Economia

Megaiates em fuga: bilionários russos gastam até meio milhão de dólares em combustível para fugir de sanções

Palácios flutuantes já percorreram, em média, 8,3 mil quilômetros para escapar de punições impostas pelos EUA e UE
Megaiates de bilionários russos já percorreram, em média, 8,3 mil quilômetros Foto: Balint Porneczi / Bloomberg
Megaiates de bilionários russos já percorreram, em média, 8,3 mil quilômetros Foto: Balint Porneczi / Bloomberg

HONG KONG - Antes do megaiate Amadea, avaliado em US$ 325 milhões, ser empurrado para uma disputa legal no Pacífico Sul, o navio de luxo que o governo dos EUA afirma pertencer ao bilionário russo Suleiman Kerimov embarcou em uma viagem de 18 dias do Caribe para Fiji, provavelmente gastando cerca de US$ 500 mil com combustível.

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Há especulações de que o superiate estava a caminho do porto russo de Vladivostok antes que as autoridades de Fiji o apreendessem a pedido de autoridades americanas. A corrida pelos oceanos não foi isolada: desde que o governo americano e seus aliados passaram a punir centenas de oligarcas e magnatas próximos ao presidente Vladimir Putin, por conta da invasão da Ucrânia pela Rússia, bilionários russos levassem seus iates para regiões não tão propensas a imposição ou aplicação de sanções.

Vários governos foram atrás de vilas, aviões e megaiates dos magnatas - apreendendo mais de uma dúzia de megaiates multimilionários até agora.

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Junto com a Spire Global Inc., empresa de análise que usa nanossatélites para coletar dados, a Bloomberg rastreou quais foram as viagens mais longas feitas por iates ligados a magnatas russos em listas de sanções. Veja a seguir:

Amadea

Megaiate Amadea, avaliado em US$ 325 milhões Foto: Guillaume Plisson / Reprodução
Megaiate Amadea, avaliado em US$ 325 milhões Foto: Guillaume Plisson / Reprodução

De acordo com o levantamento, desde a invasão da Ucrânia, o megaiate Amadea foi o que realizou a viagem mais longa: percorreu mais de 15 mil quilômetros, quase metade da distância percorrida ao longo de todo o ano passado.

Outros cinco superiates registraram viagens de cerca de 9,26 mil quilômetros em busca dos destinos considerados seguros de apreensões, incluindo Turquia e Rússia.

“Nos últimos meses, vimos os iates de oligarcas russos viajarem para lugares que historicamente não iam e traçar mais milhas do que normalmente fazem”, disse Simão Oliveira, desenvolvedor de aplicativos e web da Spire que elaborou o rastreador de iates.

Megaiate Amadea possui um heliponto, piscina com mosaico e até tanque de lagostas Foto: Guillaume Plisson / Reprodução
Megaiate Amadea possui um heliponto, piscina com mosaico e até tanque de lagostas Foto: Guillaume Plisson / Reprodução

O megaiate Amadea, que possui um heliponto, piscina com mosaico e um tanque de lagostas, estava ancorado na ilha caribenha de Sint Maarten desde o Natal e ainda estava lá quando a Rússia começou seu conflito armado na Ucrânia.

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Em 12 de março, o iate passou pelo Canal do Panamá. De lá, seguiu para noroeste até o México, onde chegou ao porto de Manzanillo, na costa oeste do país, em 24 de março. Ancorou lá por menos de 24 horas - tão breve que provavelmente foi uma parada de abastecimento, disse Sam Tucker, chefe de superiates da VesselsValue, provedor de dados marítimos.

O Amadea, de 348 pés de comprimento, seguiu direto para Fiji a uma velocidade de cruzeiro de 20,9 quilômetros por hora e chegou ao porto de Lautoka em 12 de abril, aparentemente sem as licenças necessárias. Uma semana depois, Fiji ganhou uma ordem judicial para impedir que o navio partisse depois de receber um pedido de assistência jurídica mútua dos EUA.

Na mira das autoridades

O Supremo Tribunal de Fiji deu sinal verde para as autoridades norte-americanas e locais tomarem o Amadea. O advogado que representa o proprietário registrado do navio, da Millemarin Investments Ltd., perdeu um recurso para suspender a ordem judicial, e diz que o navio é de propriedade de outro magnata russo - não do bilionário do ouro Suleiman Kerimov, como alega o governo dos EUA.

