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Por Elisa Martins — São Paulo

“Sobrou para você trazer a criança para a consulta?”. “Você que está de babá hoje?”. “Cadê a mãe, ela está doente?”. Essas frases podem soar familiares a alguns pais, mas nunca estiveram tão fora de lugar. Se nos últimos anos a ideia de paternidade mais ativa vem ganhando força, ela hoje rompe a fronteira das empresas e mexe na vida profissional de homens que decidem mudar a rotina de trabalho para estar mais perto dos filhos.

— Eu e minha mulher tínhamos uma rotina puxada, ela fazia residência na época, e eu trabalhava na administração de um shopping em Brasília. Depois do parto é que percebi que algo muito grande tinha acontecido, mas segui meu ritmo até o fim da licença-maternidade dela, quando conversamos sobre como íamos nos organizar. Não dava para continuar no mesmo pique. Foi quando decidimos que ela voltaria para a residência e eu ficaria com o nosso filho — conta Marlon Camacho, de 38 anos.

Foi assim dos 6 meses até os 3 anos e meio do garoto, período em que Camacho deu uma pausa na carreira no mercado formal.

— Aí senti um pouco da incerteza que muitas mães sentem. E em muitos momentos me peguei questionando sobre essa não ser ‘a função do pai’. Mas se tornou a jornada de formação mais incrível que já vivi. Aprendi sobre gestão das emoções, fortaleci vínculos com meu filho e isso impactou minha vida profissional dali para frente — diz.

Vontade de estar presente

Quando decidiu voltar ao mercado, o ambiente era outro, e Camacho também. E ele gradualmente se preparou para uma transição para empreender numa jornada de especialização em psicologia e educação parental:

— Somos de uma geração de pais que vem descobrindo o valor do afeto e da relação com suas crianças, adolescentes.

Senti um pouco da incerteza que muitas mães sentem. E em muitos momentos me peguei questionando sobre essa não ser a função de pai. Marlon Camacho, pai que fez uma pausa na carreira

O movimento é incipiente, mas detectado por agências de recursos humanos e carreira, que observam nos pais a tomada de ações historicamente comuns às mães: diminuir o ritmo de trabalho, buscar mais flexibilidade de horários e até dar uma pausa na carreira com a chegada da criança em casa.

— Foi algo que se acentuou na pandemia, quando muitos pais passaram a acompanhar mais de perto a rotina das crianças em casa. Quando retornaram ao presencial, muitos buscaram manter algo daquele período, por exemplo, preferindo um esquema híbrido para conservar momentos de home office com os filhos ou jornadas mais flexíveis para desfrutar mais desse tempo — conta Ana Paula Prado, CEO da plataforma Infojobs.

Vagas com esses perfis, diz, se tornaram mais atrativas para profissionais que são pais.

— Ainda é algo que vemos principalmente em cargos corporativos, que oferecem essas possibilidades mais do que em funções mais operacionais, mas mostra que o movimento existe — diz a CEO.

Pesquisa da consultoria Filhos no Currículo com a Infojobs revelou que quase 40% dos pais já consideraram deixar o trabalho para cuidar dos filhos. O percentual é menor do que o de mães (63%), mas significativo.

— É um dado que traduz a vontade do pai de ser participativo e estar presente, e não ocupar esse lugar caricato do pai “que ajuda” ou que é infantilizado porque não faz nada direito — afirma Michelle Levy Terni, CEO e cofundadora da Filhos no Currículo.

A CEO observa mudanças nas demandas de profissionais que são pais.

— Solicitam tempo para sair e ir a uma consulta médica com a criança, buscam outras figuras paternas para trocas de experiências. E, em alguns casos, até denunciam situações em que não se sentiram à vontade para tirar a licença-paternidade estendida nos locais que a oferecem — conta.

O tema não avança sem tabu: há um movimento crescente de empresas discutindo políticas parentais, mas a licença estendida, por exemplo, ainda é pouco implementada, o que reforça que só o aceno dos pais não basta. E, às vezes, mesmo quando o benefício existe, alguns homens se questionam “se vai pegar bem”.

Dúvidas sobre a licença

Gerente de operações clínicas na MSD Brasil, Samuel Shitara, de 38 anos, diz que nunca hesitou em tirar a licença parental de três meses oferecida na empresa. Mas diz ter ouvido de um conhecido que seria melhor “não tirar tudo” ou tirar “só a metade” porque poderia ser demitido na volta.

— Sempre via minhas colegas saindo para a licença-maternidade e dizia para ficarem tranquilas. Quando foi minha vez, passei meus projetos, minhas atividades, e me vi pensando: ‘Será que vai ter espaço para mim quando voltar?’.

Hoje, com o filho com um ano e quatro meses, Shitara diz não ter se arrependido. Por três meses, conta, entre as trocas de fraldas e os banhos, nasceu uma ligação sentimental que seria improvável por poucos dias juntos:

— Sempre fui workaholic, fazia horários diferentes. Agora tenho hora para sair, buscar o filho na escola, me organizo melhor. Tripliquei a eficiência no trabalho porque preciso garantir que vou resolver tudo enquanto estiver ali, porque depois quero estar com meu filho. Há dias de exceção, claro, mas mudou completamente em relação a como era minha vida antes.

Psicólogo e responsável à época por diversidade e inclusão no RH de uma grande empresa em São Paulo, o mineiro Vinicius Bretz, de 36 anos, trabalhou na implementação da licença familiar de seis meses na sede no Brasil e em outros países. Até que ele e a mulher decidiram embarcar na aventura da parentalidade.

O período coincidiu com o de transição profissional: Bretz migrou para uma empresa onde teria possibilidade de trabalho remoto e flexibilidade para estar com a mulher e o filho a caminho. Mas, na volta da licença, em meio a uma reestruturação, foi demitido. O problema é frequente na volta da licença-maternidade para muitas mulheres.

— Ali, ou eu procurava outro trabalho no mercado formal ou construía uma vida um pouco mais flexível para gozar de mais tempo em família. E foi essencial. Estive disponível e presente no puerpério da minha mulher e no começo da vida do meu filho — conta ele, que hoje emprega a expertise em políticas de diversidade e inclusão dando consultoria sobre parentalidade.

Vinicius Bretz já teve chance de voltar ao mercado de trabalho formal, mas preferiu modelo mais flexível. Tempo foi fundamental para criar laços com o filho — Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo
Vinicius Bretz já teve chance de voltar ao mercado de trabalho formal, mas preferiu modelo mais flexível. Tempo foi fundamental para criar laços com o filho — Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo

Bretz diz que já teve chances de voltar ao mercado de trabalho formal, mas no modelo clássico, com longas jornadas de trabalho, 100% presenciais e com viagens corporativas.

— Esse tempo em família não volta. Eu formei uma conexão com meu filho — conta Bretz. — Tem coisas que ele tem só com a mãe? Claro. Mas também tem coisas só comigo.

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