Economia Petrobras

Entenda o que são os contratos de opções de ações que fizeram investidores lucrarem com queda dos papéis da Petrobras

Mecanismo usado para proteção, pode servir como instrumento de especulação no mercado financeiro
Painel da B3 mostrava a queda das ações da Petrobras , após declaracoes do presidente Bolsonaro sobre a troca de comando na companhia Foto: Marco Ankosqui/22-02-2021
Painel da B3 mostrava a queda das ações da Petrobras , após declaracoes do presidente Bolsonaro sobre a troca de comando na companhia Foto: Marco Ankosqui/22-02-2021

SÃO PAULO — Investidores com opções  de venda de ações da Petrobras podem ter lucrado cerca de R$ 18 milhões com a queda dos papéis da companhia, na última semana, em operações atípicas, que sugerem o uso de informação privilegiada, informou a colunista Malu Gaspar .

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Os contratos de opções fazem parte de um rol de mecanismos que quem se aventura no mercado de renda variável dispõe para se proteger das oscilações de preços. Muitas vezes, ele pode usar esses mesmos instrumentos para especular sobre a valorização ou desvalorização de um ativo e ganhar (ou perder) dinheiro no curto prazo.

Eles funcionam como seguro ou alavanca de movimentos mais arriscados.

Quem tem um contrato de opção tem o direito de comprar ou de vender um ativo, como a ação de uma empresa negociada na Bolsa, por um valor pré-determinado (que é chamado de strike price ) em uma data específica do futuro.

É uma operação que acontece no chamado mercado de derivativos, em que o valor dos contratos deriva de um ativo. O leque de derivativos é amplo: além de ações, há contratos baseado em taxas de juros, na cotação do petróleo, na variação do dólar, entre outros.

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— Esse é um instrumento que permite a especulação no mercado financeiro. Permite que haja alavancagem, ou seja, o investidor pode aplicar um valor maior do que ele tem. Mas isso exige uma margem de garantia, o que significa que você precisa sinalizar que, caso haja prejuízos, você tem condições de pagá-los — diz uma advogada especializada em mercado de capitais, que pediu para não ser identificada.

Quando o gestor de um fundo de ações acredita que determinado papel de uma empresa que está na sua carteira pode se desvalorizar no futuro, ele pode se proteger desse possível movimento usando os contratos de opção.

Nesse caso, segundo analistas, ele precisa ter nas mãos um contrato que lhe dá a opção de vender essa ação por um preço pré-determinado no futuro. No jargão do mercado, esse contrato é chamado de "put" . Se a ação se desvalorizar no período, ele venderá o papel pelo preço fixado no contrato (mais alto) e embolsará a diferença.

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Mas se a desvalorização esperada não acontecer e o preço do papel ficar mais alto do que o fixado no contrato, ele terá que arcar com o prejuízo.

Sem ação na mão

Caso acredite que essa mesma ação vai valorizar, o investidor pode ganhar dinheiro comprando uma "call'" uma opção que permite a venda pelo preço pré-determinado na data de vencimento acordado.

Nos contratos de opção, o investidor não precisa ter a ação que está negociado. Na prática, ele está apenas operando a diferença de preços entre o que está fixado no contrato e o que vai acontecer em uma data futura.

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— Essas estratégias são comuns no mercado financeiro. Se um fundo de ações tem um rendimento de 2% ao mês, por exemplo, o gestor pode separar 0,5% do lucro para comprar puts e se proteger se as ações caírem. O preço dos contratos varia todos os dias até a data do vencimento por causa da volatilidade do mercado, do prazo de vencimento. No caso da Petrobras, quando a ação caiu abaixo de R$ 26,50, ele começou a ganhar dinheiro. Eu também venderia tudo e embolsaria o ganho — diz um experiente gestor neste tipo de operação que pediu para não ser identificado.

Data de compra chama atenção no caso Petrobras

Em dezembro passado, os contratos de opção de ações negociados na Bolsa de Valores brasileira (B3) movimentaram R$ 28 bilhões. Em janeiro deste ano foram mais R$ 21,3 bilhões.

No dia 22 de fevereiro, data em que foram vendidas as opções das ações da Petrobras com ganho elevado, foram movimentados R$ 16,9 bilhões, ainda segundo dados da B3. As ações preferenciais da Petrobras apresentaram o terceiro maior volume daquele dia, com R$ 289,7 milhões movimentados em opções de venda.

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Os contratos de opção de ações vencem toda terceira segunda-feira do mês na B3.

Segundo especialistas de mercado consultados pelo GLOBO, sob a condição de anonimato, o que chamou a atenção no caso das opções da Petrobras de 22 de fevereiro foi a data da compra, dia 18, apenas quatro dias antes do vencimento.

Trata-se um espaço muito curto de tempo entre a compra e a venda para um volume tão elevado de recursos, R$ 160 mil. Normalmente, os gestores fazem esse tipo de operação com prazo médio de dois meses, diz um especialista em operações desse tipo, e valores mais baixos.

— Foi uma aposta muito arriscada que se concretizou em apenas dois dias. Como estavam muito perto do vencimento, o valor das opções estava muito baixo, R$ 0,04. A chance de os contratos virarem pó, e o investidor ficar com o prejuízo, era muito grande, já que era difícil acreditar que a ação da Petrobras cairia de R$ 29,27 para um valor abaixo de R$ 26,50 tão rápido. Mas, depois do anúncio da troca de presidente, naquele dia (22), as ações PN da Petrobras abriram em forte queda e fecharam o dia em R$ 21,45 — diz o especialista.

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Gestores alegam que seria muito difícil uma desvalorização tão grande das ações da Petrobras, num curto espaço de tempo, sem que se soubesse que algo importante estaria para acontecer com a empresa. Eles lembram que as ações da estatal vinham subindo com a alta do petróleo no mercado internacional.

— Só uma investigação pode provar isso e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), xerife do mercado, pode pedir à corretora a identificação do investidor, esmiuçar seu histórico (se ele normalmente aplica no mercado de opções), quanto aplica etc. Se nunca investiu nesse mercado, e fez uma tacada certeira na primeira vez, é possível desconfiar. Nesse caso, a CVM também pode pedir rastreamento de ligações telefônicas, mensagens — diz o gestor.