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Inflação na volta ao escritório: lanche, cafezinho e passagem pesam mais no bolso. Veja como economizar

Após dois anos de home office, trabalhadores mudam hábitos para economizar em ambiente de trabalho. Gasolina subiu quase 60%
Na volta ao trabalho presencial, preço do cafezinho já está 15% mais caro que há dois anos Foto: Arquivo
Na volta ao trabalho presencial, preço do cafezinho já está 15% mais caro que há dois anos Foto: Arquivo

RIO - Antes da pandemia, o analista financeiro Wanderley Gomes, de 31 anos, cultivava o hábito de almoçar fora com os colegas no shopping em que trabalha. Dar uma volta para olhar as vitrines também era prática comum no intervalo do expediente, o que facilmente se transformava em compras por impulso, diz ele.

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Depois da adoção do home office, certos hábitos de consumo ficaram de lado. Sumiram os gastos com a passagem do metrô, roupas sociais e o docinho depois do almoço - o que abriu espaço para uma economia significativa por meses.

Agora, dois anos depois da pandemia, o movimento de retorno ao escritório impôs um desafio a trabalhadores como Gomes: encarar a tão disseminada inflação - que vai do transporte ao cafezinho, passando pelo vestuário e pela refeição fora de casa.

Somente nos últimos 30 dias, a prévia da inflação medida pelo IPCA-15 acelerou para 1,73% . É a maior alta para o mês de abril desde 1995. Em 12 meses, o índice já acumula avanço de 12,03%.

Em dois anos, serviços e produtos que voltaram a fazer parte da rotina dos brasileiros com o retorno ao trabalho presencial pressionam mais o orçamento: o lanche ficou 15,5% mais caro, e o  preço do cafezinho subiu 14,97%.

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As variações consideram dados do IPCA-15 coletados entre meados de março de 2020, quando começou o lockdown, até meados de abril deste ano. Neste período, a inflação subiu 18,93%.

Renovar o guarda-roupa está mais caro

Ir de carro para o trabalho já deixou de ser opção para muitos faz tempo - a gasolina acumula alta de 58,96% . Usar táxi ou transporte por aplicativo também pesa mais no bolso: os preços subiram 6,15% e 19,76% em dois anos, respectivamente. Nem mesmo o metrô ficou de fora dos reajustes: a passagem encareceu 8,86% desde março de 2020.

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Renovar o guarda-roupa também está difícil, já que os preços no setor de vestuário subiram 15,06%.

— O maior impacto foi no vestuário, os preços subiram bastante. Também pesou o aumento da passagem de metrô. Agora, levo comida de casa com mais frequência e diminuí o gasto com doces. Comecei a levar lanches para comer na parte da tarde... Isso ajudou a controlar o orçamento — conta Gomes.

O analista financeiro Wanderley Gomes, de 31 anos, agora leva refeições para o trabalho a fim de enxugar os gastos em meio à inflação alta no retorno ao trabalho presencial Foto: Reprodução
O analista financeiro Wanderley Gomes, de 31 anos, agora leva refeições para o trabalho a fim de enxugar os gastos em meio à inflação alta no retorno ao trabalho presencial Foto: Reprodução

Júlia Passabom, economista do Itaú Unibanco, lembra que a dinâmica da inflação fora do domicílio tem duas forças predominantes: uma é o chamado "efeito reabertura", diante da volta dos trabalhadores aos escritórios. Já a outra se dá pelo aumento de custos.

— Sem dúvida é um desafio maior nessa retomada (com a inflação alta). Muitos restaurantes fecharam e os que ficaram tiveram aumento de custos significativos, porque o preço de alimentos acumulado nos últimos dois anos subiu muito.

Marmita para o trabalho

Pesquisa da consultoria Galunion, realizada em fevereiro deste ano, aponta que 60% dos 1,1 mil brasileiros entrevistados preferem levar marmita de casa para o trabalho para economizar.

O estudo também observou uma tendência das classes B e C reduzirem gastos com alimentação fora de casa: 41% e 56%, respectivamente, afirmaram que pensam em diminuir essas despesas adiante.

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Em uma outra questão da pesquisa, 17% dos trabalhadores disseram que estão trabalhando de forma autônoma para complementar a renda.

— Esses comportamentos refletem não somente a inflação dos custos, mas também o descompasso entre os preços que sobem e a renda que não acompanha este crescimento — explica Simone Galante, fundadora e CEO da Galunion.

Reajuste de benefícios

Segundo outra pesquisa, realizada pela Ticket, marca de benefícios de alimentação e refeição da Edenred Brasil, com mais de 700 trabalhadores, a maioria revelou que a nova rotina está gerando mais custos em comparação ao modelo de trabalho “home office”.

