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Economia

Marcas de luxo investem no 'e-commerce' de olho em brasileiros que não podem viajar para comprar

Há mimos como anéis a R$ 7.600. No Shopping Cidade Jardim, 'personal shoppers' ajudam na escolha dos pedidos
Flavia Farhat é uma das 'personal shoppers' so shopping Cidade Jardim. Ela ajuda clientes a fazer os pedidos Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
Flavia Farhat é uma das 'personal shoppers' so shopping Cidade Jardim. Ela ajuda clientes a fazer os pedidos Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

RIO — A Bvlgari — a maison italiana de joias, relógios, perfumes e artigos em couro — acaba de colocar no ar seu canal de e-commerce para o mercado brasileiro. Com a Covid-19, trouxe para meados deste ano seus planos de expansão em plataformas locais de comércio eletrônico .

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O movimento da marca de antecipar planos e adaptar serviços para superar efeitos da pandemia é acompanhado por outras do segmento de luxo lá fora e também aqui. A JHSF Participações — dona da rede Fasano e de shoppings com o Cidade Jardim, em São Paulo — também acelerou projetos para atender às novas necessidades de seus clientes.

Nos últimos três meses, a Bvlgari, marca do grupo LVMH, dono também da Louis Vuitton , abriu portais de vendas digitais em outros seis países. Já estava em oito.

A marca, como outras do segmento de luxo, está vindo atrás dos brasileiros que deixaram de viajar para Europa, Estados Unidos ou China, e que já era seus clientes nessas cidades. Mas também quer conquistar novos.

Na pandemia, a loja virtual da Bvlgari dobrou as vendas, se tornando a líder do grupo, num momento em que grande parte das unidades precisou fechar as portas.

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— Na pandemia, quando fechamos lojas, decidimos acelerar a expansão do e-commerce . Então, o que já estava planejado para acontecer entre 2020 e 2022, portanto em três anos, decidimos fazer entre julho e agosto de 2020. Com isso, pudemos servir o Brasil bem antes do previsto, que seria fim de 2021 — conta Jean-Christophe Babin, CEO da Bvlgari, em entrevista ao GLOBO, explicando que a maior parte da receita em vendas digitais vem de EUA, Japão e China.

O Brasil não é um grande mercado para a Bvlgari. Mas tem potencial para incluir mais pessoas na lista de compradores da marca italiana, avalia o executivo.

Jean-Christophe Babin, CEO da Bvlgari Foto: Divulgação
Jean-Christophe Babin, CEO da Bvlgari Foto: Divulgação

A ideia é fazer isso, primeiro, digitalmente. É que o país é um emissor de consumidores de alta renda ao exterior, como países do Oriente Médio, a Rússia e a própria China.

— Hoje, temos presença direta apenas em São Paulo, com uma loja. Isso torna o e-commerce local crucial para alcançar uma base de clientes maior em potencial. Além disso, pelas circunstâncias impostas pela pandemia, muitas pessoas que costumam viajar e fazer compras no exterior estão fazendo isso onde moram. Isso acelera a oportunidade de aumentar a base de clientes e de vendas no país — explica Babin.

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O Brasil, continua ele, tem potencial para receber outras duas lojas da marca: uma segunda em São Paulo e uma no Rio, mas “as localizações ideais para esses pontos ainda não foram encontradas”. O projeto, contudo, deve sair do papel tão logo o e-commerce decole, disse o executivo.

Reverter perdas

A agilidade das marcas reflete diretamente na forma como conseguem reverter as perdas pelo fechamento da rede física. E isso vale também no segmento de alta renda.

No primeiro semestre, o grupo LVMH viu seu lucro tombar 84%, para € 522 milhões, após forte impacto da pandemia nos negócios entre abril e junho.

A divisão de relógios e joias do grupo, na qual está inserida a Bvlgari, também sofreu impacto. Mas no próprio segundo trimestre a marca italiana já demonstrava “forte recuperação no mercado chinês”, além de desenvolvimento acelerado do e-commerce , segundo resultado divulgado ao mercado pela companhia.

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O resultado do mercado de artigos pessoais de luxo globalmente pode encolher em 20% a 35% este ano, pelos cálculos da consultoria Bain & Company, recuando dos € 281 bilhões registrados em 2019. O retorno ao patamar pré-Covid virá apenas em 2022 ou 2023, conforme a retomada da China e da economia mundial.