Kerimov, dono de uma fortuna avaliada em US$ 15,8 bilhões sofreu sanções do Reino Unido e União Europeia em março por seus laços com Putin. Ele estava na lista de sanções dos EUA em 2018.

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“Esses iates parecem estar procurando jurisdições confortáveis onde possam se esconder: Seychelles, Maldivas, Dubai, Fiji – esperando que estejam longe o suficiente do alcance das sanções”, disse Ian Ralby, executivo-chefe da IR Consilium, consultoria em segurança marítima.

“Em alguns casos, eles estão descobrindo, quando chegam lá, que estavam enganados ao pensar que esses países estariam a bordo deixando um iate russo despreocupado. Eles estão descobrindo que realmente não há um porto seguro confortável para eles.”

A busca do Amadea por lugares seguros é cara. O navio com bandeira das Ilhas Cayman pode navegar cerca de 18.520 quilômetros com um tanque cheio - o suficiente para sua viagem relâmpago do Caribe a Fiji, disse Denis Suka, um influenciador de iates conhecido como Yacht Mogul que freta e ajuda a vender navios para clientes.

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O iate pode transportar 392 mil litros (ou 104 mil galões) de combustível, e um tanque cheio custaria ao proprietário russo cerca de US$ 530.000 aos preços atuais do diesel na Europa, segundo Suka.

Clio

Já o Clio, um iate avaliado em US$ 65 milhões e vinculado a Oleg Deripaska, bilionário russo cujas ligações com Putin também o colocaram em listas de sanções, registrou a segunda maior distância já percorrida desde a invasão da Ucrânia, com viagens totalizando mais de 13 mil quilômetros.

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O Clio transporta 250 mil litros de combustível a bordo. Um tanque cheio custaria cerca de US$ 340.000. O iate de 239 pés estava nas Maldivas, no Oceano Índico, enquanto o escrutínio em torno de Deripaska e outros oligarcas próximos ao presidente da Rússia crescia após o início da guerra.

Deripaska, que está sob sanções dos EUA desde 2018, é proprietário de um conglomerado industrial que inclui um importante fornecedor de equipamentos militares para a Rússia, segundo a UE. O bloco o sancionou em abril, no mesmo dia em que atacou as filhas adultas de Putin.

Um porta-voz de Deripaska disse que as sanções da UE contra ele são equivocadas e baseadas em informações falsas. Embora o magnata tenha uma participação menor no conglomerado industrial, as empresas venderam ativos militares desde 2019 e atualmente não produzem nenhum equipamento militar, segundo o porta-voz.

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O bilionário também não é dono do Clio, disse o porta-voz. A SuperYachtFan , que pesquisa e investiga as estruturas de propriedade de iates dos ultra-ricos, lista Deripaska como proprietária do Clio. A propriedade de megaiates é muitas vezes opaca e envolve empresas de fachada.

O Clio, que acomoda 18 pessoas e tem seu próprio elevador, estava em movimento no dia 20 de março. O megaiate estava indo para Dubai quando retornou às Maldivas e depois seguiu em uma jornada de 5.556 quilômetros ao noroeste através do Canal de Suez, segundo dados compilados pela Bloomberg.

O superiate foi visto pela última vez no Mar Negro além de Istambul, onde vários portos russos estariam ao alcance antes que seu sistema de identificação automática parasse de transmitir sua localização em 18 de abril.

Nord

O Nord de 465 pés - um palácio flutuante de US$ 500 milhões que possui dois helipontos, um cinema e 20 cabines de luxo - é de propriedade do bilionário russo do aço Alexey Mordashov. O navio registrou cerca de 12.410 quilômetros no período - principalmente por conta de sua viagem para voltar para casa no porto russo de Vladivostok, em março.

O navio esteve nas Maldivas e Seychelles durante o inverno. Ele deixou as Seychelles em 12 de março e navegou em direção ao Sri Lanka - embora tenha feito uma curva incomum de 90 graus à esquerda antes de chegar.

“Talvez esta tenha sido uma decisão de última hora para pegar reservas ou peças de reposição”, disse Tucker, da VesselsValue.

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O iate chegou a Vladivostok em 11 de abril, onde ainda está ancorado e com sua localização ativa, mostram dados compilados pela Bloomberg.

O barco transporta 345 mil litros de combustível, e um tanque cheio para sua viagem à Rússia custaria cerca de US$ 465.000, segundo Suka.