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Economia

Estados já negociam empréstimo internacional para fortalecer o caixa e ampliar gastos com saúde

SP busca US$ 100 milhões com Banco Mundial. RN e PE também conversam com a instituição, mas é preciso aval do Tesouro
Atendimento a pacientes com Covid-19 em hospital de São Paulo: estado busca crédito de US$ 100 milhões com Banco Mundial Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
Atendimento a pacientes com Covid-19 em hospital de São Paulo: estado busca crédito de US$ 100 milhões com Banco Mundial Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

SÃO  PAULO, RIO E BRASÍLIA - Com quedas bruscas na arrecadação devido ao avanço do coronavírus , ao menos seis estados negociam com organismos multilaterais, como o Banco Mundial , novos empréstimos ou o remanejamento de crédito tomado no passado para ampliar gastos com saúde e fortalecer o caixa.

No caso de novos financiamentos, o gargalo é a exigência de aval do Tesouro Nacional, que não pode ser concedido hoje por causa da fragilidade fiscal de muitos governo estaduais. A expectativa é que a aprovação do chamado Plano Mansueto, que flexibiliza essas regras e deve ser votado na Câmara nesta semana, permita um reforço nos recursos para fazer frente à pandemia.

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São Paulo montou projeto para obter US$ 100 milhões junto ao Banco Mundial para o combate ao vírus. O dinheiro será usado na abertura de 500 leitos de UTI. O governo aguarda análise da União.

Em Santa Catarina, deputados estaduais autorizaram o governo de Carlos Moisés (PSL) a transferir uma linha de crédito de US$ 344 milhões junto ao Bank of America por outra do mesmo valor no Banco Mundial, que cobra juros menores.

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A operação deve liberar cerca de R$ 1 bilhão para o custeio da máquina pública. Para o combate ao coronavírus, o governo catarinense pede R$ 500 milhões ao BNDES.

Remanejamento

É uma estratégia semelhante à do Pará, onde a queda de arrecadação do ICMS deve chegar a 40% em 2020. Segundo o secretário de Fazenda, René Sousa, o estado vem pleiteando ao Banco Mundial e à Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD) a mudança em crédito solicitado antes da crise, destinado ao saneamento. A ideia é ter fôlego para comprar mais estruturas de combate à doença.

No Ceará, o governo de Camilo Santana (PT) transferiu para esses fins 25% dos recursos de empréstimo de R$ 1,1 bilhão para obras obtido junto ao Banco Interamericano do Desenvolvimento (BID) em 2018.

Assim, o governo comprou 700 respiradores e outros insumos médicos de fornecedores da China, que devem chegar até 15 de abril, disse a secretária de Fazenda, Fernanda Pacobahyba.

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O Rio Grande do Norte também está remanejando para a saúde R$ 22 milhões de um empréstimo de US$ 360 milhões tomado há cinco anos com o Banco Mundial. Segundo o secretário de Planejamento, Aldemir Freire, o remanejamento é necessário porque novo financiamento de R$ 1,1 bilhão, que o estado negocia com o Banco Mundial e com a AFD, depende da aprovação do Plano Mansueto e levará tempo.

Pelas regras atuais, a fragilidade financeira do estado impede que ele receba garantia da União para esse tipo de operação.

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— Como enfrentamos uma urgência nos próximos 60 dias, estamos concentrando as adaptações no empréstimo antigo. Não teremos tempo hábil para utilizar o dinheiro novo no combate à pandemia — ponderou Freire.

Em Pernambuco, a expectativa também é que o Plano Mansueto permita a obtenção de recursos para o combate ao coronavírus junto ao Banco Mundial, mas o valor de eventual empréstimo ainda não foi fechado.

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O chamado Plano Mansueto — em referência ao secretário do Tesouro, Mansueto Almeida — pretende facilitar R$ 40 bilhões em operações de crédito dos estados com garantias da União. Empréstimos com esse aval têm juros mais baixos. Hoje, apenas estados com nota “A” e “B” podem acessar esses empréstimos.

O Plano Mansueto estende essa possibilidade a estados com nota “C” em troca de medidas de ajuste fiscal. O plano também permite a suspensão, neste ano, do pagamento de empréstimos junto ao sistema financeiro, a instituições multilaterais e de dívidas junto à União.

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Cautela fiscal

Ana Carla Abrão, economista e sócia da Oliver Wyman, avalia que, por se tratar de um momento de calamidade, a flexibilização de algumas normas fiscais pode ser feita. Mas diz que isso não deve abrir precedentes para desmonte dos controles:

— Uma coisa é agir de forma pontual, a outra é abrir possibilidades para que todos se endividem, e sabemos onde isso vai dar. É preciso manter as instituições fiscais de pé para que sejam abertos caminhos emergenciais.

Ana Carla indica que o mais urgente neste momento é a coordenação entre todos os níveis de governo para que os empréstimos, caso autorizados, sejam bem executados.

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Em estados em má condição fiscal, a dificuldade de obter aval do Tesouro é um desafio para obter recursos internacionais no momento de crise.

— Não temos capacidade de pagamento para contratar novos empréstimos neste momento. Não temos aval do Tesouro para financiamentos novos — afirmou o governador gaúcho Eduardo Leite (PSDB), que vem pleiteando ao governo federal a entrada do estado no regime de recuperação fiscal. — Para os efeitos do coronavírus precisaremos de algo novo, imediato e robusto do governo federal.

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Para Regina Esteves, presidente da ONG Comunitas, dedicada à inovação na gestão pública, mais importante do que obter mais recursos é garantir um bom uso deles:

— Estamos discutindo endividamento para tratar os doentes. Haverá recursos também para a prevenção da população?

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O que está em negociação

São Paulo

Busca US$ 100 milhões junto ao Banco Mundial para criação de de 500 leitos de UTI. Aguarda análise do governo federal.

Ceará

Destinou R$ 250 milhões de uma linha de crédito com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para a compra de 700 respiradores e insumos médicos.

Santa Catarina

Vai trocar uma linha de crédito do Bank of America por outra com o Banco Mundial, de juros mais baixos. A ideia com a operação é economizar R$ 1 bilhão e fazer frente à queda na arrecadação.

Pará

Pede ao Banco Mundial e à Agência Francesa de Desenvolvimento para usar no combate ao Covid-19 recursos que iriam para obras de saneamento.

Rio Grande do Norte

Remanejou para a saúde R$ 22 milhões de crédito com o Banco Mundial. Vai adaptar parte de um empréstimo de R$ 1,1 bilhão que negocia com a instituição e com a AFD, mas depende do Plano Mansueto.

Pernambuco

Quer usar no combate ao coronavírus parte dos recursos de novo empréstimo com o Banco Mundial, mas também depende do Plano Mansueto.

(*) Com Gabriel Martins e Manoel Ventura