Economia Reforma tributária

Governo entrega a Lira projeto que eleva isenção do Imposto de Renda a R$ 2,5 mil. Veja a nova tabela

Mudança faz parte da segunda etapa da reforma tributária e eleva para 16 milhões o número de isentos. Alíquota máxima só será aplicada a salários acima de R$ 5.300
Os ministros Paulo Guedes (Economia), Flávia Arruda (Secretaria de Governo), Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil) e o secretário especial da Receita Federal, José Tostes, entregam ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, o projeto de reforma do Imposto de Renda Foto: Pablo Jacob / Pablo Jacob
Os ministros Paulo Guedes (Economia), Flávia Arruda (Secretaria de Governo), Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil) e o secretário especial da Receita Federal, José Tostes, entregam ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, o projeto de reforma do Imposto de Renda Foto: Pablo Jacob / Pablo Jacob

BRASÍLIA — Os ministros Paulo Guedes (Economia), Flávia Arruda (Secretaria de Governo) e Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil) entregaram nesta sexta-feira proposta para mudar a cobrança do Imposto de Renda que inclui a atualização da tabela do IR para a pessoa física. O texto foi entregue ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). (veja os detalhes abaixo)

O projeto de lei, que faz parte da segunda fase da reforma tributária, altera também a cobrança de impostos para empresas e operações financeiras e a traz de volta a tributação sobre lucros e dividendos, que são isentos desde 1995.

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Como o GLOBO antecipou, a principal mudança é a ampliação da faixa de isenção do IR para pessoa física, que passa de R$ 1.903,98 para R$ 2.500. Na campanha eleitoral, o presidente Jair Bolsonaro chegou a prometer ampliar esse limite para R$ 5 mil, o que acabou não se concretizando.

As deduções do Imposto de Renda, como saúde e educação, não mudam, de acordo com a Receita.

A arrecadação do governo irá reduzir R$ 13,5 bilhões com a atualização da tabela em 2022. Para 2023, o impacto será de R$ 14,2 bilhões. Para 2024, cerca de 15,4 bilhões. Por outro  lado, o governo estima que irá arrecadar mais R$ 18,5 bilhões com a tributação de lucros e dividendos em 2022. Em 2023, R$ 54,9 bilhões. Para 2024, R$ 58,1 bilhões.

Com a mudança, a tabela do IR foi totalmente modificada:

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IR para empresas e tributação de dividendos

No total, entre aumento de redução da arrecadação, o governo prevê receber mais R$ 900 milhões em impostos em 2022 com as mudanças.

— Buscou o equilíbrio, para se manter a mesma carga tributária global. Essa redistribuição da carga vai provocar um efeito neutro. O total das medidas, considerando todo o projeto, vai ter um desempenho positivo de R$ 900 milhões em 2022. Para 2023, R$ 330 milhões. Para o ano de 2024, R$ 590 milhões — disse Claudemir Malaquias, chefe de Estudos Tributários da Receita.

O governo também fez mudanças no IR para empresas. O projeto prevê uma redução gradual da alíquota geral, que vai cair de 15% para 10% em dois anos. O corte será de 2,5 pontos percentuais a cada ano.

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A alíquota adicional de 10% para lucros acima de R$ 20 mil vai permanecer. Nesta semana, Guedes sinalizou que o objetivo da equipe econômica é promover mais duas reduções de 2,5 pontos percentuais em 2023 e 2024, caso Bolsonaro seja reeleito .

Para compensar a renúncia fiscal, o governo decidiu tributar dividendos (a parte dos lucros distribuída a sócios), que hoje são isentos. Essa alíquota será de 20%.

— Por 40 anos, o Brasil aumentou os impostos sobre as empresas e sobre os assalariados. E, ao contrário, não houve a coragem de tributar os rendimentos de capital. Durante décadas nós aumentamos os impostos sobre as empresas, dificultando os investimentos — afirmou o ministro da Economia.

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Redução de impostos para 30 milhões

Guedes afirmou que os impostos serão reduzidos para 30 milhões de pessoas.

— O que nós estamos fazendo é aumentar os impostos sobre os rendimentos do capital, que são os impostos sobre os dividendos. Os impostos serão reduzidos para 30 milhões de brasileiros assalariados — disse.

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O ministro prometeu reduzir impostos com aumento da arrecadação:

— Prometemos sempre que os aumentos de arrecadação vão ser usados para a diminuição de impostos.

Mais tarde, durante audiência pública na Comissão de Acompanhamento da Covid-19, o ministro acrescentou que a tributação sobre o rendimento de capital é uma necessidade e ressaltou que os maiores países do mundo cobram esse imposto, como Estados Unidos e Inglaterra. Segundo ele, a medida elimina uma “perversidade” do sistema e não deve afetar o comportamento do mercado financeiro.

— Os mercados já sabem que vem tributação sobre dividendo, já sabem que vem alíquota de 20%, mas estão vendo que o Brasil vai crescer. É um ganha-ganha, o Brasil cresce mais rápido, quem tem capital ganha porque está subindo o valor das empresas brasileiras, estão surgindo mais dividendos, e têm também que pagar os impostos — disse.

