Um grupo de três grandes gestoras – AZ Quest, Arx e JGP –, representando seus fundos de investimento, acionaram o TJ do Rio de Janeiro nesta segunda-feira para tentar suspender a liminar que paralisou, na semana passada, os pagamentos de dívidas da companhia de luz.
A Light havia informado que não iria realizar o pagamento de remuneração de debêntures que estava previsto para esta segunda. A não quitação ocorre em função da ação de tutela cautelar requerida pela companhia. Pela medida, encontram-se suspensas todas as obrigações financeiras da companhia, o que inclui as emissões de debêntures.
A Justiça havia acatado o pedido da Light para a suspensão de vencimentos de dívidas por 30 dias prorrogáveis por igual período. A escolha da data ocorre em semana decisiva, pois uma série de obrigações financeiras da companhia tinham data para vencer nesta semana.
O pedido de suspensão ajuizado neste dia 17 pelas casas afirma que representa “milhares de investidores individuais, inclusive pensionistas, que aplicaram seus recursos nos mencionados fundos”.
No recurso, as gestoras afirmam que a Light utilizou uma “argumentação leviana” ao descrever ao Judiciário que está em crise financeira e cobram detalhes sobre o tema.
O pedido também afirma que o benefício garantido à Light “não foi utilizado como verdadeiro mecanismo de socorro da empresa, mas uma forma de obter vantagem indevida na negociação com os seus credores”.
- O que dizem os credores: Reação e tentativa de barrar a suspensão de pagamento das dívidas da Light
Os autores do pedido afirmam que a retomada dos pagamentos “não implicará na interrupção ou inadequação dos serviços de energia elétrica à população fluminense”. E citando o texto da Light em sua petição inicial, destacam que “as obrigações financeiras, que se pretende suspender, não guardam relação com as de natureza setorial, que, como cediço, garantem a prestação do serviço público”.
Os gestores ainda ressaltam que a liminar concedida à Light não estabelece deveres à concessionária, “pois não estabelece cronograma para apresentação de plano de reestruturação”.
Mediação
A Justiça também havia aprovado o pedido de mediação, que vai ocorrer no Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem. A medida funciona como uma alternativa à recuperação judicial, já que concessionárias de serviços públicos não podem usar desse recurso.
![Ligações clandestinas de energia levam à crise na Light — Foto: Márcia Foletto](https://s2-oglobo.glbimg.com/pOWyvC47AcjFE0zI5EMEkj0QS9o=/0x0:8192x5464/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/U/D/if2jBcTeejxwQePwqC4w/101998714-ec-rio-de-janeiro-rj-09-02-2023-crise-na-light-perdas-no-faturamento-por-roubo-de.jpg)
O sócio do escritório FCDG Advogados, José Roberto de Castro Neves, que assessora um grupo de gestoras com debêntures da Light critica a decisão. Segundo ele, a medida tem efeitos semelhantes a de uma recuperação judicial, mas não gera obrigações para a empresa.
— Essa medida que a Light iniciou é um perigo para o mercado de forma geral. Vai ser muito difícil você convencer alguém a fazer um investimento na Light a partir de agora, porque ela está mudando a regra no meio do jogo. Recuperação é um favor que a lei dá ao devedor que está em situação difícil. Ela cria uma série de obrigações para o devedor. Eles estão fazendo uma manobra que dá para a Light a vantagem extraordinária de não pagar sem nenhum ônus, o que a lei não prevê. É alto totalmente inusitado e que gera um dano enorme.
Ativos com desconto
Em relatório, analistas da XP destacam que a estratégia de buscar a mediação judicial para o caso se explica pela característica da dívida da Light, que se concentra em debêntures e bonds (títulos de renda fixa emitidos no exterior) pulverizados em milhares de investidores.
Devido às incertezas acerca do pagamento das próximas obrigações financeiras, os ativos estão sendo negociados com um deságio no mercado.
Segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), a debênture LIGHA5, com vencimento para 2025, por exemplo, fechou o pregão de sexta-feira com um PU Indicativo de R$ 394,63 ante um PU Par de R$ 1.340.
A LIGHA 9, com vencimento para o mesmo ano, tinha PU de R$ 377 na sexta-feira ante PU PAR de R$ 1.290
No mercado, a taxa que remunera o papel é estabelecida, na maioria das vezes através de um leilão de taxas, o bookbuilding. organizado pelos bancos coordenadores da oferta. Apesar de ser considerada um ativo de renda fixa, os preços sofrem com as oscilações do mercado.
O PU Par representa o ativo marcado na curva, ou seja, o valor da emissão atualizado pelas taxas acordadas. Já o PU Indicativo ilustra a quanto o papel está sendo negociado no mercado secundário, ou seja, como se fosse o ativo marcado a mercado. Então comparando os dois preços, é possível ter a ideia do deságio.
Rebaixamentos
Vale lembrar que ao contrário de outros investimentos de renda fixa, como os CDBs ou as letras de crédito, as debêntures não têm cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC).
Por isso é importante olhar para o rating e para o histórico das empresas antes de adquirir os papéis. Nos últimos meses, a Light vem sofrendo cortes nas suas recomendações por parte de agências de risco.
Na sexta-feira, a Fitch rebaixou os ratings de longo prazo (IDRs) em moeda local e em moeda estrangeira da Light e de suas subsidiárias Light Sesa (distribuidora) e Light Energia (geradora) de “CC” para “C”.
Procurada pelo GLOBO, a Light disse que não ia comentar.