquer proposta deve compreender muito mais do que os aspectos previdenciários, já que as manifestações recentes desses profissionais incluem uma pauta prioritária que não se relaciona com esse tema", afirma a entidade.

"Como representante das empresas, estamos em contato com as principais lideranças desses segmentos, como sindicatos e associações, para chegarmos em um consenso. Ressaltamos também que o Brasil possui suas especificidades e não podemos cair no erro de adotar soluções de outros países, com contextos diferentes dos nossos, para tratar do assunto", diz o documento.