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Fed eleva juros pela primeira vez desde 2018; Bolsa sobe quase 2% e Dólar cai, com exterior positivo

Decisão da China de aliviar cerco a gigantes de tecnologia e avanço nas negociações entre Rússia e Ucrânia animaram os negócios. BC americano sinaliza que mais juros estão a caminho
Decisões sobre juros no Brasil e nos Estados Unidos são destaque no dia dos mercados. Foto: AMANDA PEROBELLI / Reuters
Decisões sobre juros no Brasil e nos Estados Unidos são destaque no dia dos mercados. Foto: AMANDA PEROBELLI / Reuters

RIO — A Bolsa teve forte alta e o dólar voltou a fechar abaixo dos R$ 5,10  nesta quarta-feira. Os ativos domésticos se beneficiaram do sentimento favorável ao risco visto nos mercados globais, com sinalizações positivas vindas da China e da guerra na Ucrânia .

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No momento mais aguardado no dia dos mercados, o Federal Reserve, Banco Central americano, elevou a meta da taxa básica de juros em 0,25 ponto base. Agora, ela está no intervalo entre 0,25% e 0,50%

O Ibovespa subiu 1,98%, aos 111.112 pontos. Após o anúncio do Fed, os ganhos do principal índice da B3 aceleraram.

A moeda americana, por sua vez, caiu 1,28%, negociada a R$ 5,0925.

Agora, a expectativa fica por conta do anúncio de juros por parte do BC brasileiro, que deve elevar a Selic em 1 ponto percentual.

Mais altas de juros no caminho

É a primeira elevação das taxas básicas desde 2018. O aumento, em si, já estava precificados pelos mercados, ainda que o anúncio do banco tenha sinalizado uma postura mais rígida sobre o aperto monetário no país.

Com o início da pandemia, o banco manteve os juros próximos a zero para aliviar os impactos sobre a atividade econômica.

No entanto, desde o ano passado, o Fed já vem sendo pressionado a atuar de forma mais incisiva para conter a inflação alta no país e que vem renovando recordes de quatro décadas .

"Os indicadores de atividade econômica e emprego continuaram a se fortalecer. Os ganhos de emprego foram fortes nos últimos meses, e a taxa de desemprego diminuiu substancialmente. A inflação permanece elevada, refletindo desequilíbrios de oferta e demanda relacionados à pandemia, preços mais altos de energia e pressões mais amplas sobre os preços", destacou o banco em comunicado.

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Os formuladores de política monetária votaram por 8 a 1 para elevar as taxas básicas. O presidente do Fed de St. Louis, James Bullard, discordou a favor de um aumento de meio ponto, o primeiro voto contra uma decisão desde setembro de 2020.

A autoridade monetária ressalta que aumentos contínuos nas taxas de juros serão apropriadas. Além disso, o Fed espera começar a reduzir suas participações em títulos do Tesouro e dívida de agências e títulos lastreados em hipotecas de agências em uma próxima reunião.

Os dirigetes do banco destacaram que a guerra entre Rússia e Ucrânia traz implicações "altamente incertas" para a economia americana. No curto prazo, os efeitos da guerra provavelmente "criarão uma pressão ascendente adicional sobre a inflação e pesarão sobre a atividade econômica".

Em coletiva após o anúncio, o presidente do Fed, Jerome Powell, afirmou que o Comitê "está ciente" da necessidade de devolver a economia à estabilidade de preços.

—  A economia americana está muito forte e bem posicionada para lidar com uma política monetária mais apertada — disse Powell.

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O presidente do Fed afastou a possibilidade de que a alta dos juros possa causar uma desacaleração na economia americana. Segundo ele, a possibilidade de uma recessão no próximo ano “não é particularmente elevada”, o que animou os investidores.

Ele ressaltou que o banco poderá elevar as taxas de juros de forma mais rapida durante o ciclo, em caso de necessidade. E que detalhes sobre a reduçao do balanço do banco devem ser discutidos na reunião de maio.

— O Comitê busca alcançar um máximo de emprego e uma inflação na casa dos 2%. A expectativa do Fed é que esse fortalecimento da política monetária, a inflação volte para esse patamar. (O anúncio) seguiu a linha do mercado. De uma forma geral, o mercado já estava precificando essa alta de 0,25 ponto percentual. O importante será esperar a ata para ter mais informações sobre os próximos passos  — destaca o sócio da Nexgen Capital, Luiz Carlos Corrêa.

