Economia

Mesmo com flexibilização do isolamento, 18,6 milhões não procuram emprego por medo da pandemia ou falta de vaga

Dados são da terceira semana de julho, segundo IBGE. Para especialistas, pagamento do auxílio emergencial e seguro-desemprego também podem influenciar na decisão de não buscar trabalho
Flexibilização do distanciamento ainda não gera reflexos na redução no número de pessoas que querem trabalhar, mas não procuraram emprego por conta da pandemia ou falta de vaga Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo/02-08-2020
Flexibilização do distanciamento ainda não gera reflexos na redução no número de pessoas que querem trabalhar, mas não procuraram emprego por conta da pandemia ou falta de vaga Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo/02-08-2020

RIO — A flexibilização do distanciamento social não tem feito com que os brasileiros se animem a sair de casa para procurar um emprego. Dados da Pnad Covid, divulgada nesta sexta pelo IBGE, indicam que 18,6 milhões de pessoas gostariam de trabalhar e não conseguem devido ao medo da pandemia ou por falta de vaga na cidade onde vivem. Os dados são da terceira semana de julho.

O número chama atenção, pois está estável pela terceira semana consecutiva. Também está estável na comparação com a primeira semana de maio, auge do isolamento social e quando foi divulgada a primeira edição da pesquisa.

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A quantidade de pessoas que alegavam a pandemia ou a falta de vagas como motivos para não procurar emprego vinha declinando, o que foi interrompido com o aumento registrado na primeira semana de julho. A partir daí, segue estável.

Uma das hipóteses é que as pessoas, agora, estejam alegando mais a falta de emprego do que a pandemia como motivo para não procurar emprego. Os números semanais do IBGE ainda não permitem verificar essa diferença nas justificativas.

Por outro lado, houve estabilidade no número de pessoas desempregadas na semana, indicando que as pessoas não estão buscando emprego. A taxa de desocupação ficou estável, em 13,1%.

Na metodologia do IBGE, é considerado desempregado apenas quem efetivamente procura emprego e não acha. Quem desiste ou suspende a busca no período coberto pela pesquisa não entra na estatística. Hoje, 12,3 milhões de brasileiros estão oficialmente desempregados.

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Para Maria Andreia Parente Lameiras, pesquisadora do Ipea, fatores como o auxílio emergencial e o seguro-desemprego, por exemplo, ajudam a segurar a procura por trabalho e a renda das famílias, em uma economia ainda fragilizada. O medo do contágio também influencia, segundo ela.

— As pessoas vão voltar a procurar primeiro pela necessidade da renda. No momento que o auxílio emergencial acabar, as pessoas vão precisar buscar uma subsistência. O contágio menor também ajuda, mas  o mercado de trabalho não vai conseguir absorver todo mundo— ressalta.

Maria Andreia ressalta que parte desse contingente é formado por trabalhadores menos escolarizados e menos experientes, cujo retorno para o mercado de trabalho será mais difícil.

Análise feita pelo GLOBO com base nos microdados de junho da mesma pesquisa permitem extrair um perfil desse "novo desalentado": majoritariamente jovem, ou seja, pessoas que estão entrando no mercado de trabalho. Naquele mês, uma em cada três pessoas nessa situação tinha entre 14 e 24 anos.

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Para os próximos meses, a economista espera que haja uma recomposição da ocupação por meio dos informais. Dados da Pnad Contínua, divulgados ontem pelo IBGE, mostraram que 8,9 milhões de pessoas deixaram de trabalhar entre abril e junho, sendo 68% informais.

Nas últimas semanas, o fenômeno observado tem sido a redução do número de pessoas ocupadas afastadas do trabalho. Na terceira semana de julho, 860 mil deixaram essa condição - parte retornou a ocupação.

— Isso indica que a maioria das pessoas que estavam afastadas pelo distanciamento voltaram para o trabalho que tinham antes da pandemia —  explicou a coordenadora da pesquisa, Maria Lúcia Vieira.

Desde maio, mais de 10 milhões de trabalhadores deixaram de estar afastadas do trabalho. Parte desse grupo voltou a trabalhar, com a flexibilização das medidas de isolamento. Outra parcela foi demitida, tendo procurado ocupação em seguida ou desistido de encontrar uma recolocação durante a pandemia.

Apesar de também avaliar o mercado de trabalho, a Pnad Covid não é comparável aos dados da Pnad Contínua, considerado o indicador oficial de desemprego no país. A metodologia das duas pesquisas são distintas.

Na pesquisa, divulgada na última quinta-feira, 13,5 milhões estavam na força de trabalho potencial. Apesar de similar, as perguntas são feitas e coletadas de maneiras distintas pelo IBGE, assim como as respostas possíveis. Por isso, há divergência entre as duas informações.

Na Pnad Covid, por exemplo, o período de referência é de sete dias, enquanto a Pnad Contínua é de 30 dias. Na Pnad Covid, por exemplo, não é necessário que a pessoa esteja disponível para trabalhar na semana de referência da pesquisa, apenas ter o desejo de exercer uma atividade. Já na Pnad Contínua, é preciso não apenas desejar uma ocupação, mas estar disponível para tal.