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Home office vai continuar após pandemia. E quem ganha quando empresas podem contratar em qualquer lugar?

A competição entre trabalhadores remotos vai aumentar. E também a desigualdade de renda no mercado de trabalho, apontam estudos
Modelo de home office funcionará em conjunto com o presencial no futuro Foto: Pixabay

NOVA YORK - Alguns empregados e freelancers que podem trabalhar remotamente têm expandido oportunidades de trabalho e de aumentar sua renda com a adoção em maior escala do home office pelas empresas durante a pandemia.

Mas, se o trabalho remoto veio para ficar mesmo depois da pandemia, os profissionais que podem atuar à distância terão, em geral, mais competição daqui para frente. E dependerão mais da sorte.

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Uma coisa que parece inevitável, sugerem as pequisas, é a intensificação da desigualdade. No seu artigo de 1981 entitulado “The Economics of Superstars” (“A economia dos superastros”, em tradução livre), Sherwin Rosen descreveu o impacto do videotape e da transmissão ao vivo na TV na renda de atletas e artistas.

Na medida em que a tecnologia permitiu a indivíduos com habilidades especiais alcançar um mercado gigante — uma hora de trabalho em um único lugar poderia, de repente, atingir muitas pessoas ao mesmo tempo no país —, menos astros foram capazes de capturar as recompensas financeiras. O dinheiro se concentrou em poucos.

Mark Zuckerberg aumentou em US$ 8,1 bilhões sua fortuna somente nesta quinta-feira, com a força dos resultados do primeiro trimestre do Facebook. Foto: Stephen Lam / Reuters
O fundador da Amazon, Jeff Bezos, o homem mais rico do mundo, ficou US$ 11,7 bilhões mais rico este ano Foto: ALESSANDRO DI MARCO / ANSA
Larry Page, do Google, adicionou US$ 26,6 bilhões este ano depois que a empresa sediada na Califórnia registrou lucro recorde no ano passado Foto: Eduardo Munoz / Reuters
Elon Musk, cofundador da Tesla, teve a fortuna aumentada US$ 5,1 bilhões desde janeiro Foto: Bloomberg
Bilionário do setor financeiro Warren Buffet também está na lista dos americanos que aumentaram suas riquezas este ano: ganho com ações Foto: AFP

Rosen esperava que, ao longo do tempo, muitas outras profissões seguiriam um padrão similar. A renda de um professor, por exemplo, esteve tradicionalmente limitada ao número de estudantes que ele poderia juntar dentro de uma sala de aulas.

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Mas hoje, na Udemy, uma plataforma on-line de educação, professores como Chris Haroun têm ganhado milhões de dólares de cursos criados pela empresa, particularmente depois que a quarentena imposta pela pandemia elevou as matrículas em 425%.

A vasta maioria dos professores na Udemi não se aproxima dos ganhos de Haroun, o que resulta em uma distribuição extremamente desigual da renda entre professores considerados “superastros” e todos os demais. 

