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Por Bruno Rosa e Glauce Cavalcanti — Rio de Janeiro

Um primeiro sinal de que os credores vão tentar derrubar a medida cautelar obtida pela Americanas na semana passada — que suspende a execução de dívidas por 30 dias e deixa o caminho em aberto para um pedido de recuperação judicial — foi dado neste domingo pelo BTG Pactual. Em petição entregue ao Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ), o banco sobe o tom contra os acionistas da Americanas e pede que a medida seja derrubada.

Como o recurso do BTG foi apresentado à Justiça no domingo, o desembargador Luiz Roldão de Freitas Gomes Filho não reconheceu o pedido, explicando que, apesar do pedido de urgência do banco, o caso não se enquadraria entre os que pedem decisão do plantão judicial. Com isso, será direcionado e apreciado por um juiz a partir desta segunda. Mas o quadro promete esquentar esta semana. A expectativa é que outros grandes bancos recorram à Justiça a partir de hoje.

BTG fala em fraude

No centro da discussão está a proteção do caixa da varejista, que enfrenta turbulências em série depois de informar na última quarta-feira que havia “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões nos balanços de 2022 e de anos anteriores. O anúncio ocorreu no mesmo dia da renúncia ao cargo do recém-chegado CEO (há apenas nove dias na empresa) Sergio Rial, nome no qual o mercado apostava suas fichas para uma guinada na companhia.

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Ao reconhecer as “inconsistências” nas contas em anos anteriores, a companhia pode ter mudanças no seu grau de endividamento, que acarretariam o vencimento antecipado de até R$ 40 bilhões em dívidas, conforme regras contratuais. Este foi um dos argumentos apresentados à Justiça para a blindagem do caixa. Na prática, a medida cautelar concedida na última sexta-feira dá proteção à empresa contra os credores mesmo sem a existência de um pedido de recuperação judicial.

Este é um dos argumentos centrais do BTG para tentar derrubar a decisão. Na avaliação do banco, a decisão “distorce por completo os limites e a finalidade do instituto da recuperação judicial, conferindo proteção legal, inclusive em caráter antecipado, a alguém que se tornou insolvente sponte propria por ter fraudado o mercado de crédito e o mercado de ações”, afirma a petição, assinada por Rafael Pimenta, do Galdino & Coelho, e outros 12 advogados do mesmo escritório, e do Ferro, Castro Neves, Daltro e Gomide.

No texto apresentado à Justiça, os advogados se referem inúmeras vezes às “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões como fraude e que, portanto, o caso não se enquadraria no princípio de preservação da função social da empresa, na avaliação dos advogados do banco.

Devolução de R$ 1,2 bi

Até o momento, as causas do rombo estão sendo apuradas. A Americanas constituiu um comitê independente para auditar o balanço de 2022 e de anos anteriores. Outras autoridades, como o Ministério Público Federal e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM, que regula o mercado de capitais brasileiro) também atuam no caso.

Na definição de um especialista em recuperação judicial que pediu para não ser identificado, o caso pode se tornar uma nova Oi, a tele que passou por um longo processo de recuperação judicial, até chegar a um consenso com os credores. As semelhanças na avaliação deste especialista seriam o passivo bilionário e a complexidade judicial.

O outro ponto de destaque no pedido do BTG é o argumento de que a decisão cautelar conferida à Americanas no último dia 13 obrigou o banco a estornar à varejista R$ 1,2 bilhão. É que a medida permitiu que vencimentos antecipados já declarados e compensações já realizadas a partir do dia 11 — quando saiu o comunicado da companhia sobre as inconsistências financeiras — fossem desfeitos.

O banco afirma que esse valor equivale “a apenas uma fração do crédito total” do BTG, que é um credor relevante da Americanas.

Segundo um especialista em recuperação judicial, a devolução de pagamentos realizados de forma retroativa representa decisão inédita.

Como um todo, a petição lista procedimentos que apontariam que a Americanas agiu de forma premeditada para pedir à Justiça a suspensão de pagamentos feitos a partir do dia 11. E volta suas atenções para os sócios de referência da Americanas: Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, da 3G Capital, que detêm 31,13% da companhia. Os advogados do BTG jogam a atenção sobre o trio reiteradas vezes na petição.

“Os três homens mais ricos do Brasil (com patrimônio avaliado em R$ 180 bilhões), ungidos como uma espécie de semideuses do capitalismo mundial ‘do bem’, são pegos com a mão no caixa daquela que, desde 1982, é uma das principais companhias do trio”, diz a petição. “Dois dias depois, têm a pachorra de vir em Juízo pedir uma tutela cautelar, preparatória de uma recuperação judicial, para impedir os credores de legitimamente protegerem o seu patrimônio à luz da maior fraude corporativa de que se tem notícia”, argumenta o banco na petição.

O BTG usa termos contundentes para criticar a Americanas: “É o fraudador pedindo às barras da Justiça proteção ‘contra’ a sua própria fraude.”

As palavras duras, segundo fonte próxima ao caso, teriam o objetivo de pressionar Lemann, Telles e Sicupira a fazerem um aporte para compensar o rombo no caixa. O que os credores cobram é que o trio se disponha a sentar e negociar, de acordo com essa fonte.

O aporte seria condição para que os credores financeiros aceitassem rolar a dívida da Americanas. O valor que teria de ser colocado, porém, não está claro. Rial revelou em conversas com partes interessadas que seria preciso botar R$ 6 bilhões. No mercado, segundo noticiou o jornal Valor Econômico, o comentário é que esse montante poderia chegar a R$ 12 bilhões.

Equipe de negociação

O BTG levanta questionamentos sobre a capacidade financeira da Americanas para fazer frente a dívidas, frisando ter um patrimônio líquido de mais de R$ 42 bilhões, o que é mais “do que suficiente para devolver o valor de R$ 1,2 bilhão — mas o contrário não é verdadeiro”, em referência à varejista. E afirma que seu R$ 1,2 bilhão “virará pó” da noite para o dia diante das dívidas da companhia, estimadas em até aproximadamente R$ 40 bilhões.

O banco também questiona a competência do juiz Paulo Assed, da 4ª Vara Empresarial do Rio, que assina a medida cautelar.

Procurada, a Americanas informou que irá apontar em breve sua equipe de negociação com credores, “acreditando na proteção da medida cautelar e no compromisso de os credores retornarem com uma proposta.” A empresa assegura que, no momento, não pensa em recuperação judicial, mas que busca o diálogo com os credores para chegar a um acordo benéfico para todos.

A companhia sustenta que “a medida cautelar visa somente a sustentação jurídica necessária para que tanto a Americanas como os credores possam chegar a um possível acordo.” E reiterou a importância de que seja mantida, com o argumento de que sua suspensão poderia “gerar assimetria entre os seus credores, inclusive bancos, e não ajudaria no processo.”

A companhia disse ainda que trabalha para “encontrar uma solução com os seus credores e, assim, a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores.” A Americanas tem cem mil empregados diretos e indiretos no país e quer preservar a empresa.

Procurado, o BTG não retornou o contato até o fechamento desta edição.

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