De acordo com o levantamento, 55% dos participantes apontaram em novembro aumento nos gastos com mobilidade, alimentação e vestuário.

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Para José Ricardo Amaro, diretor de Recursos Humanos da Ticket, o resultado da pesquisa serve de alerta para as empresas, que devem reavaliar o pacote de benefícios oferecido aos funcionários e atualizar seus valores, que estão defasados devido ao aumento da inflação durante o longo período da pandemia.

Ele também destaca que é preciso verificar se os tipos de benefícios atendem as novas necessidades dos empregados, levando em conta os impactos no orçamento decorrentes da mudança de rotina.

— É fundamental que as companhias ouçam dos próprios funcionários quais foram as principais mudanças sentidas no retorno ao trabalho presencial e que, com base nesses dados, tenham condições de oferecer benefícios equivalentes à nova realidade de consumo no país.

Dicas para driblar a alta de preços

Veja a seguir algumas dicas para economizar na volta ao traballho presencial:

1. Tenha um planejamento financeiro

A primeira dica para economizar no retorno ao trabalho presencial vem antes de consumir qualquer produto, segundo Marlon Glaciano, especialista em finanças.

- É importante você entender o quanto tem de despesa e o quanto você tem de receita para você equacionar essa diferença de forma saudável. O ideal é que você não gaste mais de 60 a 70% do que você ganha - sinaliza.

Para equacionar o orçamento, vale listar os gastos mensais indispensáveis e aqueles que podem ser flexíveis para começar a planejar a nova rotina.

2. Use formas alternativas de transporte

Aquele trabalhador que está acostumado a ir de carro para o trabalho deve sentir o peso da alta dos combustíveis. Por isso, pensar em formas alternativas de transporte é uma solução para driblar os custos de deslocamento.

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Nessa hora, é preciso aliar a criatividade com a qualidade de vida a fim de reduzir os gastos, diz Ricardo Teixeira, coordenador do MBA de Gestão Financeira da FGV:

- Se você normalmente vai de carro, pode pensar em um rateio para que várias pessoas usem o mesmo veículo. Também existem serviços de carona compartilhada, ou pode-se ainda pensar em transporte alternativo, que vai desde ir de ônibus ou metrô, se você não ia antes.

Ele continua:

- Ou até mesmo ir de bicicleta ou ir a pé se você morar perto do trabalho. Nesse caso, tem que ser uma caminhada prazerosa. É preciso introduzir isso de maneira otimista para ver que você vai ter benefícios ao fazer isso, e eventualmente até retomar planos de viajar uma vez que você passou a economizar nessa nova rotina.

3. Leve sua marmita

No retorno ao escritório, é comum que as saídas com os colegas de trabalho para um cafezinho ou almoço em restaurantes voltem a fazer parte da rotina. Mas no momento em que a alimentação fora de casa ficou mais cara, é preciso repensar os gastos com alimentação.

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- Uma alternativa é já levar de casa lanches ou refeições que você comprou os insumos no supermercado e preparou. Embora não tenha aquele prazer da saída com os colegas para o almoço, pode ser até que os seus próprios colegas passem a adotar isso e o almoço fique muito mais barato na própria empresa pra todo mundo. Sem contar que as refeições mais leves, além de serem mais baratas, ajudam na produtividade do escritório - diz Teixeira, da FGV.

Glaciano complementa:

- Muitas pessoas erram nesse ponto: cuidado com produtos supérfluos, como aplicativos de comida e de transporte, que muitas vezes vem acompanhados da 'desculpa da recompensa' (ah, hoje eu trabalhei muito, então posso me dar esse luxo). Claro que você merece tudo, mas isso também não quer dizer que você mereça não ter dinheiro, por isso é preciso cuidado. Você pode substituir, por exemplo, fazer comida em casa, ao invés de comprar fora.

4. Conte com a ajuda de parentes

Depois de tanto tempo em casa, é comum que muitos pais e responsáveis tenham passado a conciliar o tempo de cuidado com os filhos com o home office. No retorno ao presencial, porém, talvez seja preciso buscar novas formas de gestão dessas responsabilidades.

- Eventualmente, ter uma babá em casa que tome conta das crianças talvez não seja a melhor opção. Talvez você possa chamar alguém da família que vai passar a tarde estudando e estar com as crianças em casa ao mesmo tempo que estude e tome conta do que está acontecendo a um custo mais barato - recomenda Teixeira.

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Glaciano destaca ainda que é importante dialogar com os demais familiares para que todos estejam a par da necessidade de redução de custos. "Se todos que moram juntos sabem da situação financeira e do que se passa no planejamento familiar, isso facilitará no dia a dia e na tomada de decisões de compras não só do indivíduo, mas de toda a família".