Revisão da inflação

Para o economista-chefe da Kilima Asset, Luciano Costa, a combinação do comunicado do Fed com as falas de Powell pode ser lida como mais dura

Ele destaca que a autoridade monetária elevou suas projeções de juro e inflação. Para Costa, o mercado já precifica mais seis altas de 0,25 ponto percentual de juros até o fim do ano, sem contar que de três a quatro elevações já são esperadas para o próximo.

— O conjunto da decisão com as falas é mais hawkish (favorável à retirada de estímulos). Você revisa os níveis de projeção para inflação e juros com uma trajetória mais dura e ele (Powell) não fecha completamente a porta para que o Fed, ao longo do ciclo, acelere as altas.

O Fed elevou suas perspectivas de inflação para 2022. A estimativa para o índice cheio agora está em 4,3% ante os 2,7% previstos em dezembro.

Para o Produto Interno Bruto (PIB), também ocorreram revisões. O banco espera crescimento de 2,8% neste ano ante os 4% da última leitura, de 2,2% em 2023 e de 2,0% em 2024.

Para a taxa de desemprego, as estimativas são de 3,5% em 2022 e 2023 e 3,6% em 2024.

O economista-chefe do Modalmais, Álvaro Bandeira, ressalta que há um cenário de incertezas no mundo todo por conta da guerra e dos consequentes gargalos de insumos, que afetam os mercados. O anúncio de alta da taxa de juros americana, apesar de já esperado, teve um primeiro impacto negativo no exterior porém, depois, as bolsas acabaram se recuperando.

— Não é só a taxa de juros que impacta. Cada dia há uma notícia nova que pode gerar volatilidade. Ontem foi um dia ruim, hoje um dia de recuperação.

E o Brasil?

No cenário interno, a expectativa é que o Comitê de Política Monetária (Copom) eleve a taxa básica de juros em magnitude menor que o 1,5 ponto percentual visto na última reunião.

As maiores apostas estão na casa da elevação em 1 ponto percentual. Resta saber se no comunicado que segue o anúncio, o Copom deixará a porta aberta para os próximos encontros ou se já irá indicar uma continuidade mais forte do aperto monetário.

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No último encontro, a autoridade monetária indicou que o fim do ciclo de alta dos juros poderia estar próximo, porém à época o conflito no Leste Europeu não havia começado.

Para Costa, a decisão anunciada hoje pelo Fed ainda não é suficiente para reverter o forte fluxo estrangeiro que o Brasil vem recebendo desde o início do ano.

Dentre os fatores que ajudaram na atração desse capital está justamente a atratividade da nossa taxa de juros. Tanto Brasil quanto EUA enfrentam períodos de inflação elevada dentro de seus históricos de preços, mas o nosso BC iniciou o processo de aperto de forma antecipada.

— Você ainda tem a percepção de que o país, dentre a classe dos emergentes, tem uma resiliência maior diante desse cenário de mais inflação e menos crescimento. Temos empresas que se beneficiam do ciclo externo e que são resilientes no cenário de inflação maior.

O hedge de operações financeiras e superintendente de projetos da FIPECAFI, Gabriel Emir Moreira e Silva, concorda. Enquanto os investidores brasileiros estão migrando da renda variável para a fixa, diante do ciclo de alta da Selic, investidores estrangeiros têm sido atraídos pelo câmbio e pelo baixo risco relativo do Brasil.

— Além dos papéis ficarem muito baratos para eles, existe um fenômeno de alocar recursos em país de menor risco relativo. O Brasil ocupa uma posição distante do conflito Rússia e Ucrânia não só geográfica, mas também de exposição comercial — analisa Silva

Otimismo com China e Ucrânia

Depois de tombos nos últimos pregões após o aumento de casos de Covid-19 na China, as bolsas asiáticas tiveram dia de forte recuperação.

O principal fator de otimismo para os mercados da região foram os sinais do governo chinês para restaurar a confiança do mercado no país, bastante abalada após vários casos de tentativas de intervenção governamental em empresas e setores em 2021.