Para reforçar a aposta de retomada da atividade econômica, ele adiantou que espera que o balanço de maio do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que será divulgado segunda-feira, contenha um "bom número".

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Na cerimônia de entrega, o presidente da Câmara disse que o Congresso brasileiro é reformista e que espera aprovar a proposta ainda neste ano.

— Precisará de ajuste. Tabelas serão checadas, contas serão revisadas. Mas eu tenho muita confiança no plenário dessa Casa.Eu acredito na aprovação de todas as matérias neste ano e a gente deixe para falar de eleição em 2022 — afirmou Lira.

Lira afirmou ainda que pretende votar antes do recesso parlamentar os textos da reforma tributária — na quinta-feira, falou que nesta lista também estão a privatização dos Correios e o novo Bolsa Família.

Antes do encontro, a ministra Flavia Arruda disse que a expectativa é de que o projeto seja aprovado ainda neste ano. Isso é necessário para que as mudanças tenham efeito já em 2022. — Hoje é um dia importante porque vamos entregar o texto da reforma que vai impactar diretamente a vida de muitas pessoas — disse Arruda.

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Questionada sobre a aprovação ainda neste ano, a secretária confirmou a expectativa:

— Com certeza, na mão do presidente Arthur Lira vai sair.

Lira define relatoria

Arthur Lira definiu, no fim da tarde, os dois relatores dos projetos que compõem essa proposta fatiada de reforma tributária. O Luiz Carlos Motta (PL-SP) vai relatar a proposta que institui a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), unificação dos tributos federais PIS e Cofins. Já o deputado Celso Sabino (PSDB-PA) será relator do projeto de lei que mexe com o imposto de renda.

Sabino, que é auditor fiscal e estuda temas tributários, disse que vai já começa a estudar o texto, que avalia como benéfico pela ampliação da faixa de isenção do IR para pessoa física e a redução de alíquotas para pessoa jurídica.

— Na segunda-feira, devo me reunir com o presidente Arthur Lira, para juntos definirmos a estratégia de tramitação, de consulta aos líderes partidários, às bancadas, para que nós possamos, no âmbito da Câmara dos Deputados, construirmos juntos um texto que represente os anseios da maioria da população brasileira – explicou.

E acrescentou:

— Pela experiência que temos, os textos chegam do governo de uma forma e costumam sair de uma outra forma. O que a gente quer fazer é um elo, criar um laço, que possa produzir o melhor texto de reforma tributária para o nosso país.

Impacto da reforma perde força

A estratégia de fatiamento da reforma, com quatro propostas distintas (sobre imposto sobre consumo, renda, renegociação de dívidas e a parte constitucional), vai limitar o alcance da proposta. Para o economista-chefe do Banco Alfa, Luis Otavio Leal, o país vai promover uma simplificação, mas perdeu a oportunidade de fazer uma reforma tributária de verdade para melhorar o ambiente de negócios.

— O faseamento da reforma é péssimo. O ajuste da CBS é um avanço? Sim, porque é melhor ter um tributo só em vez de dois, mas para na parte em que normalmente a discussão começa a dar problema, que é a definição de quem vai ganhar e quem vai perder – afirma, lembrando que já há pressão de setores para que haja alíquotas diferenciadas e que é isso que vai determinar uma melhoria de ambiente de negócios.

Para ele, essa pressão vai chegar à discussão sobre desoneração da folha de pagamentos e, para compensá-la, um tributo nos moldes da CPMF. Além disso, perdeu-se a oportunidade de avançar na unificação do ICMS, imposto estadual que é considerado por ele o grande manicômio tributário do país.

Em relação à proposta do IR, entregue hoje, Leal avalia que um dos grandes trunfos da proposta é de propor a tributação de lucros e dividendos.

Já o advogado tributarista Luiz Gustavo Bichara avalia, preliminarmente, que há um aumento de carga tributária, sobretudo por causa das alterações sobre lucro presumido. Outras mudanças, para a pessoa física, também demandam mais análise, mas tendem a achatar a classe média.

— Eles poderiam ter feito uma limitação de dedutibilidade, porque é só o topo da pirâmide que se vale dessas deduções. Não fizeram, mas acabaram com outros instrumentos importantes como a isenção de imposto de renda para fundos imobiliários –, observa, fazendo a ressalva de que a ampliação da faixa de isenção é um ponto muito positivo.

Veja as mudanças:

Desconto simplificado

O desconto simplificado de 20% ficará restrito a quem recebe até R$ 40 mil por ano. O governo diz que o desconto simplificado foi criado para facilitar o preenchimento da declaração numa época em que era feita apenas em papel. E que a medida vai estimular o contribuinte a pedir nota fiscal.

— O desconto simplificado foi uma opção criada quando a declaração era por papel. Foi uma forma de simplificar. Ao longo do tempo, a preparação da declaração foi facilitada — disse o secretário da Receita Federal, José Tostes.