Mais à frente, as projeções explicam o foco em serviços e vendas digitais. Em 2019, 12% dos €281 bilhões movimentados pelo setor globalmente vieram do comércio on-line.

O Shopping Cidade Jardim tem um Concierge por meio do qual os clientes podem pedir auxílio para obter produto ou serviço. Há uma equipe de consultores especializados, Flavia Farhat é uma delas. Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
O Shopping Cidade Jardim tem um Concierge por meio do qual os clientes podem pedir auxílio para obter produto ou serviço. Há uma equipe de consultores especializados, Flavia Farhat é uma delas. Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

A previsão é que em 2025 essa fatia avance para entre 28% e 30%, mas sobre um bolo maior: de € 320 bilhões a € 330 bilhões. Nesse intervalo, os chineses vão saltar de 35% para perto de metade dos consumidores.

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— Com menos viagens, o consumidor deixou de ir onde a oferta está. Com isso, as marcas fazem o caminho oposto, porque o consumo local cresce. E fazer isso via e-commerce é mais fácil, exige menos investimento — diz Luciana Batista, sócia da Bain & Company. — Nesse segmento, porém, há o desafio de manter o foco na experiência, no cliente, no serviço qualificado.

Na prática, explica ela, essas marcas têm de olhar de forma fragmentada para mercados locais e regionais, para públicos distintos e dialogar com cada um deles de forma específica para se posicionarem e gerarem vendas.

Não à toa, o atendimento com uma equipe de consultoras treinadas está no centro da estratégia da Bvlgari. Entre os itens preferidos pelos brasileiros está a coleção B.Zero1, com anéis anunciados a partir de R$ 7.600 pelo e-commerce .

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O CEO da Bvlgari lembra que existem duas fortes motivações para comprar joias em momentos de crise:

— Joias tem forte apelo emocional, pelo valor perene. Mas há também o financeiro. Ouro ou pedras preciosas nunca terão seus valores questionados. Não importa qual será o futuro: ouro continuará a ser ouro, um diamante será um diamante. E terão algum valor.

De roupas a TV, em casa

Antecipar serviços não é caminho percorrido apenas por ícones globais nesse circuito da alta renda. No Brasil, a JHSF Participações, da rede Fasano e de shoppings com o Cidade Jardim, em São Paulo, já apostava com força em soluções digitais.

Na pandemia, acelerou projetos principalmente pelo viés de hospitalidade, levando ao cliente o que ele demanda onde está, explica Thiago Alonso, CEO do grupo.

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O e-commerce CJ Fashion tem entrega em todo o país. Na pandemia, foi criado o CJ em Casa, um catálogo digital com uma seleção de itens das marcas do portfólio da empresa e com interação direta com o serviço mais demandado nos últimos meses, o Concierge.

Uma equipe de três consultoras exclusivas, as personal shoppers , atende aos pedidos. Elas providenciam produtos e serviços mesmo de fora do chapéu do grupo. O Concierge já representa cerca de um terço das compras on-line do Cidade Jardim. Entre os itens mais pedidos estão roupas e objetos para a casa.

— Trabalhamos com foco na alta renda e no cliente. O consumo está preservado. O que mudou foi a regra do jogo, que agora é remoto. Percebemos que muitos clientes estão em uma segunda residência durante a pandemia. Estão em casas mais espaçosas e confortáveis, mas sentem falta das conveniências da cidade grande, principalmente restaurantes. Então, levamos o que o cliente pede até ele — explica Alonso.

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O que o cliente pede é amplo. Vai de peças de grifes de vestuário, passando por um iPhone, até uma TV com tela de 85 polegadas entregue em uma fazenda no interior do Mato Grosso.

O CJ tem um fluxo de entregas relevante na Fazenda Boa Vista, condomínio com casas de milhões de reais na paulista Porto Feliz, projeto do mesmo JHSF.

Lá, o grupo montou uma espécie de centro comercial na pandemia, com pet shop e lojas que vão da venda de bicicletas elétricas a uma concessionária Volvo. Na gastronomia, além do restaurante Fasano, reforçou a oferta com Geiko San, Charlô e MaFoz to go.