Fundada em 2012 como uma plataforma para motoristas de táxi, depois aberta para autônomos, a 99 se tornou o primeiro unicórnio brasileiro em janeiro de 2018, após ser adquirida pela chinesa Didi Chuxing em negócio avaliado em US$ 1 bilhão. Foto: REUTERS/Paulo Whitaker
O banco digital Nubank cresceu rapidamente tendo um cartão de crédito solicitado por aplicativo no celular como cartão de visitas. Já vale mais de US$ 30 bi e chamou a atenção recentemente ao receber aporte de US$ 500 milhões do bilionário americano Warren Buffett, e outros US$ 250 milhões da americana Sands Capital com Verde Asset e Absoluto Partners. Foto: Urbano Erbiste / Agência O Globo
A Stone ganhou destaque por desbravar o mercado de máquinas de cartões antes dominado por gigantes e conquistar o seu espaço. Porém, sua classificação como unicórnio é controversa, pois alcançou a marca de US$ 1 bilhão em valor de mercado após seu IPO, em outubro de 2018. Algumas listas a deixam de fora, por considerarem unicórnios apenas empresas de capital fechado. Foto: Agência O Globo
A Loggi transformou o mercado de courrier, colocando os clientes que desejam entregar objetos em contato direto com os motoboys. Foi dessa forma que a empresa fundada no Brasil pelo francês Fabien Mendez conseguiu investimento de US$ 150 milhões do SoftBank em junho do ano passado, conquistando o título de unicórnio. Foto: WILLIAN MOREIRA / Agência O Globo
A Gympass funciona como um Spotify do exercício físico. Por uma assinatura mensal, os usuários têm acesso a uma rede de milhares de academias parceiras. O modelo chamou a atenção de investidores, que aportaram US$ 300 milhões na companhia em junho de 2019, transformando-a em mais um unicórnio brasileiro. Foto: Divulgação
O QuintoAndar nasceu em 2013 com a missão de desburocratizar os aluguéis de imóveis no país. Para os inquilinos, nada de fiador ou caução; e aos proprietários a garantia do pagamento na data estipulada, mesmo que o locatário atrase. Em setembro do ano passado, recebeu aporte de US$ 250 milhões e superou os US$ 1 bilhão em valor. Foto: Divulgação
Com sede em Curitiba, a Ebanx realiza o processamento de pagamentos em reais para empresas estrangeiras, como Spotify e Airbnb. Em outubro do ano passado recebeu investimento do fundo de private equity FTV, se tornando primeiro unicórnio da Região Sul do país. Foto: REUTERS/Steve Marcus
Criado em 2011 para facilitar o pedido de entrega de comida em restaurantes, o iFood se tornou unicórnio em novembro de 2018, após receber aporte de US$ 500 milhões. O serviço ganhou importância durante a pandemia, mas também críticas pela situação dos entregadores. Foto: Divulgação
A segunda startup a se tornar unicórnio no ano foi a da holding 2TM, o Mercado Bitcoin. É o primeiro unicórnio do segmento de criptoativos no Brasil, com valor de mercado avaliado em US$ 2,1 bilhões. O feito ocorreu após a empresa receber um investimento de US$ 200 milhões do Softbank. Foto: Divulgação
A carioca VTEX oferece serviços que estão por trás dos sites de comércio eletrônico, ajudando os varejistas a converterem vendas. Com o aporte recebido nesta semana, se tornou o 11º unicórnio brasileiro. Foto: CJPress / Agência O Globo
O negócio da Loft é comprar, reformar e revender imóveis, mas na escala dos negócios digitais. Apenas no ano passado foram mais de mil apartamentos residenciais negociados. Fundada em 2018, levou menos de dois anos para se tornar unicórnio, alcançando o posto em janeiro deste ano. Foto: Loft/Facebook
A primeira do ano a integrar o grupo de unicórnios do ano foi a curitibana MadeiraMadeira. Após receber um investimento de US$ 190 milhões, a empresa atingiu valor de mercado de US$ 1 bilhão. O aporte foi liderado pelo fundo Softbank, além dos gestores Dynamo, Flybridge e Monashees. Na foto, Marcelo Scandian, Daniel Scandian e Robson Privado, da MadeiraMadeira. Foto: MadeiraMadeira/Divulgação

A adoção do trabalho remoto está também afetando instituições mais tradicionais. Scott Galloway, um professor de marketing da Escola de Negócios Stern, da Universidade de Nova York, me disse em abril:

— Já que todas as minhas aulas são remotas agora, a escola me perguntou: você pode aumentar o seu número de estudantes de 160 (capacidade da maior sala de aula da instituição) para 280? Ou seja, são 120 alunos a menos para os outros professores de marketing.

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Uma dinâmica similar pode ser vista em profissões que eram assumidas como inerentes ao contato “em pessoa”. Durante a quarentena, muitos instrutores de ginástica, como personal trainners, ficaram sem trabalhar. Mas um seleto grupo deles estava deslanchando, particularmente os que trabalhavam para a Peloton.

