Economia Macroeconomia

BC eleva juros pela 10ª vez seguida e Selic atinge 12,75%, maior patamar desde fevereiro de 2017

Sequência de altas é uma tentativa de controlar a inflação que está acima da meta; BC sinaliza com uma nova alta na próxima reunião do Copom
BC eleva juros pela décima semana seguida para 12,75% Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo
BC eleva juros pela décima semana seguida para 12,75% Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo

BRASÍLIA — O Banco Central (BC) decidiu elevar a taxa básica de juros, a Selic, de 11,75% para 12,75% ao ano nesta quarta-feira. Ao cumprir a indicação dada na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), a autoridade monetária completa a décima alta seguida nos juros desde março de 2021, quando a Selic estava no menor patamar da história, em 2%.

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Com essa nova elevação, os juros chegam ao maior nível desde fevereiro de 2017, quando a Selic era de 12,25% ao ano. A trajetória de alta dos juros faz parte de uma tentativa do Banco Central de controlar a inflação que vem subindo desde o ano passado.

A prévia da inflação de abril foi a maior taxa para o mês desde 1995 . Em 12 meses, a inflação chegou a 12,03%, a maior taxa desde novembro de 2003.

Apesar de ter cumprido a sinalização de elevação dos juros em 1 ponto percentual (p.p), a pressão inflacionária fez com que o BC alterasse sua visão para os passos futuros da Selic.

Na reunião passada, em março, o entendimento era de que o patamar dos juros em 12,75% ao ano seria suficiente para controlar a inflação em 2023.

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Após os preços continuarem surpreendendo para cima e a decisão do Federal Reserve (Fed), o Banco Central americano desta quarta-feira, de fazer a maior alta de juros em 20 anos, o BC mudou essa avaliação.

No comunicado, o Copom informou que "antevê como provável" uma nova alta de juros com um ajuste menor do que 1 p.p, sem citar de qual tamanho seria.

"O Comitê nota que a elevada incerteza da atual conjuntura, além do estágio avançado do ciclo de ajuste e seus impactos ainda por serem observados, demandam cautela adicional em sua atuação", aponta o documento.

A avaliação da economista-chefe do Banco Inter, Rafaela Vitória, é de que o BC fará mais uma alta de 0,5 p.p, levando a Selic para 13,25% ao ano e então chegaria ao fim do ciclo de elevação dos juros.

— Tivemos surpresas inflacionárias depois da última reunião e isso acabou resultando em novas revisões de expectativas, ou seja, as expectativas ainda estão desancoradas pelo menos para 2023 e essa é uma preocupação do Copom e por isso ele quer estender o ciclo — explicou.

Fed

Para Andrea Damico, sócia e economista-chefe da Armor Capital, a decisão do BC para este Copom estava dada e a única dúvida era em relação à intensidade e continuidade do ciclo de alta de juros.

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A economista avalia que o BC errou ao projetar os cenários inflacionários na última reunião porque há um componente inercial muito forte, associado a uma piora das expectativas.

Com a inflação mais disseminada, o choque das commodities não foi bem calibrado e a instabilidade da guerra também afeta as projeções. Além disso, há um efeito do Fed mais agressivo nos Estados Unidos. Por isso, as elevações de juros agora têm efeitos mais relevantes sobre 2023.

— O que o Banco Central fizer agora, vai afetar 2023. Todos esses choques que estamos vendo em 2022, os efeitos primários dele, o BC não vai combater. Ele vai continuar subindo juros agora para combater os efeitos secundários de 2023 e garantir uma inflação dentro do intervalo da meta — pontua.

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A decisão do Fed aconteceu nesta tarde, antes da decisão do Copom, e não foi mencionada diretamente pela autoridade monetária brasileira. No entanto, o documento do BC aponta que a "reprecificação" da política monetária nos países avançados eleva a incerteza e gera "volatilidade adicional' para emergentes.

"O ambiente externo seguiu se deteriorando. As pressões inflacionárias decorrentes da pandemia se intensificaram com problemas de oferta advindos da nova onda de Covid-19 na China e da guerra na Ucrânia. A reprecificação da política monetária nos países avançados eleva a incerteza e gera volatilidade adicional, particularmente nos países emergentes", diz o o comunicado.

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A economista-chefe do Banco Inter ressalta que as duas altas de juros eram esperadas e, apesar dos efeitos negativos para a atividade econômica, são necessárias para controlar a inflação. Segundo a economista, a alta no Fed pode contribuir para a queda dos preços de commodities , que afeta a inflação brasileira.

— O aperto monetário lá fora também pode contribuir para desaquecer a demanda global e os preços de commodities que estão bem elevados, bem acima dos preços de equilíbrio e ainda não mostram nenhum sinal de arrefecimento. Quem sabe o Fed acelerando o passo, pode contribuir para gente ver commodities acomodando — disse.

Para 2023, a meta de inflação brasileira é de 3,25%. O mercado, via boletim Focus, está projetando inflação a 4,10%. Damico ressalta que, dada as instabilidades, o cenário de juros e inflação está sendo constantemente revisado, mas o viés da inflação é de alta.

De olho em 2023

Além da continuada aceleração da inflação e dos movimentos do Fed , as incertezas em relação ao desenrolar da guerra na Ucrânia e os lockdowns na China devem estender o período de elevação de juros.

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Para analistas, a alta na Selic tem mais a ver com o controle da inflação de 2023 do que a desse ano. No comunicado, o Banco Central também deixa claro que a preocupação principal passou a ser os preços do ano que vem.

No último boletim Focus, a projeção do mercado aponta para inflação a 7,89% em 2022 , que tem como meta 3,5%. Para levar a inflação para dentro do intervalo da meta, cujo teto é 5%, o movimento de elevação de juros teria de ser ainda mais forte, já que a inflação está persistente.

O sócio e economista da Kairós Capital, Marco Maciel, diz que são dois trabalhos de diferentes magnitudes: trazer a inflação para perto da meta desse ano e já controlar o indicador de 2023.

Ele aponta que, para 2022, o cenário de choques, reconfiguração das cadeias globais e as pressões nas commodities , com os efeitos da guerra, tendem a manter a inflação pressionada, a despeito de uma elevação de juros.

— O BC não vai jogar a toalha agora, vai fazer o que precisa para trazer a inflação desse ano para o intervalo de tolerância. Mas o horizonte relevante já inclui de forma mais significativa e preponderantemente o horizonte para 2023.

Balanço de riscos

Para o Copom, há um cenário de riscos de alta e de baixa na inflação. Entre os fatores que poderiam elevar os preços, há a persistência de pressões inflacionárias globais e uma incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal do Brasil, mesmo que parte dele já esteja incorporado nas expectativas.

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Para baixo, o BC ainda vê uma possibilidade de reversão parcial do aumento dos preços de commodities em moeda local e uma possível desaceleração da atividade econômica mais acentuada do que a projetada.

No cenário traçado pelo Comitê para a inflação, com barril de petróleo terminando o ano em US$ 100, com aumento de 2% ao ano a partir de 2023, e bandeira tarifária de energia elétrica amarela em dezembro de 2022 e 2023, a inflação ficaria em 7,3% neste ano e 3,4% em 2023. Se concretizado, a meta seria estourada em 2022 e cumprida no ano seguinte.