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O teto para desconto simplificado fará o governo arrecadar, nesse caso, mais R$ 9,98 bilhões em 2022; R$ 10,22 bilhões em 2023 e; R$ 11,4 bilhões em 2024.

A tendência, portanto, é que contribuintes com menos deduções acabem pagando mais imposto quando considerada a alíquota efetiva.

— A limitação não invalida que as rendas acima desse montante possam usufruir das deduções. Os contribuintes poderão utilizar as deduções e o efeito será individual, de acordo com a dedução — defendeu Tostes.

Atualização do valor do imóvel

Hoje, na declaração, os imóveis são mantidos pelo valor original. Ao vender o bem, o cidadão precisa pagar entre 15% e 22,5% de imposto sobre o ganho de capital. Será permitido atualizar os valores patrimoniais, com incidência de apenas 5% de imposto sobre a diferença.

O prazo para adesão e pagamento do imposto é de janeiro a abril de 2022.

Lucros e dividendos

Hoje, são isentos. Serão tributados em 20% na fonte. Haverá uma isenção para até R$ 20 mil por mês para microempresas e empresas de pequeno porte. Para o governo, esse novo modelo de tributação incentiva novos investimentos, já que estimula o reinvestimento dos lucros. A avaliação é de que a não tributação de lucros e dividendos criava uma distorção na economia ao estimular a pejotização.

Imposto de Renda da Pessoa Jurídica

A alíquota geral do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) vai cair de 15% para 10% em dois anos. Será uma queda de 2,5 pontos no primeiro e a outra metade no segundo ano. O adicional de 10% para lucros acima de R$ 20 mil não será alterado.

A alíquota da CSLL, que também incide sobre o lucro, de 9%, não será alterada. A avaliação do governo é de que essa redução vai aumentar a produtividade, competitividade e emprego, estimulando os investimentos e gerações de postos de trabalho.

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Pagamentos de gratificações e participação nos resultados aos sócios e dirigentes feitos com ações da empresa não poderão ser deduzidos como despesas operacionais. O argumento do governo é de que a empresa não deve ter benefício por remunerar seus executivos com bônus em ações. Já os pagamentos a empregados seguem dedutíveis.

Juros sobre capital próprio

Há vedação à possibilidade de deduzir juros sobre o capital próprio. Essa possibilidade foi criada quando era difícil ter acesso a crédito, e as empresas precisavam se autofinanciar com recursos dos sócios. De acordo com o governo, com mercado de crédito evoluído e juros menores, não é preciso mais um benefício para que empresários invistam nas próprias empresas, uma vez que o mecanismo se mostrou ineficaz para capitalizá-las.

Apuração trimestral do IRPJ

Todas as empresas deverão apurar trimestralmente IRPJ e CSLL Hoje, há duas opções: trimestral e anual. Empresas com tributação anual precisam apurar e pagar estimativas mensalmente. Será permitido compensar 100% do prejuízo de um trimestre nos três seguintes.

A adoção da medida tornará mais uniformes os regimes de tributação das empresas, e deve reduzir o tempo gasto para apuração de impostos e reduzir impactos das empresas afetadas por sazonalidades.

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Operação em Bolsa de Valores

Será feita trimestralmente. Hoje é mensal. A alíquota será de 15% para todos os mercados. A compensação de prejuízos poderá ocorrer entre todas as operações, inclusive day-trade e cotas de fundos negociadas em Bolsa.

Renda fixa

A alíquota da renda fixa passa a ser única, de 15%. Acaba com o atual escalonamento em função da duração da aplicação.

— Está se retirando o come-cotas de maio e deixando só o come-cotas de novembro — disse Fernando Mombelli, coordenador-geral de Tributação.

Fundos de investimentos

O governo propôs acabar com a tabela regressiva da tributação dos fundos, que cobra imposto de acordo com o tempo, e fixar uma alíquota de 15%. Também muda o come-cotas — nome que se dá para uma antecipação no recolhimento do Imposto de Renda em fundos de investimento. Hoje, são dois come-cotas ao ano. Passará ser uma cobrança, apenas a de novembro. O come-cotas de maio deixará de existir.

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O governo também propôs a tributação dos fundos exclusivos (usados por pessoas mais ricas) em 15%. Hoje eles são isentos.

Os rendimentos produzidos até 31 de dezembro de 2021 serão tributados pela alíquota vigente nesta data.

Fundos de investimentos imobiliários

Acaba a isenção sobre os rendimentos distribuídos a pessoa física no caso de fundos de investimentos imobiliários (FII) com cotas negociadas em Bolsa a partir de 2022. A tributação dos demais cotistas cai de 20% para 15% na distribuição de rendimentos, na amortização e na alienação de cotas.

LCI e LCA não mudam

A equipe econômica chegou a discutir tributar as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA). Mas o governo decidiu manter a isenção, após pressão de setores beneficiados.

— Não houve pressão, não houve nada. Foram feitas várias análises. São setores importantes da economia. Foi  uma decisão técnica e de governo — disse Mombelli.