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O governo deve “introduzir ativamente políticas que beneficiem os mercados”, de acordo com uma reunião do Comitê de Estabilidade e Desenvolvimento Financeiro do Conselho de Estado, órgão de política financeira da China, liderada pelo vice-primeiro-ministro Liu He, principal autoridade econômica do país.

As autoridades chinesas também sinalizaram que apoiarão a listagem de ações de empresas do país no exterior

As bolsas no país fecharam em forte alta, com Hong Kong tendo seu melhor pregão desde 2008. Na Europa. Os mercados também operavam no positivo.

O sócio da Inove Investimentos, Rafael Antunes, diz que a Bolsa brasileira teve um bom dia principalmente por causa do anúncio do governo chinês para incentivar a economia, após a nova alta de casos de Covid-19 no país.

— Isso é positivo por causa das commodities — explica Antunes: — O maior fluxo da bolsa tem sido por causa de gringo. Quando eles investem aqui, temos então o dólar cedendo como vimos hoje.

Em relação ao conflito entre russos e ucranianos, foram divulgadas novos detalhes sobre as negociações.

Segundo autoridades russas, o país estaria disposto a aceitar que a Ucrânia mantenha as próprias Forças Armadas para a autodefesa, desde que se comprometa a desistir da aspiração de se juntar à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).

Vale avança

As empresas de commodities metálicas recuperaram parte das perdas nos dois primeiros pregões na semana, em linha com otimismo no exterior.

Entre as ações, as ordinárias da Petrobras (PETR3, com direito a voto) subiram 0,09% e as preferenciais (PETR4, sem direito a voto), 0,87%.

As ordinárias da Vale (VALE3) avançaram 2,43% e as da Siderúrgica Nacional (CSNA3), 2,36%.

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As preferenciais da Usiminas (USIM5) subiram 2,17%.

No setor financeiro, as preferenciais do Itaú (ITUB4) e do Bradesco (BBDC4) tiveram altas de 1,95% e 1,44%, respectivamente.

CVC dispara e Yduqs tomba após balanços

As ordinárias da CVC (CVCB3) liderararm as altas do Ibovespa, com avanço de 17,15%.

A CVC reportou prejuízo líquido de R$ 145,8 milhões no quarto trimestre de 2021, ante lucro de R$ 392,5 milhões no mesmo trimestre de 2020.

No acumulado do ano, no entanto, o prejuízo da companhia recuou 60%, saindo de R$ 1,22 bilhão para R$ 486,7 milhões ao fim de dezembro.

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A receita líquida saltou 93% entre outubro e dezembro, somando R$ 314 milhões na base anual. No ano, o indicador alcançou R$ 825,9 milhões, 59,6% acima do apurado em 2020.

Em relatório, analistas do BTG Pactual destacam que os números operacionais do quarto trimestre mostraram uma melhora significativa, ainda que impactados pelas restrições de viagens e pelo cenário macroeconômico.

Na avaliação do banco, há sinais encorajadores de recuperação e uma tendência de melhor rentabilidade.

“Após atingir o fundo do poço na frente operacional em 2020, a CVC deve ser uma das principais beneficiárias da reabertura econômica, além de alavancar seus relacionamentos de longo prazo (extensos) com a fragmentada indústria hoteleira e companhias aéreas no segmento B2B”, ressaltaram os analistas Luiz Guanais, Gabriel Disselli e Victor Rogatis.

O BTG Pactual manteve sua recomendação de compra para as ações da companhia, com preço-alvo de R$ 33.

Na ponta negativa, figuraram os papeis da Yduqs (YDUQ3), com queda de 10,48%.

A empresa do setor de educação reduziu o prejuízo líquido em 27,6% no quarto trimestre, para R$ 74,3 milhões, ante os R$ 102,6 milhões registrados no mesmo período do ano anterior.

A receita líquida cresceu 9,1%, para R$ 1,05 bilhão. No acumulado do ano, o lucro líquido somou R$ 158,2 milhões, avanço de 61%. Já a receita cresceu 14%, para R$ 4,39 bilhões.

A Yduqs também anunciou a renúncia do cargo de Diretor Financeiro e de Relações com Investidores, Eduardo Haiama, a ser efetivada a partir de 18 de abril deste ano.