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Economia Negócios

Governo tenta alavancar Casa Verde e Amarela no Norte e no Nordeste, onde Bolsonaro é menos popular

A oito meses da eleição, o governo federal coloca em marcha estratégias para turbinar financiamentos em regiões mais difíceis eleitoralmente para o presidente
Programa Casa Verde e Amarela foi criado pelo governo de Jair Bolsonaro para substituir a marca do Minha Casa, Minha Vida das gestões petistas Foto: Jorge William / Agência O Globo
Programa Casa Verde e Amarela foi criado pelo governo de Jair Bolsonaro para substituir a marca do Minha Casa, Minha Vida das gestões petistas Foto: Jorge William / Agência O Globo

BRASÍLIA - A oito meses da eleição, o governo federal coloca em marcha um conjunto de estratégias para alavancar os financiamentos do programa Casa Verde e Amarela, de habitação popular, justamente em áreas onde a popularidade do presidente Jair Bolsonaro é mais baixa.

Esse arsenal de estratégias inclui usar desde os ganhos obtidos pelo FGTS com aplicações no mercado financeiro, que renderam R$ 900 milhões, até a concessão de mais subsídio para fazer a prestação caber no orçamento das famílias. Além disso, o governo também estuda formas de beneficiar a compra da casa própria pela classe média.

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O uso do FGTS é a proposta mais avançada. A ideia foi apresentada pelo Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) e aprovada na terça-feira pelo grupo técnico do Conselho Curador do FGTS.

Os ganhos do Fundo com aplicações serão usados para ampliar ainda mais a concessão de subsídios, com desconto a fundo perdido no valor do imóvel. A medida vai beneficiar famílias com renda de até R$ 2 mil, sobretudo nas regiões Norte e Nordeste.

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Segundo levantamento da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), as contratações do Casa Verde e Amarela em janeiro de 2022 caíram 42% na comparação com a média mensal do ano passado.

O empurrão extra para as famílias de baixa renda não começou a ser discutido agora. Em setembro do ano passado, o Conselho Curador já havia aprovado uma proposta do MDR, que entra em vigor no próximo dia 25, de modo a facilitar o acesso.

Casa própria é um sonho de boa parte dos brasileiros Foto: Pixabay
Casa própria é um sonho de boa parte dos brasileiros Foto: Pixabay

Agora, a análise vai levar em conta aspectos como indicadores de desenvolvimento regional, localização do imóvel, renda média por estado, além da renda média bruta familiar. Estes fatores vão fazer parte de um sistema de pontuação.

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Para avançar no interior

O que muda agora é, com a injeção dos recursos extras do FGTS, tornar essa fórmula de cálculo que viabiliza o acesso à casa própria ainda mais flexível.

Segundo projeções do MDR, seria possível elevar o volume de contratações em até 11% em relação a 2021, fazendo com que o programa chegue a 340 mil unidades financiadas este ano.

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Em 2022, o FGTS reservou R$ 8,5 bilhões para a concessão do subsídio, que pode chegar a R$ 47,5 mil por unidade, dependendo da condição financeira da família: quanto menor a renda, maior o desconto.

O MDR admite que a mudança no cálculo do subsídio tem por objetivo fazer o programa Casa Verde e Amarela avançar no interior. Já o setor da construção, que acaba sendo contemplado, avalia que a alta da inflação sacrificou a renda das famílias e reduziu a capacidade de pagamento.

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O teto do valor do imóvel foi corrigido, mas a renda do trabalhador não acompanhou o movimento.

— A inflação alta, o custo do material de construção subindo de um lado, sem a renda das famílias acompanhar do outro, é fator determinante na redução das contratações — disse o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), José Carlos Martins.

A piora de condições de crédito também chegou à classe média, na esteira da alta da taxa básica de juros (Selic), que subiu de 2% ao ano para 10,75%.

De acordo com a Abrainc, os juros médios cobrados efetivamente pelos bancos públicos e privados subiram 1,95 ponto percentual, saindo de 7,90% ao ano em janeiro de 2021 para 9,85% no mesmo período: o resultado é uma prestação mais alta, que exige um patamar maior de renda.

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Um universo de 1,772 milhão de famílias, segundo a entidade, perdeu a condição a capacidade de tomar financiamento em um ano. Com a subida da Selic para 12,25% até o fim deste ano, conforme prevê o mercado, as projeções apontam que um grupo de quase 1,5 milhão de famílias poderá ficar sem acesso ao crédito imobiliário.

Caixa segura juros

Assim, em outra frente, a Caixa segue orientações do governo para segurar taxas de juros na compra da casa própria para a classe média, com recursos da poupança, diferenciando-se de bancos privados, que aumentaram taxas de financiamento imobiliário.

O banco público manteve inalterada a taxa de balcão, para quem não é cliente, em 8,99% ao ano. Foram feitos ajustes nas taxas mínimas há cerca de três meses e, em entrevista em janeiro, o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, assegurou que elas serão mantidas.

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Em janeiro do ano passado, o valor médio da primeira prestação estava em R$ 2.097. Subiu para R$ 2.458 no mesmo mês deste ano. A exigência de renda passou de R$ 6.990 para R$ 8.192 no período.

Os números consideram a linha de financiamento tradicional, indexada à Taxa Referencial (TR) de um imóvel no valor de R$ 300 mil, com prazo de pagamento de 35 anos.

— Nossa expectativa é que este ano não seja tão favorável como foi 2021, quando as taxas estavam mais baixas e as pessoas mudavam de imóvel por causa da pandemia — disse o presidente da Abrainc, Luiz Antônio França.

Já a Caixa, que é líder no mercado, projeta crescimento das contratações de 10% em 2022, segurando os juros para atrair os mutuários. A taxa média dos financiamentos do banco público está em 8,7% ao ano, enquanto nos privados, varia entre 9,5% e 10,5%, segundo entidades do setor.

Para estimular o crédito imobiliário, representantes do setor produtivo pediram ao BC para baixar os compulsórios, a parcela dos recursos captados pela poupança que fica presa na instituição.

Os empresários defendem que o BC despeje mais recursos no mercado para estimular o crédito imobiliário.

Contudo, o economista Miguel de Oliveira, da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), afirma que a tendência é os bancos se tornarem ainda mais seletivos, diante da expectativa de alta na inadimplência:

— O crédito habitacional depende do nível da atividade econômica. De um lado, o banco precisa ter a certeza de que vai receber, e de outro, o tomador precisa se sentir confortável de que vai conseguir pagar. Recessão, inflação e desemprego, além da pandemia, jogam contra o crédito imobiliário.