Economia

Guedes quer distribuir parte do lucro de estatais para reforçar Renda Brasil

Ministro da Economia sugere criar 'dividendos sociais' para bancar "Imposto de Renda negativo" e volta a defender fim de abono salarial
O ministro da Economia, Paulo Guedes, em audiência pública no Congresso Nacional Foto: Reprodução
O ministro da Economia, Paulo Guedes, em audiência pública no Congresso Nacional Foto: Reprodução

BRASÍLIA - O ministro da Economia, Paulo Guedes, sugeriu nesta terça-feira repassar parte dos lucros das empresas estatais para o financiamento de transferências de renda no âmbito do Renda Brasil , programa social que o governo quer criar para substituir o Bolsa Família.

A ideia seria uma forma de estabelecer o que ele chamou de uma espécie de Imposto de Renda negativo com "dividendos sociais".

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Segundo o ministro, os recursos iriam para um novo Fundo Brasil, que seria responsável por repassar aos mais pobres parte dos lucros que as companhias hoje transferem à União.

A medida seria uma forma, na visão de Guedes, de aproveitar ativos que o governo tem dificuldade de vender, já que o programa de privatizações do governo tem enfrentado dificuldades para deslanchar. A demora na venda de estatais levou o então secretário de Desestatização, Salim Mattar, a pedir demissão no mês passado.

— Se o Governo quiser manter a Petrobras, a Caixa Econômica Federal etc., tudo bem, mantenha. Agora, nós podemos dar um Imposto de Renda negativo. Quer dizer, com a mão esquerda eu estou dando recurso, com a mão direita eu estou recolhendo aquilo de volta, subscrevendo cotas do Fundo Brasil. Ao invés de a União receber R$ 25 bilhões no fim do ano, de dividendos, vai receber R$24 bilhões. E R$1 bilhão vai para os brasileiros mais frágeis — disse o ministro, durante audiência pública no Congresso.

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Com esse dinheiro, o governo poderia criar esse IR negativo mencionado por Guedes, que na prática seria um cidadão pobre receber um valor do governo em vez de contribuir com a União. O direito a receber algum valor ou o dever de pagar imposto seria baseado nos rendimentos da pessoa. A ideia já havia sido defendida por Guedes antes.

Alíquota no sentido inverso

Em um exemplo citado pelo ministro, o IR negativo poderia ser de 20%. Dessa forma, um trabalhador que recebesse R$ 500 poderia ter direito a um repasse de R$ 100. Já se alcançasse uma renda de R$ 600, o governo complementaria com R$ 120.

— Em vez de eu o deixar só num programa de assistência social, em que eu ia dar R$200 para ele, de repente, eu estou dando R$100, gastando a metade do que eu ia gastar, e ele está estimulado, subindo uma rampa de ascensão social — afirmou o ministro.

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Segundo Guedes, essa estratégia resolveria dois problemas: a fonte de recursos para financiar as transferências mais pobres e o aproveitamento dos ativos em poder da União, com a criação do que chamou de "dividendos sociais".

— "Ah, não, eu não vou vender. Essa empresa estatal não é para vender." Não é para vender por quê? "Ela é do povo brasileiro". Ora, dê ao povo brasileiro os frutos dessa empresa. Se ela é do povo brasileiro, entregue ao povo brasileiro os frutos. Então, isso tudo são projetos de que nós vamos ter que conversar a respeito, dentro dessa ideia de reforçarmos o Renda Brasil.

Abono é dinheiro 'do andar de cima'

A equipe econômica busca há meses uma solução para financiar uma rede de proteção social mais abrangente, diante da necessidade de manter algum nível de assistência para os beneficiários do auxílio emergencial, criado durante a pandemia.

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Inicialmente, Guedes sugeriu ao presidente Jair Bolsonaro a extinção de benefícios como o abono salarial (um salário mínimo pago anualmente aos que ganham menos que duas vezes o piso) para abrir espaço no Orçamento e criar o Renda Brasil sem ferir o teto de gastos . Mas a proposta foi rechaçada por Bolsonaro.

“O trabalhador que recebe um salário mínimo ou 1,5 salário mínimo não é considerado pobre no Brasil. Pobre, no Brasil, é quem ganha R$170, R$190 do Bolsa Família”

Paulo Guedes, ministro da Economia
em audiência pública no Congresso

Durante a audiência pública no Congresso nesta terça-feira, o ministro reconheceu que o debate foi adiado, diante do impasse nas conversas com o Palácio do Planalto . No entanto, voltou a defender a ideia de acabar com o abono, ao justificar que, na avaliação dele, o benefício não é focado nos mais pobres.

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— Não é que se tirou do pobre. É porque o Brasil, hoje, é um país rico em recurso e pobre em salário, até por essa cunha fiscal, por esse imposto sobre salários que existe. Quando você joga isso tudo, no final, o trabalhador que recebe um salário mínimo ou 1,5 salário mínimo não é considerado pobre no Brasil. Pobre, no Brasil, é quem ganha R$170, R$190 do Bolsa Família. Pegar dinheiro desse andar de cima, jogar lá embaixo e ir consolidando é um princípio básico de política pública — disse o ministro.

O presidente Bolsonaro não concorda . Na semana passada, ao dizer que não enviaria essa proposta ao Congresso, o presidente indicou que quer um Renda Brasil mais robusto, mas sem acabar com outros programas sociais, como o abono salarial. Ele afirmou que não poderia "tirar de pobres para dar para paupérrimos".