Americana faz exercícios comandados por instrutora na plataforma digital Foto: MAX WHITTAKER / NYT/27-2-2021

No fim de 2020, a plataforma de esportes tinha cerca de 4 milhões de membros — mesmo número de frequentadores de academias em Nova York. Mas ao contrário da indústria fitness do estado americano onde está a cidade, a Peloton não tinha 86 mil empregados ali.

Os milhares de clientes da companhia eram atendidos por algunas dúzias de instrutores que poderiam morar em qualquer lugar. Eles ganharam mais de US$ 500 mil (cerca de R$ 2,6 milhões) enquanto a maioria dos profissionais dessa área estava sem poder trabalhar.

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Quando um mercado se expande, os benefícios tendem a não ser divididos de forma igualitária entre os participantes. Ainda em 1995, os economistas Robert Frank and Philip Cook observaram que as estruturas de remuneração antes comuns no setor de entretenimento estavam ficando mais prevalentes em uma varidade de outras profissões.

Alguns advogados, médicos, consultores, banqueiros e gerentes estavam ganhando mais do que nunca, enquanto poucos dos seus colegas estavam ocupados em empregos de renda média.

Anitta entre David Vélez e Cristina Junqueira, cofundadores do Nubank. Cantora tem cadeira no Conselho de Administração do Nubank Foto: Divulgação
Taís Araújo se tornou embaixadora do Banco Votorantim (BV). Atriz irá participar da cocriação de produtos e serviços Foto: Divulgação
A atriz Marina Ruy Barbosa se tornou embaixadora do Banco Safra Foto: Reprodução
A apresentadora e humorista Tatá Werneck se tornou embaixadora do Next, banco digital do grupo Bradesco Foto: Divulgação
A jogadora Marta se tornou líder de diversidade e inclusão do grupo LATAM Foto: Divulgação

Os dois economistas atribuíram essas mudanças à “revolução no processamento e transmissão de informação”, que permite “um nível de crescente de alavancagem parar os que ocupavam posições no topo das empresas e proporcionalmente menos espaço para os outros”.

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Essa tendência se mantém no século 21. De acordo com um estudo de 2020 dos economistas David Autor, Claudia Goldin and Lawrence Katz, a maior parte do aumento na desigualdade nas últimas duas décadas ocorreu dentro e não entre grupos de profissionais mais escolarizados.

A tecnologia contribuiu para esse aumento da desigualdade entre quem estudou na mesma faculdade, por exemplo, ao permitir que as companhias possam produzir mais e alcançar mais clientes dependendo de menos — mas mais especializados — profissionais.

CEO da Tesla e SpaceX se muda para casa com estilo minimalista e sem espaço para luxos Foto: Reprodução/Boxabl
Casa pré-fabricada é chamada e Casita e possui sala, quarto, cozinha e banheiro Foto: Reprodução/Boxabl
Bilionário optou por se mudar com a sua esposa, a cantora Grimes, e seu filho mais novo,  X Æ A-XII, para um pequeno lar Foto: Reprodução/Boxabl
Casa de Elon Musk é pre-moldada e tem apenas 37m² Foto: Reprodução
Módulo fica dentro das instalações de teste da SpaceX, no sul do Texas, nos Estados Unidos, onde está sendo construído o foguete gigante “Super Heavy” de Musk Foto: Reprodução/Boxabl
De acordo com informações do site Teslarati, casa pré-moldada de Musk é tão leve que pode ser rebocada por um Tesla Model X Foto: Reprodução/Boxabl

O impacto da tecnologia em várias profissões ainda era limitado pela geografia. Quando a maioria das companhias contratava apenas empregados que viviam a uma distância possível para ir e voltar em transporte público, o mercado de trabalho tinha um teto para as opções do empregador e para a capacidade de ganhar mais dos empregados.

