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Bitcoin: após queda de mais de 30% em maio, crise da criptomoeda veio para ficar?

Para analistas, instabilidade mostra que mercado ainda passa por fase de maturação e que previsões são difíceis de serem feitas
Mais famosa das criptomoedas, bitcoin teve queda firme na semana passada após chuva de notícias negativas. Foto: DADO RUVIC / REUTERS
Mais famosa das criptomoedas, bitcoin teve queda firme na semana passada após chuva de notícias negativas. Foto: DADO RUVIC / REUTERS

RIO —  Somente no ano de 2021, o bitcoin oscilou entre momentos de grande euforia com outros que fizeram os investidores arrancarem os cabelos.

A mais famosa das criptomoedas chegou a alcançar a cotação de US$ 65 mil em abril, mas viu seu preço derreter na semana passada, após declarações do bilionário Elon Musk , críticas sobre seu impacto ambiental e pressão por regulações futuras. Somente em maio, as perdas somam mais de 30%.

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Levando em conta todos esses aspectos, pode-se perguntar se a atual “crise” do ativo veio para ficar ou se é algo passageiro.

Analistas ouvidos pelo GLOBO afirmam que há a possibilidade de a moeda voltar a se recuperar e que a regulação em si não será algo ruim no futuro. Mas em razão da natureza desse mercado, previsões de longo prazo são difíceis de serem feitas.



Para analista, estresse é 'pontual'

Para o executivo de investimentos da corretora Mercado Bitcoin, especializada no ativo, Bruno Milanello, a queda reflete um momento pontual desse mercado.

— É algo bem relevante. Mas não tivemos uma mudança estrutural, de fundamento e sim, acontecimentos pontuais que podem ter reflexo por um prazo um pouco maior.

O executivo destaca que a pressão regulatória da China surpreendeu, pois era esperado que o país fosse mais flexível em relação aos ativos.

Autoridades chinesas alertaram a bancos e instituições financeiras para que não recebessem criptomoedas como pagamentos ou oferecerem serviços e produtos relacionados aos ativos.

No país, a prática de mineração das criptomoedas tem sido relacionada ao aumento nas emissões de CO2, por gastar muita energia.

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Segundo o estrategista da My Cap, Vinícius Alves, a queda vista na última semana mostra que esse mercado ainda não está maduro o suficiente, o que não quer dizer que ele não faça sentido no futuro.

— É uma questão de maturação. O que vimos na semana passada é um reflexo de que o mercado não está maduro. Uma pessoa só conseguir fazer tanto preço em um mercado indica isso – disse Alves, se referindo ao bilionário Elon Musk.

De herói a vilão

Elon Musk: meia-volta volver levou a queda na cotação do bitcoin Foto: HANNIBAL HANSCHKE / REUTERS
Elon Musk: meia-volta volver levou a queda na cotação do bitcoin Foto: HANNIBAL HANSCHKE / REUTERS

Depois de estimular o mercado das critpmoedas, com a confirmação de que a Tesla aceitaria o bitcoin na compra de seus produtos , Musk voltou atrás.

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No dia 12 de maio, ele anunciou em sua conta no Twitter que a empresa não iria mais aceitar a criptomoeda como pagamento pelos veículos, alegando preocupações com o uso crescente de combustíveis fósseis necessários para a mineração dos bitcoins.

E ainda deu a entender que a Tesla poderia vender as suas reservas de bitcoin. Como resultado, no dia seguinte, a cotação da moeda já estava em US$ 43,537.

Na quarta-feira passada, o ativo chegou a cair para a marca dos US$ 30.618 na mínima do dia, muito longe dos patamares de abril, quando no dia 14, a moeda digital atingiu sua máxima história em termos absolutos, ao alcançar a marca de US$ 64,863 na máxima do dia e U$$ 63,109 mil no fechamento.

Novos atores

Com o sucesso recente adquirido, o bitcoin passou a atrair um número maior de investidores, mesmo longe dos ativos tradicionais. Além de pessoas físicas, muitas empresas e fundos de investimento passaram a se aventurar nos ativos digitais.

Para Milanello, a entrada de um maior número de pessoas no mercado também é refletido na queda recente, ainda que em menor escala.

— O mundo de cripto não é tão anônimo como as pessoas pensam. Esse movimento de venda foi feito por carteiras novas, por investidores que têm bitcoins a menos de um ano – disse Milanello, ponderando que as vendas podem ter sido feitas por novas carteiras de ativos, e não necessariamente, por investidores novatos.

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Segundo o professor de Finanças do Insper, Ricardo Rocha, a queda atual é reflexo de uma acomodação de resultados, como ocorre com os ativos tradicionais após uma notícia ruim.

A diferença, segundo ele, é que com esses ativos mais conhecidos, como o dólar, por exemplo, os investidores possuem mais evidências políticas e econômicas sobre os movimentos futuros.

— Nesse mercado, você tem fundos, investidores institucionais, uma gama de pessoas que está operado com isso. Toda vez que você tem um movimento brusco, como foi o da Tesla, há uma pressão vendedora e o ativo se desvaloriza. Os criptoativos já são uma realidade, mas ainda precisamos aprender mais sobre os seus modelos de precificação.

Abalo pode afetar outros ativos?

Para os analistas, as eventuais crises geradas no mercado bitcoin ainda não devem fazer preço em outros investimentos. Mas a opção não é descartada no futuro.

— As criptomoedas estão inseridos no mercado financeiro global. Pode ter impacto, mas ainda o número de investidores nesses ativos é bastante pequeno, se comparado a outros. Eu não acho que nesse momento, a gente tem uma causa e efeito para bater nos ativos mais tradicionais- destaca Milanello.

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Rocha complementa:

— No caso dos criptoativos, ainda é um pouco separado. Você pode ter outros ativos influenciando os criptos, mas o contrário, ainda não acontece.

Regulação e perspectivas

. Foto: Dado Ruvic / REUTERS
. Foto: Dado Ruvic / REUTERS

Apesar de colaborar com a queda do preço no curto prazo, uma regulação mais clara desse mercado é vista como positiva. Isso porque ela trará mais segurança, atraindo mais investidores. Com isso, quedas bruscas no preço poderão ser mitigadas.

Além da China, um relatório do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, divulgado na quinta-feira passada, revelou que parte de uma proposta do governo de Joe Biden para fortalecer as políticas tributárias inclui uma exigência para reportar transferências acima de US$ 10 mil em criptomoedas à Receita Federal do país.

— A regulação vai poder dar mais organização a esse mercado. E no futuro, essas oscilações poderão ser mitigadas — destaca Alves.

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Para o executivo do Mercado Bitcoin, corretora especializada nesse tipo de ativo, o cenário para o ano ainda é positivo. Na corretora, o número de clientes saltou da marca dos dois milhões no início do ano para 2.700 milhões em maio.

Ele ainda destaca que o debate sobre os efeitos ambientais do bitcoin devem ser encarados por aqueles que operam no mercado, mas que há alternativas.

— Ainda estou positivo. Mesmo com a questão regulatória, ainda acho que vamos ver cada vez mais empresas colocando parte das suas reservas em criptomoedas. A bitcoin oferece uma mobilidade que outros ativos, como o ouro, não possuem. Então, se tiver energia limpa e barata em outros países, os mineradores podem sair da China, por exemplo. Além disso, os protocolos de eficiência de energia podem mudar — disse Milanello.