Também colocou um piso parra os outros profissionais que gozavam de um salário decente e relativa segurança no emprego por viver perto de um centro financeiro ou distrito industrial. Esses limites geográficos foram afrouxados aogra, quando o Vale do Silício e outras indústrias e setores estão se engajando no trabalho remoto — gradualmente.

Recentemente a revista The Economist analizou os anúncios de emprego em um site popular entre programadores e econtrou menções a trabalho remoto em 75% deles em 2021, contra 35% antes da pandemia e 19% há uma década.

A Kia exibe o SUV elétrico EV6 Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Tomada de recarga do SUV elétrico Kia EV6 Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Chassi do SUV elétrico Kia EV6 Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Jeep Wrangler Rubicon com o Pacote Xtreme Recon Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Veículo utilitário esportivo (SUV) elétrico Volkswagen ID4 2022 durante a prévia do Chicago Auto Show em Chicago, Illinois, EUA Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
O volante do veículo utilitário esportivo (SUV) Volkswagen ID.4 2022 Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
O esportivo japonês Toyota Supra Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
O esportivo japonês Toyota Supra Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Lanterna do SUV Toyota Corolla Cross Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
O SUV Toyota Corolla Cross Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
O SUV Toyota Corolla Cross Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Picape elétrica Ford Motor F150 Lightening Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Utilitário esportivo (SUV) Ford Motor Bronco Sport Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Utilitário esportivo (SUV) Ford Motor Bronco Sport Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Utilitário esportivo (SUV) Ford Motor Bronco Sport Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Utilitário esportivo (SUV) Ford Motor Bronco + Filson Fire Rig Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
SUV elétrico Nissan Ariya 2022 Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
SUV elétrico Nissan Ariya 2022 Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
SUV Nissan Pathfinder Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Esportivo conceito Nissan Z Foto: Christopher Dilts / Bloomberg
Picape Fiat Chrysler Dodge Ram TRX Foto: Christopher Dilts / Bloomberg

Como isso vai afetar o trabalhador da área de tecnologia? Há algumas indicações. Em junho, o Google informou altos funcionários que reduziria o salário dos que escolhessem trabalhar remotamente. Evitar o escritório ajuda a economizar com transporte.

Mas para a maior parte dos profissionais de tecnologia, o trabalho remoto significa competir em um mercado muito maior de profisisonais igualmente qualificados, mas muitos deles em países e cidades de baixa renda.

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Isso deveria preocupar os engenheiros, programadores e gerentes de produto mais disputados do mercado? Provavelmente não. Para eles, trabalhar remotamente significará competir pelos empregos mais bem pagos de um um número maior de companhias.

Mas até mesmo os altamente qualificados e especializados empregados têm algo com o que se preocupar. Como apontou Enrico Moretti em “The New Geography of Jobs” (“A nova geografia dos empregos”), contratar é muito semelhante a paquerar em aplicativos de namoro.

Acessar os candidatos de maior potencial em um universo de pessoas bem maior aumenta a chance de “match”.

Jeff Bezos, fundador da Amazon, anunciou que deixará a direção da empresa no segundo semestre. Sua fortuna calculada é de US$ 177 bilhões Foto: Jim Watson / AFP
O empresário Elon Musk, fundador da Tesla, voltou à segunda colocação no ranking e agora tem uma fortuna de US$ 151 bilhões Foto: Brian Snyder / Reuters
O empresário francês Bernard Arnault, presidente e diretor executivo da LVMH, maior empresa de artigos de luxo do mundo, ocupa o terceiro posto da lista, com uma fortuna de US$150 bilhões Foto: Balint Porneczi / Bloomberg
Bill Gates, fundador da Microsoft, tem fortuna de US$ 124 bilhões Foto: SAMUEL CORUM / Agência O Globo
Mark Zuckerberg, fundador do Facebook, acumula fortuna de US$ 97 bilhões Foto: ANDREW CABALLERO-REYNOLDS / AFP